A paz e a ordem internas vão se dilacerando com antagonismos incríveis entre governadores e governo central; a segurança interna é discutível. Artigo de Marcos L. Susskind para a Gazeta, recordando a história de Roma:
Há
alguns dias li algo que pode perfeitamente ser adaptado ao Brasil.
Trata-se do motivo pelo qual não se coloca os Dez Mandamentos nas sedes
políticas da nação. Afinal, causaria tremendo rebuliço escrever nos
prédios públicos: “não roubarás”, “não cometerás adultério” e,
principalmente, “não darás falso testemunho”. Imagine estas normas em
locais cheios de políticos, juízes e advogados!
Ironias
à parte, este artigo se baseia no que escreveu Evan Andrews em 2014, e
que é – infelizmente – atual para o Brasil. Andrews analisava os motivos
para a derrocada de Roma, o maior império da Antiguidade, que abarcava
toda a Europa, a Ásia, todo o Norte da África e o Oriente Médio sob jugo
romano. Lembremo-nos de que o fim da hegemonia romana se deu quando o
sistema imperial provou ser incapaz de manter a paz e a ordem internas, e
Roma não podia mais manter aquelas instituições e políticas das quais
dependiam a unidade, segurança e prosperidade das terras mediterrâneas.
Isto
lembra, por acaso, o Brasil de 2021? A paz e a ordem internas vão se
dilacerando com antagonismos incríveis entre governadores e governo
central; a segurança interna é discutível, com medo presente entre todos
os cidadãos, o desemprego e a quebra de empresas corroendo a
prosperidade dos cidadãos.
Andrews
menciona diversas razões, mas me aterei a poucas delas, muito
importantes para serem ignoradas. A vastidão do Império Romano gerava
dificuldades de comunicação, apesar de excelentes estradas e meios de
contato. O Brasil tem imensidão geográfica (somos o quinto maior país do
mundo) e não deveria haver problemas de comunicação – temos bom sistema
telefônico, internet, comunicações terrestres e aéreas e,
principalmente, uma só língua. E ainda assim temos uma dificuldade
imensa de comunicação, função de diferenças ideológicas e de confrontos
de personalidade.
A
falta de entendimento entre a presidência e certos governadores, e
entre estes e prefeitos, cria uma balbúrdia de comunicação e,
consequentemente, de tomada de decisões, que acabam sendo postergadas ou
tomadas mais em função de posição política do que em função das
necessidades da população – o que leva ao desperdício de recursos
financeiros, humanos e materiais.
Um
outro fator comum entre a derrocada de Roma e os riscos atuais no
Brasil é a crescente corrupção. Lideranças ineficientes e
inconsistentes, somadas à corrupção endêmica, formam uma perigosa sopa. O
Brasil tem importantes políticos presos ou aguardando prisão.
Recentemente tivemos na cadeia, condenados ou indiciados ex-presidentes
da nação, ex-presidentes da Câmara dos Deputados e ex-presidentes do
Senado. A podridão nos altos escalões políticos faz com que um
sem-número de senadores, deputados federais, governadores, prefeitos e
membros do Judiciário sejam investigados em casos de fraudes, desvios,
subornos e todo tipo de crime de corrupção. A ineficiência e a leniência
do Judiciário, infelizmente, não coíbem estas ocorrências, pois o
acusado pode ser julgado e recorrer a inúmeras instâncias em processos
longos, cheios de recursos e “pedidos de vistas” que quase funcionam
como garantia de impunidade, estimulando a continuidade deste perverso
sistema.
Há
mais um fator que não pode ser desprezado: o baixo nível educacional da
população. Tomemos o exemplo da engenharia. Em 2010 o Brasil registrou
184 patentes de tecnologia. No mesmo ano, a Rússia registrou 5.698; o
Japão, 7.334; os EUA registraram 11.905; e a China, 60.908.
Infelizmente, em 2020 estes números nos colocaram ainda mais distantes
dos países líderes. Esta defasagem se dá em muitas outras áreas, o que
talvez explique a baixa produtividade nacional. Um trabalhador
norte-americano produzia quatro vezes mais que um brasileiro em 2018. Em
2019 (último dado disponível), a produtividade do brasileiro caiu 1%
enquanto nos EUA subiu 1,7%. E não estamos comparando com a Coreia do
Sul ou a China...
A
mudança das crenças e valores romanos foi outro fator importante para a
queda daquele império. E em nossa sociedade, o que ocorre? Os valores
familiares atacados diuturnamente na televisão e no cinema, as músicas
de duplo sentido incentivando rompimento com valores tradicionais, a
quebra do respeito aos pais, a “deusificação” da juventude e o abandono
do conhecimento e experiência dos mais velhos vão criando uma ruptura
pela qual já estamos pagando, mas pagaremos muito mais em poucos anos.
Aliado a isso, vemos a difusão das drogas e a defesa da liberação das
mesmas sem preocupação alguma com a capacidade dos sistemas de saúde
para enfrentar as consequências inevitáveis de agravamento da saúde
física e mental, bem como do incremento de absenteísmo laboral,
rompimentos familiares e queda de renda entre os dependentes químicos.
Para
terminar, há de se lembrar que Roma sofreu com o desengajamento da
juventude sadia em seu exército. Jovens deixaram de ver a necessidade de
lutar e defender seu país. No Brasil isto se verifica tanto na área
política como educacional. A potência das nações já não se mede por sua
força militar, mas por seu sistema educacional e sua liderança política.
Infelizmente o Brasil há muito não atrai sua juventude para estas áreas
cruciais.
Sim, ainda há tempo para mudanças. Mas elas precisam se iniciar o quanto antes. Talvez ainda hoje – para que não seja tarde.
Marcos L. Susskind é ativista comunitário, palestrante e guia de turismo em Israel.

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