MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

sábado, 19 de junho de 2021

Distribuir sobras de comida é o mais criativo projeto impossível de Paulo Guedes

 


Guedes defende utilizar sobras de restaurantes para alimentar pobres

Pedro do Coutto

Ao participar na quinta-feira do Fórum Nacional de Abastecimento, promovido pela Associação Brasileira de Supermercados, o ministro Paulo Guedes apresentou como solução para combater a fome a distribuição de sobras de comida de restaurantes deixadas nos pratos pelos clientes.

Com isso, ele propõe o absurdo de querer apresentar como solução contra a miserabilidade uma nova geografia da fome, título do livro clássico de Josué de Castro, escrito há mais de 70 anos.

ORDEM DO DIA – Josué foi deputado federal e dedicou sua vida a analisar a possibilidade da fome ser combatida no país. O seu projeto não vingou, tanto que a fome agora voltou à ordem do dia como uma das questões prioritárias da população brasileira. Reportagem de Bernardo Caram, Folha de São Paulo de ontem, focaliza o assunto que também é tratado pela repórter Gabriela Caseff, na mesma edição.

O ministro Paulo Guedes considera que a classe média come demais e por isso deixa sempre no prato as sobras de alimentos, e essa solução funcionou na Europa após a Segunda Guerra. “O prato de um [membro de] classe média europeu, que já enfrentou duas guerras mundiais, são pratos relativamente pequenos. E os nossos aqui, nós fazemos almoços onde às vezes há uma sobra enorme. Isso vai até o final, que é a refeição da classe média alta, até lá há excessos”, disse Guedes.

O ministro acrescentou que toda aquela alimentação que não for utilizada em determinado dia no restaurante deve ser dada para alimentar pessoas desamparadas. É muito melhor do que deixar estragar essa comida toda”, afirmou Paulo Guedes.

FLEXIBILIZAÇÃO – Guedes fez uma promessa aos dirigentes de supermercados, e disse que o governo deverá avaliar a flexibilização da regra que trata da validade de alimentos no Brasil. Custa crer que isso seja apresentado como política de governo, já que se o alimento está classificado dentro de um período, como alterá-lo por vontade do governo ou da concordância dos donos de supermercados?

A fome tem que ser combatida com empregos. O problema está no mercado de trabalho. O benefício é válido, mas não é a face essencial do problema que desafia o passar do tempo.

A ministra Tereza Cristina, da Agricultura, participou do evento e propôs criar um grupo para avaliar o tema da prorrogação do prazo de validade. Ela acha que poderia ser feita uma adaptação, sem precarizar, o verbo que ela usou, fatos e obstáculos em relação à validade dos alimentos.

NÃO SABE O QUE É FOME – Para Rodrigo Afonso, diretor-executivo da ONG Ação da Cidadania, organização de combate à fome fundada por Betinho em 1993, a sugestão de Guedes em destinar sobras de alimentos de famílias e restaurantes a pessoas vulneráveis mostra que o ministro “nunca sentou com uma família para saber o que é fome.”

Não há necessidade de sentar à mesa com pessoas com fome para se avaliar esse drama, que é a luta para adquirir alimentos. Isso tem mais a ver, penso eu, com a questão do desemprego do que com a capacidade de se resolver problemas com utopias. No caso da validade dos alimentos, o problema não é só de fome, mas junto com ela uma iniciativa capaz de produzir intoxicações.

O Ministro Paulo Guedes, como sempre, propõe projetos inexequíveis. Funciona no papel e nas telas de computadores, mas não chega ao estômago e à ansiedade das populações carentes que têm na fome o seu flagelo diário. Rodrigo Afonso lembra ainda a frase de Betinho: “quando pessoas passam fome, todos os outros direitos lhes foram negados”. Dar um alimento como uma ração humana é uma humilhação.

ELETROBRAS – Reportagem de Manoel Ventura, O Globo, focaliza a aprovação pelo Senado da Medida Provisória do presidente Bolsonaro que autoriza a privatização da Eletrobras. Vale assinalar que a privatização é um processo complexo, não se trata apenas de colocar ações novas no mercado. É sobretudo uma questão de preço e além deste as consequências prováveis e inevitáveis que revestem a questão.

Mas há um ponto do texto aprovado, que voltará para a Câmara pois recebeu emendas de senadores, que merece uma atenção especial. Um dispositivo incluído dispensa de licença ambiental a instalação de uma linha de transmissão muito extensa no  país.  Mas por que deve ser dispensada a licença ambiental? Ela é exigida para a Eletrobras que é estatal, mas deixaria de ser exigida para uma Eletrobras eventualmente privada? Não é possível. É preciso que a Câmara ao votar a matéria elimine essa dispensa fundamental a qualquer obra pública no país.

O prazo para a Câmara votar termina no dia 22, quando se esgota a validade da MP que está em vigor. Ainda existe tempo para consertar maiores estragos. Mas dificilmente ocorrerá tal desfecho, sobretudo em face dos altos interesses de que a matéria engloba.

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