Anomalia é conhecida como sindactilia; cirurgia é o único tratamento.
Integrantes dizem sofrer preconceito; mutação é considerada rara.
"Quando somos formados, ainda dentro do útero, todos nós temos os dedos das mãos e dos pés colados por uma membrana. A falha de mecanismos de destruição dessa estrutura ocasiona a sindactilia e é definida pelos nossos genes. Os dedos a mais são formados nesse mesmo momento. Existe uma 'falsa sindactilia' que também acontece dentro do útero, mas não tem relação com os genes e normalmente afeta só uma pessoa da família", explica.
Alguns integrantes da família também desenvolveram a polidactilia – presença de um dedo a mais na mão ou no pé. Segundo a geneticista, é comum a associação da sindactilia com outras alterações das mãos, como encurtamento dos dedos ou a polidactilia.
"A incidência no meu ramo familiar é de 50% e acredito que esse porcentual segue adiante. Devido ao preconceito, passei instintivamente a andar com as mãos nos bolsos. Mesmo assim, fui adiante. Fui empregado como datilógrafo bilingue, em 1967, no antigo Geipot [Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes, estatal extinta 2008] em Fortaleza. Trabalhei na embaixada americana e era uns dos mais rápidos nas calculadoras na época."
O caso de Gonçalves é considerado o mais “grave” da família. Segundo ele, diversos médicos se ofereceram para realizar o procedimento cirúrgico. "Aprendi a fazer tudo que uma pessoa normal faz. Agora, com mais de 70 anos, não irei me resolver com a operação."
A analista Cynthia Campos Gonçalves, de 37 anos, fiolha de Gonçalves, optou pela cirurgia. O procedimento fez com os dedos fossem "descolados". Mesmo assim, segundo ela, a característica "única" da família é tratada com naturalidade e até alegria.
Apesar das brincadeiras, Cynthia relata momentos de preconceito vividos tanto na adolescência quanto na vida adulta. Os mais novos integrantes da família são Izaque e Anna Clara, de 2 anos e 9 anos, respectivamente.
"Minha sobrinha, a Anna Clara, é a que mais sofre. Os amiguinhos falam que não querem brincar porque ela tem os dedos feios. Ela acaba se isolando. Porém, sempre converso com ela. Mostro que somos normais sim e somos lindas. Aos olhos de Deus, somos perfeitas."
Anomalia rara
A sindactilia isolada é rara e ocorre em 3 pessoas a cada 100 mil entre os dedos médio e anular das mãos e em 12 pessoas a cada 100 mil entre o segundo e o terceiro dedos dos pés. "Também pode acontecer associada a outras alterações, o que chamamos de síndrome, e nesses casos pode ser ainda mais rara", explica.
Várias técnicas cirúrgicas podem ser utilizadas para tratar a anomalia, diz a médica Rosenelle. "A cirurgia é necessária para separar somente a pele ou, em alguns casos, ossos dos dedos que podem estar grudados."
Quem nasce com a sindactilia pode ter alterações em outras partes do corpo: ossos, crânio, olhos, cérebro, dentes, coração. Se a pessoa nasce sem esses problemas em órgãos, geralmente não será afetada após o nascimento, explica a médica.
"A importância da avaliação clínica pelo médico geneticista é justamente definir quais outras alterações podem estar presentes e quais pessoas da família podem ser afetadas."
'Família hexa'
O caso dos Gonçalves lembra o da família Silva, também do Distrito Federal: dos 24 integrantes, 14 nasceram com 6 dedos nas mãos e nos pés. O primeiro da família a apresentar polidactilia, a mutação genética que leva uma pessoa a nascer com dedos a mais, foi o patriarca, Francisco de Assis Carvalho da Silva.
A gente encara isso com muita naturalidade, acho que até pela forma como meu pai lidava. Aqui em casa, quem tem 5 dedos é que tem complexo. Funciona ao contrário", explica Silvia, uma das filhas.
"Tenho três filhos, e só o mais velho [Eduardo] é que não tem [6 dedos]. Quando levei minha filha [Ana Carolina] para tirar os do pé, porque para colocar sandalinha complicava um pouco, Dudu pediu para guardá-los para colocar na mãozinha dele. Ele tinha 5 anos e se sentia excluído."
Durante a Copa do Mundo, a família chegou a organizar uma festa junina batizada de "Festa do Hexa", em referência ao número de dedos de seus integrantes e à possibilidade de o Brasil conquistar seu sexto título mundial de futebol. Reunida, porém, a família ficou desapontada com a derrota do Brasil para Alemanha por 7 a 1 na semifinal do torneio.
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