A nova constituição chilena não está passando no teste da opinião pública, mas as ideias surgidas nela indicam um caminho que não será fechado. Vilma Gryzinski:
Que
tal legalizar a maconha e a cocaína, “dialogar” com narcotraficantes e
narcoguerrilheiros, aumentar o imposto de renda em 200% e transferir a
polícia para um futuro Ministério da Paz, Convivência e Segurança?
Estas são algumas das ideias que circulam no novo governo esquerdista colombiano, chefiado por Gustavo Petro, e em seu entorno.
São muito mais radicais do que qualquer coisa que Hugo Chávez tenha feito na vizinha Venezuela quando começou seu longo percurso no poder.
Como o mau exemplo é muito próximo, talvez exista alguma esperança de que a Colômbia não entre para o mesmo caminho de autodestruição do vizinho.
A experiência indica que maus exemplos raramente impedem a visão ideologizada do mundo que leva ao cometimento dos mesmos erros.
Sem
contar que Chávez arruinou a indústria petrolífera ao baixar a mão
pesada do Estado e fatiá-la entre seus apaniguados. Não pretendia
incapacitar o país a ser um grande produtor, embora este tenha sido o
resultado. Petro quer acabar com o petróleo em si mesmo: é contra a
própria extração do combustível fóssil, pretendendo substituí-la pela
indústria do turismo.
A
convicção ecológica também levou os constituintes chilenos a
estabelecer direitos para a Natureza – não mais apenas para os humanos
que habitam o lindo e variado território do Chile, embora obviamente não falte uma longa lista de direitos nos seus 388 artigos.
Constituição
muito longa e cheia de minúcias atrapalha, em vez de ajudar – e não
faltariam conselhos por parte de quem viveu esse processo.
Mas
o novo texto constitucional avança sobre outros terrenos explosivos. O
Chile passaria, por exemplo, a ser um estado plurinacional, como a
Bolívia. O Poder Judiciário seria substituído pelo conceito de
pluralismo jurídico, para acomodar uma justiça paralela para os povos
indígenas. Pela proposta de equidade de gêneros, as mulheres seriam
obrigatoriamente 50% de todos os integrantes de serviços públicos – ou
seja, somente homens poderiam ser minoritários.
As propostas mais radicais foram abrandadas por promessas de mudanças feitas pelo presidente comunista, Gabriel Boric, quando viu que era grande a resistência à nova constituição.
Mesmo
assim, ela continua forte: segundo todas as pesquisas, existe em média
uma diferença de 10% em favor da rejeição no plebiscito do próximo dia
4.
É
importante lembrar que o processo de reforma constitucional e a eleição
dos constituintes foi democrático e produzido por um acordo nacional
depois da grande explosão de protestos de 2019. Boric, também eleito
democraticamente, está fazendo o que prometeu.
Mas
uma parte da população chilena parece estar sofrendo de remorso do
cliente, o arrependimento que se segue a uma compra por impulso.
A
direita, que sempre foi forte no Chile, e uma parte da centro-esquerda
são contra a reforma constitucional tal como está apresentada.
Antes
um assunto localizado, a questão indígena também virou um tema
nacional. Existe um grupo radical de indígenas da etnia mapuche que
prega a violência, invade terras, incendeia propriedades e bloqueia
estradas no sul do país.
Logo
que assumiu, em março, Boric mandou a ministra do Interior, Izjia
Siches, abrir um diálogo com os mapuches rebelados. Foi recebida a bala.
Com a popularidade em queda e uma crise real de segurança, o presidente
foi obrigado a decretar a militarização da região, a mesma que sempre
criticou. Militarização significava colocar as forças armadas para
patrulhar estradas.
Apesar
de recuos eventuais, propostas como as Gustavo Petro e Gabriel Boric
são uma realidade no ambiente político atual da América Latina, onde a
massa de pobreza continua a ser uma reserva de insatisfação até em
países que pareciam encaminhados para criar um processo de
desenvolvimento bem distribuído.
Abraçar
causas ecológicas, às vezes até com mais ênfase do que os ecologistas
tradicionais, e temas como a questão indígena e a equidade de gêneros
foi incorporado ao discurso esquerdista que tem muito apelo às camadas
mais jovens.
Gustavo
Petro foi da luta armada e colocou um ex-companheiro, Manuel Alberto
Casanova, no comando do serviço de inteligência da Colômbia. Ele também
acha chique consultar Thomas Piketty, o francês do Capital no Século
XXI. Será um feito se ideias que circularam no século XX e até no XIX
não arrastarem a Colômbia para o vórtice para o qual foi sugada a Argentina.
Ninguém pode esquecer que, quando Alberto Fernández propôs um imposto único sobre fortunas, muita gente achou uma excelente ideia.
A nova esquerda tem muito a aprender com a velha sobre o que não fazer.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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