Artigo do escritor Theodore Dalrymple (várias obras traduzidas no
Brasil) sobre a tentativa de impedir o Brexit, aprovado por maioria em
referendo convocado pelo próprio Parlamento, que hoje está mais para a
União Europeia:
A Suprema Corte do Reino Unido, numa decisão unânime, reverteu a
suspensão do Parlamento determinada pelo primeiro ministro Boris
Johnson. De longe, o comentário mais revelador sobre a derrota de
Johnson foi feito por Guy Verhofstadt, importante belga membro do
Parlamento Europeu, que disse que esperava jamais ouvir um defensor do
Brexit falar que a União Europeia não é democrática. Mas é difícil dizer
o que é mais notável, a lógica de Verhofstadt ou sua concepção da
democracia.
Mesmo que fosse indubitavelmente verdade o fato de que a suspensão do
Parlamento proposta por Johnson era ilegal e até não-democrática, isso
não quer dizer que a União Europeia é democrática e que, portanto, ela
está imune a qualquer crítica que a considere não-democrática. Se um
país é uma ditadura, isso não impede que outro também seja.
Mas os europeus deveriam estar preocupados mesmo é com a estranha
visão de Verhofstadt quanto ao que significa a democracia. O Reino Unido
não é normalmente governado pela democracia direta, o que seria
praticamente impossível — e o próprio Parlamento, por uma maioria de
80%, voluntariamente convocou o referendo sobre a questão da permanência
do Reino Unido na União Europeia, entendendo, assim, que o governo
deveria obedecer o resultado.
Não seria um exagero dizer que, desde então, o mesmo Parlamento que
convocou o referendo fez todo o possível para se opor, obstruir,
atrasar, diluir ou explicitamente anular a implementação do resultado -
que foi o inesperado. A líder de um importante partido político, o
Partido Liberal Democrata (nota do editor: apesar de “liberal” no nome, a
tendência do partido é progressista), disse que, se um segundo
referendo fosse convocado, ela aceitaria o resultado somente se fosse o
que ela defendia – isto é, a permanência do país na União Europeia.
Guerra é paz, liberdade é escravidão e democracia liberal é o governo
inconteste do líder.
Verhofstadt está ao lado daqueles que lutam para reverter o resultado
de uma votação que ninguém pode negar que foi democrática. Ao mesmo
tempo, eles tentam se esconder sob o manto da democracia. Em outras
palavras, a democracia de verdade é o governo do pensamento certo, e o
objetivo de um referendo em qualquer país da Europa – como era na época
de Napoleão III – é legitimar uma decisão que já foi tomada.
Em comparação com aqueles que tentaram e ainda tentam obstruir o
Brexit, o general Augusto Pinochet — o ditador chileno – era um
democrata. Quando ele perdia um plebiscito, aceitava. Verhofstadt
prefere considerar democratas aqueles que, como os membros do Parlamento
britânico no meio de um impasse político, se recusam a convocar
eleições para evitar que o eleitorado vote errado de novo. (Gazeta do Povo).
Theodore Dalrymple é editor
colaborador do City Journal, ocupa a cadeira Dietrich Weismann no
Instituto Manhattan e é autor de vários livros, entre os quais “Out Into
the Beautiful World” e o recém-lançado “Grief and Other Stories”.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

Nenhum comentário:
Postar um comentário