Marcos
Carias e Patricia Krause explicam como a guerra comercial de Trump está
desorganizando os fluxos comerciais globais e afetando o crescimento da
região
Enquanto
a economia global enfrenta um processo de adaptação a novos paradigmas
comerciais, a América Latina deve se preparar para os efeitos
secundários da guerra comercial e para o impacto na confiança no
comércio global. Essa é a avalição dos economistas da Coface Marcos
Carias (para América do Norte) e Patrícia Krause (para América Latina),
que analisaram os efeitos das políticas comerciais dos primeiros 100
dias da gestão Trump para a economia dos Estados Unidos e para os países
latino-americanos, durante webinar realizado, no dia 23, pela
multinacional líder global em seguro de crédito, informações comerciais e
cobrança.
Carias
observou que as tarifas médias sobre as importações dos EUA aumentaram
drasticamente, de cerca de 3% para uma faixa de 25% a 30%, dependendo
das isenções. "Isso está causando grande incerteza e interrompendo os
fluxos comerciais globais", disse Carias.
"Estamos
vivendo um momento histórico. A guerra comercial, especialmente com a
China, é um choque significativo para a economia global", disse ele.
Segundo o economista, as tarifas, especialmente a recente escalada, não
apenas tornam os produtos mais caros, mas, em muitos casos, tornam o
comércio internacional economicamente inviável".
Carias
também destacou que as políticas de Trump estão alterando profundamente
o papel dos Estados Unidos na economia global. "Este não é mais o país
que construiu o sistema comercial global. O que estamos vendo agora é
uma mudança nas regras do jogo.
"Os
EUA estão colocando em risco sua posição de hegemonia, o que pode abrir
caminho para novos modelos de globalização", afirmou. O economista
também afirmou que a atual postura protecionista está criando um vácuo
no sistema econômico internacional, o que pode alterar profundamente a
dinâmica do comércio global.
Ele
alertou para os riscos de uma possível recessão, com a possibilidade de
uma crise financeira se a confiança dos investidores nos ativos
americanos continuar a cair. "Há riscos de uma crise financeira se a
confiança dos investidores nos ativos americanos continuar a se
deteriorar".
Na
perspectiva de Patricia Krause, as políticas comerciais da
administração Trump afetam a região latino-americana de maneiras
distintas. A economista destacou quatro canais principais pelos quais os
países da América Latina são impactados: as políticas migratórias mais
rígidas, a volatilidade cambial, os impactos diretos do comércio e os
efeitos secundários decorrentes da desaceleração econômica global.
"A
política migratória mais rígida dos Estados Unidos pode gerar uma queda
nas remessas enviadas por latino-americanos que vivem no país, o que
afetaria diretamente o consumo nas economias da América Central,
especialmente em países como Nicarágua, Honduras e El Salvador", afirmou
Krause. Ela alertou que, em algumas dessas economias, as remessas podem
representar mais de 20% do PIB, o que torna esse impacto especialmente
significativo.
A
incerteza gerada pela política comercial dos Estados Unidos tem
resultado em forte volatilidade cambial, dificultando a previsibilidade
para as empresas. Após a vitória de Trump nas eleições, esperava-se um
fortalecimento do dólar devido à maior aversão ao risco e à possível
redução de impostos nos EUA, fatores que poderiam impulsionar o
crescimento econômico americano a curto prazo. Contudo, o foco inicial
do governo na questão tarifária acabou provocando um efeito contrário,
enfraquecendo o dólar e, ao menos temporariamente, diminuindo as
depreciações das moedas latino-americanas frente à moeda americana
observadas ao longo de 2024.
Em
relação ao comércio, Krause observou que a o México é o mais vulnerável
às mudanças nas políticas comerciais dos Estados Unidos, já que cerca
de 80% de suas exportações, o equivalente a um terço do seu PIB, tem
como destino os EUA. Quanto às demais grandes economias da região (tais
como Argentina, Brasil, Chile, Peru, Equador) o efeito é mitigado pelo
fato de os EUA terem uma relativa menor representatividade para as
exportações dos países, e por terem sido aplicadas o piso das tarifas
básicas de 10%. Os efeitos secundários para esses países, tais como uma
possível desaceleração da economia mundial (incluindo a China), redução
de preços de commodities e redirecionamento de exportações chinesas dos
EUA para a América Latina podem representar desafios mais
significativos.
Previsões Econômicas para a América Latina
Krause
também compartilhou suas previsões econômicas para a América Latina em
2025, destacando que a região enfrentará uma desaceleração no
crescimento do PIB. "Embora o México registre uma desaceleração
significativa, com uma previsão de crescimento de apenas 0,2% este ano,
alguns países como a Argentina devem se recuperar, com uma previsão de
crescimento de 4,6%", disse. A economista ainda prevê que o Brasil
enfrentará uma desaceleração no crescimento de 3,4% para 2% devido ao
aperto na política monetária.
Apesar
dos desafios, e do efeito líquido negativo para as economias da região
decorrente da escalada das tensões comerciais, há segmentos que podem se
beneficiar deste cenário. “O setor agrícola é um exemplo. Durante o
primeiro mandato de Trump, houve um aumento das importações chinesas de
produtos agrícolas brasileiros em detrimento de americanos, oportunidade
que poderia ser aberta novamente para produtos como soja, milho e
carne. A Argentina também pode ter oportunidades neste mesmo segmento”,
comentou.
Em
um cenário de alta incerteza, os economistas alertam para a necessidade
de monitorar de perto a evolução das políticas comerciais de Trump,
especialmente no que diz respeito à mudança nas cadeias globais de
fornecimento e no impacto das tarifas sobre as commodities essenciais
para a região.
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