Prefeitura quer centro de cultura; moradores preferem espaço de compras.
Manifestantes ocuparam Eufrásio Barbosa, no Varadouro, neste sábado.
Janelões na fachada do Mercado Eufrásio Barbosa estão quebrados (Foto: Luna Markman/G1)
A Prefeitura de Olinda
tem um projeto para revitalizar o Mercado Eufrásio Barbosa, no bairro
do Varadouro, interditado pela Defesa Civil há pelo menos cinco anos. A
ideia é fazer uma reforma estrutural para transformá-lo num centro de
artes, com dois novos museus e salas de exposição. Por meio do Programa
de Desenvolvimento do Turismo (Prodetur), o governo de Pernambuco
contratou a obra, orçada em R$ 11 milhões. No entanto, o Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID) só libera o dinheiro após uma
consulta popular e a aprovação do Conselho de Preservação do Sítio
Histórico. No entanto, moradores, liderados pela Sociedade Olindense de
Defesa da Cidade Alta (Sodeca), reclamam que não participaram da
elaboração do plano e afirmam que preferem o espaço com a função
original: um mercado público que abasteça a cidade e atraia turistas.
Neste sábado (10), manifestantes ocuparam o estabelecimento em defesa do
diálogo com a sociedade.
Representante da Sodeca pede mais diálogo
(Foto: Luna Markman/G1)
O projeto foi apresentado aos moradores em audiência pública no
primeiro semestre deste ano. Ele prevê a recuperação estrutural,
restauração do jardim e do Teatro Fernando Santa Cruz, onde funcionaria
um cine-teatro, além da reforma dos banheiros e boxes de artesanato,
instalação de restaurante, lanchonetes, bibliotecas, espaço para
exposições, salas multiuso e salas explicando história do mercado e sua
evolução urbana. O espaço central, onde se realiza shows e eventos
culturais, permaneceria disponível, com tratamento acústico e limite de
capacidade. Um espaço ao ar livre, hoje desativado, acomodará barracas
para diferentes usos, além de ensaios e apresentações.(Foto: Luna Markman/G1)
Apesar da apresentação do plano, quem participou da audiência garante que não houve diálogo. "O projeto foi apenas apresentado, não queriam nos ouvir, por isso a Sodeca convocou uma nova reunião com a prefeitura, onde pudemos expor nossas reivindicações. Queremos algo dentro do contexto da sociedade, discutido com a população. Nada muito elitista, com museu para pagar entrada, mas resgatar a essência do mercado. No começo, a prefeitura estava intransigente, mas agora parece mais aberta. Teremos um encontro na próxima semana para tentarmos chegar a um consenso", explicou o coordenador de planejamento da Sodeca, Edmilson Cordeiro.
A pressão da Sodeca, que espalhou insatisfação nas redes sociais e colhe assinaturas numa petição online, estendeu o prazo que a Prefeitura tem para apresentar o projeto concluído em 30 de agosto. Caso contrário, a prefeitura pode perder o financiamento. Na petição, a organização fala que o projeto atual não atende às necessidades da população nem gera benefícios aos moradores do entorno. A ideia geral é que o mercado sirva a cidade com produtos variados de consumo e também atue como equipamento cultural.
Área dos boxes seria reformada pela Prefeitura, mas está abandonada (Foto: Luna Markman/G1)
A arquiteta e urbanista Vera Milet, que representa a Sodeca no Conselho
de Preservação, lembra a decadência do Eufrásio Barbosa, que no século
17 era uma alfândega. Na metade do século 20, virou fábrica de doce e,
em 1990, foi reaberto como mercado público. "A deficiência na gestão e
manutenção do espaço, assim como as transformações nos usos dos boxes,
acabou neste sucateamento. Nossa maior preocupação é que a obra seja
feita e isso vire um elefante branco. Ele precisa ser útil para a
população, com várias possibilidades de uso", disse.Hoje, o Eufrásio Barbosa está praticamente desativado, funcionando com apenas sete lojas de artesanato, uma agência bancária e um bar. A comerciante Inajá Almeida está no mercado desde a sua abertura, em 1990. Recorda que na época havia 28 lojas de artesanato, dez bares e lanchonetes e dez lojas de abastecimento, tipo carne, peixe, ervas, frutas e verduras. "A falta de manutenção deu no que deu. Em 2006, fecharam para uma reforma que seria de seis meses e até hoje não abriram. Queremos uma reforma que dê aconhego ao público e ao turista, algo simples e acessível", comentou.
Artista ocupa Eufrásio (Foto: Luna Markman/G1)
A artista plástica Elizabeth Miranda participou da ocupação na manhã
deste sábado. Num mural, escreveu o que espera do novo mercado, que
frequentou durante toda a vida. "Lembro que comprava alimentos aqui, vi
filme no cine-teatro, queria que isso voltasse, mas de forma organizada.
Queria também feira de orgânicos, exposição de arte, baile da boa
idade, brechó", comentou. O Maracatu Nação Pernambuco também marcou
presença. O grupo costuma a ensaiar no espaço, mas teme que a atividade
seja suspensa após a reforma.A cantora Catarina Dee Jah, que reside em Olinda, afirma que os moradores foram pegos de surpresa. "Não nos consultaram para nada. A cidade já tem muito museu e sabemos a dificuldade que é para mantê-los. O mercado deve atender à demanda da população e ser uma referência para os turistas. Queremos dar as mãos para a prefeitura para fazermos um novo projeto juntos. Minha memória afetiva em relação ao Eufrásio é muito grande. Comprei fogos no São João, tecidos para fantasias no Carnaval, frequentei as primeiras festas", disse.
Assim como Catarina, o guitarrista Juliano Holanda, que também mora em Olinda, espera que o local volte a ser um epicentro artístico-cultural. "É o nosso 'Chevrolet Hall', fica logo na entrada da cidade. Precisa ser mais bem aproveitado, com atividades ao dia. Hoje, só funciona quando um produtor toma iniciativa", disse. A assessoria de imprensa da Prefeitura de Olinda foi procurada pelo G1, mas não deu retorno até a publicação desta reportagem.
Manifestantes escrevem em mural o que desejam no Eufrásio Barbosa (Foto: Luna Markman/G1)
Nenhum comentário:
Postar um comentário