Projeto foi criado por professores e alunos de direito e história.
Objetivo é investigar desaparecimentos e efeitos do regime na UnB.
A criação da comissão foi uma ideia de professores e alunos das faculdades de história e direito. O professor Cristiano Paixão, um dos autores da proposta, explica por que a ditadura teve reflexos dentro da universidade.
“A Universidade de Brasília foi muito afetada pela ditadura. Nós estamos no centro do poder, a UnB é um projeto vanguardista, à frente do seu tempo. Então, os militares perceberam que ela seria muito desafiadora ao regime”, afirma.
Paixão explicou que a comissão terá a tarefa de recolher informações, ouvir testemunhos, descobrir documentos e unir as peças da história para produzir um texto que sirva para a Comissão Nacional da Verdade, para a sociedade e para a comunidade acadêmica. Ele calcula que a comissão vai funcionar na Universidade de Brasília por um ano e meio.
Desaparecidos
Em frente ao Restaurante Universitário (RU), mosaicos homenageiam os ex-estudantes da UnB e desparecidos políticos Ieda Delgado, Paulo de Tarso e Honestino Guimarães - este último, o mais conhecido dos três.
Aluno do curso de geologia, Honestino foi perseguido e preso várias vezes por divulgar ideias consideradas contra o regime militar. O nome dele aparece em pelo menos 12 dossiês do Serviço Nacional de Inteligência, o SNI, entre os anos de 1966 e 1968.
Contemporâneo, amigo e companheiro de Honestino, o advogado Cláudio Almeida, lembra com clareza do dia 29 de agosto de 1968, quando a polícia e o exército invadiram a universidade. Na quadra de basquete, em que ele e centenas de estudantes foram detidos, as lembranças vêm à tona.
Cláudio Almeida foi um dos presos. Quando chegou ao quartel general do exército, encontrou Honestino Guimarães.
“Fomos encaminhados para o exército e ali eu presenciei as cenas mais bárbaras. Lá dentro, depois de alguns momentos de tortura, de vários colegas, trouxeram o Honestino para que pudesse me acusar. Ele não falava nada, permaneceu calado o tempo todo. Neste momento, eles faziam afogamento no tambor que tinha lá, por diversas vezes, ele ficou um mulambo”, lembra.
Depois de solto, Honestino Guimarães passou a viver na clandestinidade. Em 1973, foi descoberto pelo Centro de Informação da Marinha, no Rio de Janeiro. Nunca mais foi visto. O ex-estudante foi reconhecido como morto pelo Estado, em 1996. Para a família, porém, é preciso saber o que realmente aconteceu.
“A gente busca uma justiça por etapas, A primeira é fundamental, que é esse direito à verdade, à informação. A gente precisa saber o que aconteceu, isso não é só para minha família, isso não é só pra UnB, isso é para a sociedade brasileira como um todo”, fala Mateus Guimarães, sobrinho de Honestino.
Demissão em massa
Outro acontecimento histórico no período da ditadura na universidade foi o pedido de demissão em massa, em outubro de 1965, de 223 professores - um protesto contra a repressão. Naquela época, nem o conhecido prédio do Minhocão estava pronto e a UnB perdia 79% do corpo docente. Entre os professores que saíram estavam o físico internacionalmente conhecido Roberto Salmeron e o artista plástico Athos Bulcão.
Esses e outros fatos do período da ditadura militar também deverão ser abordados pela Comissão da Verdade.
“Uma das tarefas da comissão da UnB, por exemplo é ir atrás dessas trajetórias interrompidas, o que aconteceu com esses professores e famílias, que, de uma hora para outra, tiveram suas trajetória interrompidas, seus projetos completamente desarticulados. Material não falta”, afirma o professor José Otávio Noronha.
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