Com maior contágio, mais mortes, vacinação lenta, sem coordenação federal das ações de saúde e com o presidente estimulando o risco da contaminação, a retomada econômica será mais difícil e insegura. Editorial do Estadão:
Emperrado
por um governo inepto e irresponsável e agora ameaçado também pelo
fisiologismo triunfante no Congresso, o Brasil continua perdendo espaço
na economia internacional, enquanto a pandemia se agrava e a mortandade
supera os piores momentos do ano passado. Perdido o primeiro trimestre, é
preciso muito otimismo para ainda apostar num crescimento, embora
pífio, na faixa de 3% a 3,5%. É a glória do bolsonarismo – do
negacionismo, do atraso na compra de vacinas, da exaltação da morte e do
desvario administrativo, comprovado mais uma vez na decisão de
subordinar a Petrobrás, a maior estatal brasileira, aos interesses de
uma categoria profissional, a dos caminhoneiros.
O
carnaval passou, a Semana Santa começará no fim do mês e o ministro da
Economia, Paulo Guedes, continua à espera de verbas para um novo auxílio
emergencial. Enquanto isso, parlamentares tentam cavar mais R$ 18,4
bilhões para suas emendas. Se conseguirem, o total chegará a R$ 34,7
bilhões, soma igual, talvez pouco superior, àquela necessária para
socorrer as famílias mais desamparadas, mais uma vez, e dar algum
impulso ao consumo.
Se
passar, a expansão das emendas será mais um desarranjo num Orçamento
ainda nem aprovado e muito atrasado. Ficará mais difícil arrumar as
contas federais, já muito esburacadas, controlar a dívida pública e ao
mesmo tempo reanimar os negócios e a criação de empregos. Mesmo em
condições políticas mais favoráveis seria difícil combinar estímulo
econômico e ajuste das finanças oficiais.
Enquanto
o presidente cuida de interesses pessoais e familiares, sempre os mais
destacados em sua agenda, o governo segue sem rumo e o País mal consegue
manter a recuperação iniciada em maio do ano passado e já enfraquecida.
Esses dados bastariam para compor um quadro preocupante.
Mas
a isso é preciso adicionar inegáveis pressões inflacionárias,
claramente perceptíveis nos preços por atacado. No varejo os
consumidores encontram, como no segundo semestre de 2020, alimentos
caros e ainda sujeitos a novas altas. O câmbio instável é um poderoso
combustível para o aumento de preços. Nos últimos dias o dólar voltou a
atingir – e até a superar – a cotação de R$ 5,60.
O
dólar tem oscilado em níveis elevados, no Brasil, principalmente por
causa da insegurança ocasionada pelo quadro político de Brasília,
marcado pelo voluntarismo do presidente Jair Bolsonaro, por sua
insistência em conflitos desnecessários e por suas decisões erráticas e
fora de quaisquer padrões compatíveis com a racionalidade
administrativa. A incompetência gerencial do presidente ficou clara
desde os primeiros dias de seu mandato.
Essa
incompetência se manifesta, com frequência, em ordens absurdas, porque
ele tende a confundir a função presidencial com o mero exercício do
poder de mando, concretizado sem respaldo técnico, sem atenção a
detalhes legais e com base em opiniões estritamente particulares e
infundadas. Essa tendência o levou, em 2019, a intervir na publicidade
veiculada pelo Banco do Brasil, numa desastrada interferência na gestão
de uma empresa de capital aberto.
A
política econômica, apesar da expectativa otimista manifestada por
analistas e investidores, seguiu o padrão de qualidade bolsonariano. O
Produto Interno Bruto (PIB) cresceu menos em 2019 que em 2018 e encolheu
no primeiro trimestre de 2020, antes do choque da pandemia. O
crescimento projetado para 2021 será insuficiente para a retomada do
nível pré-crise. Além disso, o País já crescia menos que outros
emergentes antes de 2020, e continuará em desvantagem na recuperação.
Fraquezas
econômicas acumuladas em vários anos e agravadas a partir de 2019 são
parte do problema. Mas o Brasil ainda carrega desvantagens associadas à
pandemia. Com maior contágio, mais mortes, vacinação lenta, sem
coordenação federal das ações de saúde e com o presidente estimulando o
risco da contaminação, a retomada econômica será mais difícil e
insegura. Investidores nacionais e estrangeiros sabem disso, mas o
presidente insiste em viver num mundo próprio.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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