MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

sexta-feira, 30 de maio de 2014

Está faltando coveiro em Salvador


por
Chayenne Guerreiro
Publicada em TRIBUNA DA BAHIA
Foto: Francisco Galvão
Os parentes de mortos peregrinam pela cidade, com o caixão
Os parentes de mortos peregrinam pela cidade, com o caixão
Sem ter onde cair morto é a realidade de grande parte das famílias carentes de Salvador. Sem ter como desembolsar o alto valor cobrado pelas necrópoles particulares, muitos acabam recorrendo aos cemitérios municipais, dando inicio a uma peregrinação em busca de uma vaga para o enterro de seus entes queridos.
No cemitério da Quinta dos Lázaros, no bairro da Baixa de Quintas, existente desde o ano 1785, a situação fica ainda mais complicada. Com 52,5 mil metros quadrados, o equivalente a cerca de sete campos de futebol, e com uma área construída de 19,2 mil m2, os sepultamentos para cova rasa estão suspensos a mais de um ano, de acordo com funcionários do local.
Famílias como a de Anselmo Guimarães, passam pelo drama de não ter onde enterrar seu parente. “A pessoa está morta há três dias. Tivemos que pagar R$ 100 a mais pra deixar no formol. A gente veio aqui e nem foi atendido. Quem deu a informação foi o vigilante. Só tem vaga se for para pagar mil reais e ai vai na parede. Mas a gente não tem condições de arcar com esse valor,” Informou, retornado para casa sem saber quando vai poder enterrar o familiar .
Situação parecida passou Wellington Machado. Nessa quinta-feira (29/5) ele chegou às 6 da manhã, em busca de uma vaga para o enterro em cova rasa, serviço prestado gratuitamente pelo governo do Estado. Depois de três horas no aguardo do contato com o coordenador do cemitério, Manolo Dominguez, foi informado pelo segurança do local que não havia vagas disponíveis. O coordenador da Quinta dos Lázaros se recusou a atender a família.
“Eu fico sem entender. Chego aqui e a informação que me dão é que não tem vaga. Tem vaga sim, eles que não liberam. Seu Manolo não recebe ninguém aqui, ele tem medo. Tudo dele é ‘procure a Sesab’. Um funcionário me explicou dizendo que o cemitério avisa a Sesab que não tem vaga, ai a Sesab manda um oficio afirmando isso”, ressaltou Machado.
O vendedor, Raimundo Flores, que trabalha em frente ao cemitério há mais de 30 anos, contou à equipe da Tribuna da Bahia que as vagas são destinadas a “conhecidos” do coordenador. “Quando chega um pobre, atrás de uma cova rasa, a informação é de que não tem. Mas quando chega um amigo dele e senta no escritório, ele manda o coveiro abrir a cova pra fazer o sepultamento. O direito do pobre está sendo violado. Isso acontece sempre no final da tarde, quando não tem mais ninguém aqui”, disse Flores.
Trabalhadores do local, que não quiseram se identificar por medo de represália, confirmaram a informação do vendedor de flores. “As quadras São Paulo, São Lazaro e Santa Helena estão vencidas. Aqui só fica até dois anos na terra, mas tem gente com quatro anos. Se quiser se enterra mil pessoas por dia aqui. Tem um ano que não se abre cova no chão aqui para os  pobres’, disse um funcionário que preferiu o anonimato.
Procurado pela Tribuna, Manolo Dominguez, coordenador do local, disse que só está sendo feito o enterro de indigentes. “Só estamos enterrando indigentes. Aqui não tem estrutura. A Sesab não fornece coveiro, essa função não existe mais, agora são contratados como auxiliar administrativo, e não podem mais exercer essa função,” explicou.
Apenas três funcionários
Questionado sobre quem faria os sepultamentos dos indigentes, Dominguez afirmou que sobraram apenas três funcionários. “Os três que ficaram fazem essa parte, mesmo sem poder, mas só indigentes, por que vem com ordem da Secretaria de Segurança Publica. Recebi um documento há pouco tempo, proibindo os enterros.”
A equipe da Tribuna fez o reconhecimento de covas que foram recentemente abertas, e devidamente identificadas, enterradas no chão. Questionado sobre a existência dessas covas, já que o mesmo havia afirmado que estava proibida a prática, Dominguez disse: “Essas foram apenas algumas abertas com muito esforço”, completou.
Questionada sobre a ausência de coveiros no cemitério Quinta dos Lázaros, a assessoria de comunicação da Secretaria de Saúde da Bahia (Sesab) disse desconhecer o decreto que exclui a profissão de coveiro, sendo que para saber maiores informações a equipe procurasse a Saeb.
Em contato com a Saeb, a Tribuna foi informada que eles não são responsáveis pelos cemitérios da cidade. Enquanto fica o jogo de empurra entre os órgãos, cidadãos de baixa renda de Salvador continuam sofrendo e sem perspectiva de enterrar seus mortos.

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