O presidente faz de tudo para estancar sangria da sua competitividade eleitoral em 2022. Se não conseguir, pode no desespero reforçar ações antidemocráticas e derivar para uma dose de populismo econômico que pode fazer sérios estragos fiscais. Fernando Dantas via Estadão:
O celebrado gestor Luís Stuhlberger, do Fundo Verde, disse no podcast da jornalista Malu Gaspar
que a recuperação da economia e a o avanço da vacinação devem fazer com
que Jair Bolsonaro volte a ser competitivo nas eleições de 2022.
Essa é provavelmente uma das questões mais importantes do atual momento histórico brasileiro. Pesquisa do Atlas Político recém-divulgada
mostra o atual presidente perdendo para os seus principais adversários –
Lula, Ciro, Haddad e João Doria – num eventual segundo turno das
eleições de 2022.
No
caso de Lula, a vitória sobre Bolsonaro no segundo turno seria de 49,2%
contra 38,1%. A diferença de 11,1 pontos porcentuais (pp) representa um
aumento ante a pesquisa anterior do Atlas Político, de maio, na qual
Lula ganhava com 4,7pp de vantagem.
Bolsonaro, embora alardeie não acreditar em pesquisas, está visivelmente preocupado com a desidratação da sua popularidade.
Como mostra reportagem de 2/8/21 de Adriana Fernandes,
do Estadão, “o presidente vem montando um cardápio de medidas
econômicas para evitar maior perda de popularidade”. O menu, segundo a
reportagem, inclui a elevação do benefício médio do Bolsa-Família de R$
190 para R$ 300, desonerações, reajuste do funcionalismo, entre outras
medidas.
Afora
o Bolsa-Família, uma alavanca eleitoral testada e reconhecida, que mexe
com o bolso de muitos milhões de eleitores, as outras medidas parecem
uma lista de favores para públicos específicos, sem capacidade de
catapultar a popularidade presidencial.
Mesmo
o aumento do Bolsa Família vem no vácuo do auxílio emergencial, que em
2020 pagou R$ 600 para muitas famílias e R$ 1,2 mil para um número
menor, mas não desprezível, delas.
É
possível que haja ocorrido uma “inflação” da expectativa dos pobres em
relação a benefícios sociais. Dessa forma, não dá para descartar que os
R$ 110 a mais de Bolsa-Família (ou R$ 300 para alguns milhões de
beneficiários que serão incluídos no programa) não empolguem tanto a
ponto de reverter votos em Lula, que é fortíssimo na parte mais baixa da
pirâmide, para Bolsonaro.
Dessa
forma, é difícil ver como a previsão de Stuhlberger se concretizaria
sem uma vigorosa retomada da economia que conseguisse reverter muito
rapidamente o enorme estrago provocado pela pandemia no mercado de
trabalho.
Por mais que Paulo Guedes desmereça o IBGE,
o fato é que os quase 15 milhões de desempregados da Pnad Contínua
(PNADC) no primeiro trimestre seriam ainda mais numerosos se a força de
trabalho (pessoas ocupadas e desocupadas) tivesse voltado ao padrão
pré-pandemia. A força de trabalho no primeiro trimestre ainda mostra
cerca de 4,5 milhões de pessoas a menos do que em igual período de 2019,
no período pré-pandemia.
Para
os muitos cidadãos brasileiros horrorizados com o governo Bolsonaro e
seu contínuo flerte com ideias antidemocráticas ou a defesa escancarada
da barbárie, o definhamento eleitoral do atual presidente é uma boa
notícia.
Infelizmente,
porém, a travessia até o momento em que o País talvez se livre de ter
na presidência uma personalidade nefasta como Bolsonaro pode ser muito
turbulenta.
Na
área política, o desespero de eventualmente constatar que a retomada
econômica não será suficiente para reeditar o clima nacional de 2018 –
até porque toda a fantasia moralizadora que veio junto com a eleição de
Bolsonaro foi devidamente destruída pelos muitos fatos escandalosos do
seu governo – pode trazer radicalização antidemocrática por parte do
presidente.
Um
mote inicial já está sendo trabalhado por Bolsonaro e seus aliados,
inclusive – para escândalo de quem entende a gravidade do fato – alguns
auxiliares das Forças Armadas. Trata-se do voto impresso, uma aberração
desnecessária num país que vem realizando eleições exemplares e limpas
desde a redemocratização.
O
truque antidemocrático contido na demanda pelo voto impresso é
claríssimo. Se ele for aprovado, será a senha para perdedores pedirem
incontáveis recontagens, tumultuando o bom funcionamento da democracia.
Se a ideia for derrotada, será a justificativa para Bolsonaro alegar que
a eleição de 2022 – caso ele perca – foi “fraudada”.
Se
a eventual “desbolsonarização” do Brasil não será um processo indolor
na parte política, o mesmo pode ser dito em relação à economia. Mas aqui
o problema é mais complexo.
Como
indica a matéria de Adriana Fernandes, no desespero de tentar recuperar
popularidade, o presidente vai tentar distribuir “bondades”. É de se
imaginar que, se as intenções de votos não vierem, essas bondades podem
se multiplicar até se tornarem um sério estrago na política fiscal.
Antes
mesmo que isso ocorra, o mercado vai antecipar as más consequências. E,
do outro lado, Lula, o principal candidato a derrotar Bolsonaro – e o
mesmo pode se dizer de Ciro – poderá, ao que indicam seus passos até
aqui, atear ainda mais o pânico econômico, jogando as fichas no discurso
populista para desestabilizar com mais força ainda o final do governo
Bolsonaro.
A eventual débâcle do bolsonarismo no poder pode ser um espetáculo com um lado muito feio. Mas nem por isso menos necessário.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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