MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

domingo, 21 de março de 2021

Não podemos ficar alheios à pandemia, diz presidente da Volks no Brasil

 

POLITICA LIVRE
economia

Na próxima semana, a Volkswagen vai paralisar a operação de suas fábricas no país. Segundo o presidente da montadora no Brasil e região da América Latina, Pablo Di Si, 51, foi a alternativa encontrada para reduzir o risco de contágio no momento de agravamento da pandemia e a lotação de UTIs. “Esse é um tema de saúde pública”, afirma.

A medida ocorre em meio a um problema de ordem econômica gerado pelo surto e que compromete a produção do setor automotivo em escala global, a falta de semicondutores. Di Si conta que estão sendo feitos ajustes diários para manter o abastecimento, mas que a limitação deve perdurar por todo o primeiro semestre.

Olhando para o pós-pandemia, o executivo, que tem passagens por outras grandes companhias do setor como CNH, Fiat-Chrysler e Fiat Industrial, acredita que o Brasil tem potencial para ocupar lugar de destaque na produção de um veículo sustentável, um carro híbrido 100% ecológico, fazendo a combinação do etanol com o carro elétrico.

Ele diz que nos próximos seis anos, a Volkswagen vai lançar 130 veículos a nível mundial, 70 carros elétricos e 60 híbridos.

“Nosso grupo tem o compromisso de introduzir carros elétricos globalmente. Mas há regiões como a América Latina que tem a alternativa do biocombustível. Seria muito caro nestes países mudar toda a nossa rede para fabricar carros elétricos somente”, diz ele.

A Volks comunicou na sexta-feira a paralisação de sua produção no Brasil. Qual foi o motivo?

Esse é um tema de saúde pública e a Volkswagen não pode ficar alheia ao agravamento da pandemia no Brasil e ao aumento da taxa de ocupação dos leitos de UTI no país. Por isso, pensando na saúde de nossos empregados e seus familiares vamos paralisar a produção em nossas fábricas pelo período de 12 dias corridos, a partir do dia 24 de março.

O setor automotivo sofre neste momento com a falta de semicondutores. Como tem sido essa questão para Volkswagen?

Desde a virada do ano, uma escassez significativa de capacidade de semicondutores levou a vários gargalos de fornecimento na indústria automotiva. Isso foi desencadeado pelo bloqueio automotivo global relacionado ao coronavírus, que levou à redução dos estoques e ao redirecionamento de capacidades da indústria de semicondutores para outras indústrias, como informática. Nos meses seguintes, a indústria automotiva se recuperou muito mais rápido e abruptamente do que o esperado, enquanto o aumento da produção de semicondutores automotivos para peças de suprimento central foi comparativamente lento. O resultado são adaptações e reduções em toda a indústria na produção de automóveis, o que também afeta as marcas do Grupo Volkswagen.

Em relação à região América do Sul, genericamente, a nossa equipe local está trabalhando com a matriz diariamente para proteger a cadeia de abastecimento —o que significa que nenhuma fábrica parou ainda. A previsão para estabilizar o quadro geral é o início do segundo semestre de 2021.

Como está o Brasil no mapa de investimento global da companhia?

Com o lançamento do nosso novo SUV, o Taos, utilitário esportivo de porte médio que será produzido na Argentina, concluiremos no próximo trimestre um ciclo de investimentos que somou R$ 7 bilhões no Brasil e US$ 850 milhões na Argentina. Esse plano foi iniciado em 2017 e se voltou, sobretudo, na maior ofensiva de produtos da história da marca Volkswagen no Brasil, com 20 novos modelos.

Estamos discutindo com a nossa matriz um novo aporte para região para os próximos anos e assim que tivermos essa definição iremos anunciar.

Na sua avaliação, como será o mundo pós-pandêmico para o setor automotivo?

Acredito que haverá uma mudança no comportamento do consumidor no que diz respeito à compra, consumo e propriedade do automóvel. A digitalização teve um grande avanço com a pandemia e a compra online, mesmo do automóvel, será uma realidade cada vez mais presente. Por isso digitalizamos a nossa rede com o DDX, Digital Dealer Xperience, e montamos uma loja virtual onde o cliente pode adquirir os produtos da marca. Também criamos, em parceria com a Volkswagen Financial Services, um programa de carro por assinatura, mais um novo modelo de negócio da marca no qual expandimos a oferta de conveniência e mobilidade para os clientes que não querem ter a propriedade do veículo.

Muita gente fala que jovens não querem mais ter um carro, preferem andar de bicicleta ou pegar o Uber, diferentemente do que acontecia no século passado, quando carro era o objeto do desejo. Como você vê isso?

O conceito de mobilidade sempre vai existir, seja a idade que você tiver. Você pode ser dono do carro ou alugar um. Têm algumas cidades que quando eu visito, prefiro não ter carro.

Se eu for a Boston, Chicago, Berlim ou Nova York, prefiro não ter carro, porque essas cidades têm um metrô super bom, sistema de bicicletas seguro. Dependendo da cidade, você tem uma mistura de trem, Uber, bicicleta e pode caminhar. É uma questão de entender onde você está, não criar uma fórmula uniforme.

Uber virou uma boa alternativa?

Há um ano e meio, eu estava em Boston e fui pegar um Uber. Eu estava num hotel no centro e acionei o aplicativo. Tinha 30 carros do Uber no quarteirão onde eu estava. Então, que mobilidade é essa, com 30 carros girando num quarteirão? Eu vejo que as cidades vão começar a refletir sobre esse tipo de mobilidade. E não estou falando só da Uber como empresa, estou falando do sistema todo. Um ano atrás, estava cheio de patinetes e de bicicletas em São Paulo, e hoje em dia muitas desapareceram porque foram para a falência. E é um sistema ótimo para São Paulo, para distâncias curtas, para pegar o metrô ou ônibus. Mas são sistemas de mobilidade instáveis.

À medida que vai passando o tempo, porém, eles vão ficando mais maduros. O serviço de carros compartilhados também é uma boa opção. Você pode deixar o carro em diferentes ruas e vai com uma chave ou com o seu celular e abre o carro. Isso é um sistema fantástico. Temos isso em Berlim, como um teste piloto da Volkswagen. Vai chegar ao Brasil, em cidades como São Paulo, e melhorar a mobilidade. E com isso a quantidade de veículos e de modelos vai aumentar, não diminuir.

Hoje grandes cidades do mundo impõem restrições para os carros entrarem no centro se não forem elétricos. O carro elétrico veio para ficar?

Carro elétrico é uma realidade. A Volks, nos próximos cinco anos, vai lançar a nível mundial 70 carros elétricos e 60 carros híbridos. São 130 veículos a nível mundial nos próximos seis anos. Outras montadoras também vão fazer isso. Em muitos países, há isenções para as pessoas que têm carros à bateria ou híbridos, como China, Dinamarca, Alemanha, Estados Unidos. Em Portugal e na Espanha, você não paga pedágio e tem seguro mais barato.

Mas tem que ter uma política de Estado por trás, porque se você fizesse isso no Brasil, não teríamos carregadores elétricos para abastecer os carros e iria travar todo o sistema. Numa entrevista recente a revista britânica “The Economist”, o nosso presidente mundial, Herbert Diess, enfatizou o compromisso do grupo na introdução dos carros elétricos globalmente. Mas há regiões como a América Latina em que existe a alternativa do biocombustível. Seria muito caro nestes países mudar toda a nossa rede para fabricar carros elétricos somente.

Carro elétrico é uma maravilha, não emite poluentes, mas o que fazer com a bateria depois?

A Volks já tem um planejamento para reciclar 98% das baterias na Europa. É responsabilidade da montadora não só oferecer o carro elétrico, mas olhar o ecossistema. Por outro lado, você tem que ver como a energia é gerada para abastecer esse carro elétrico.

No Brasil, você tem etanol, usinas hidrelétricas, solar e vento gerando eletricidade. Mas em outros países têm plantas nucleares para gerar eletricidade ou carvão. Não se pode olhar apenas para o carro, precisa olhar todo o ecossistema e entender o ciclo de vida desse veículo e como gerar essa eletricidade que abastece o carro.

O Brasil tem etanol, um biocombustível renovável que polui bem menos do que os combustíveis fósseis, como a gasolina. Eu acredito muito no etanol. Foi uma política acertada da década de 1970 no século passado reduzir a importação de petróleo, criando o álcool e o motor flex, que é um produto brasileiro.

Agora, nós temos a chance de tornar o etanol um produto mundial. Eu estou numa jornada de aprendizado do etanol. Comecei conversando com os presidentes de usinas sucroalcooleiras. Conversei com a Copersucar, com outras usinas e com o pessoal do Centro de Tecnologia Canavieira, em Piracicaba. Tenho discutido com esses parceiros o desenvolvimento de tecnologias a partir do etanol nos veículos híbridos, e também o etanol como alternativa de matriz para os carros elétricos.

Você acha que o etanol pode ter este papel?

Por meio da pesquisa, o Brasil tem a possibilidade de desenvolver etanol para abastecer um carro híbrido. Eu sempre faço uma analogia com a soja, que teve um grande avanço da produtividade no Brasil. Este é um processo que eu vivi com a soja, porque trabalhava numa empresa multinacional, trabalhei na Monsanto muitos anos atrás. Eu vejo que o etanol está nesse caminho.

O etanol é muito mais complexo do que a soja geneticamente, mas tem muitas pessoas capacitadas, muita tecnologia, e acho que podemos encontrar fórmulas pra transformar esse etanol em energia para alimentar um carro híbrido. É uma questão só de tempo. Se o mundo vai para o carro elétrico, nós não devemos pensar no etanol só para abastecer carros aqui no Brasil. Por que não exportar essa fonte de energia para Europa, China e Estados Unidos? E que eles abasteçam o carro com células de etanol, porque na Europa não tem etanol.

A Alemanha, nos últimos oito anos, construiu um monte de usinas eólicas. Então, eles estão transformando sua fonte para energia renovável.

Nós temos programas de carros elétricos, carros híbridos e temos planos. Já começamos as pesquisas com a Unica [União da Indústria da Cana] e com outras empresas para ver se conseguimos transformar esse etanol e abastecer carros elétricos e híbridos. O futuro no Brasil e no mundo, nos próximos 15, 20, 30 anos, é elétrico e é híbrido.

Como funciona o carro híbrido?

O carro híbrido tem um motor normal, a combustão, e a parte elétrica. Faz 50, 100 quilômetros com bateria e complementa com o motor. É uma solução excelente para o Brasil nos próximos cinco, seis anos. Esse motor, hoje em dia, é 100% gasolina. Eu vou dirigir 20, 30, 40 quilômetros no dia e faço tudo elétrico. Se tenho algum problema e preciso fazer 60 quilômetros, posso ir com o motor convencional. A autonomia total do híbrido pode chegar a 900 quilômetros. Se você quer ir de São Paulo a Belo Horizonte, que são seis, sete horas, vai usar 60, 70 quilômetros elétricos e o resto à combustão.

O que nós precisamos estudar é transformar esse motor à gasolina para etanol. Aí, você fica 60, 70 quilômetros elétricos e o resto etanol. O carro fica 100% ecológico.

Você acha que carro vai existir durante muitos anos ainda?

Muito. O elétrico e o híbrido são só o primeiro passo. O carro autônomo vai ser a grande virada. Você mora em São Paulo e quer ir para Campos do Jordão, entrar em um aplicativo e ordena —amanhã, às sete da manhã, me pega em casa e me leva para o seguinte endereço.

O aplicativo vai responder: vai custar R$ 150, R$ 200. No dia seguinte, chega o carro na sua casa, você sobe e lê um livro, escuta música, dorme um pouquinho, duas horas e meia até Campos de Jordão. Essa tecnologia está sendo desenvolvida só à base de carro elétrico. Por isso, é tão importante que a indústria brasileira pegue esse bonde, porque ele passa só uma vez na vida.

Bruno Blecher/Folhapress

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