A população mais velha é que sente o peso claro da desumanização nas relações com os bancos. Luiz Felipe Pondé via FSP:
Sei
que muitas empresas instituíram departamentos de diversidade. Parabéns.
Sem dúvida, para grupos que têm estado fora da cadeia produtiva e de
incentivos de carreira é uma boa. Alguns consideram esse fato um indício
de humanização nas relações corporativas. Não creio. O que há é uma
interação entre políticas de branding e ampliação no aproveitamento da
população jovem antes excluída.
Não
creio que ocorra hoje um processo de humanização nas relações
comerciais ou corporativas. Pelo contrário, acho que está em curso uma
nova onda de desumanização radical.No campo das relações com o
consumidor, a desumanização salta aos olhos. Banking
é o campeão da desumanização na relação com seus clientes. Interessante
notar que o uso de uma expressão em inglês como "banking" para as
relações entre os bancos e os clientes —além do tom brega de tudo que
opta por termos em inglês para ficar melhor no ranço do marketing e do
branding— aponta para uma desumanização gourmetizada.
Falar
em banking é como se sua relação com o banco tivesse entrado numa nova
era de luz, felicidade e realizações. Basta ver a dimensão solar dos
comerciais de banking. O mundo nunca foi tão lindo. Meninos, meninas e
menines jovens brilham sob a luz do futuro que emana dos aplicativos dos
bancos nos seus celulares. Tudo funciona e todo mundo é feliz.
Atendimento 36 horas por dia.Houve de fato uma disrupção, como gostam de
dizer no mundo corporativo, nas relações entre bancos e clientes. Fruto
da digitalização radical dos bancos, essa disrupção transformou o
cliente num elemento indesejável no cotidiano dos bancos. Um pouco como
os alunos já são no cotidiano do sistema de educação: um elemento
indesejável, ainda que necessário, na burocracia do MEC, da Capes e do
mercado.
No
caso do banking há um corte geracional significativo no processo de
desumanização em curso. Os mais jovens, acostumados ao mundo digital e
aos maus-tratos deste, travestidos de revolução tecnológica colorida,
não sabem como era quando falávamos com seres humanos. Não gostam dessa
atividade de conversar quando estão fazendo uso do setor de serviços
—preferem algoritmos e mensagens.
O
banking para eles é normal: não ter ninguém para falar é o melhor dos
mundos possível. E se o aplicativo dá pau, tudo bem, esse é o "novo
normal" —expressão idiota.
A
população mais velha é que sente o peso claro da desumanização nas
relações com os bancos. Gerentes que na verdade não existem, aplicativos
pouco friendly para quem tem mais de dez anos de idade. A cada dia
quatro novas senhas são necessárias, e se você precisar falar com
alguém, uma IA meio burra lhe atenderá mal. E caso, enfim, você chegue a
um humano, ele não será muito melhor do que a IA meio burra. A pessoa
repetirá frases e protocolos e reenviará você para algum aplicativo a
mais.
Mas
tudo bem, porque além do fato de esse mal-estar não passar de chilique
de gente velha, logo morrerão, o banking seguirá seu glorioso curso de
rupturas tecnológicas coloridas.
Um
dos maiores argumentos usados pelo banking para saturar as relações com
distanciamento, indiferença e ferramentas digitais desumanizadoras é a
falsa afirmação de que tudo isso é para segurança dos clientes. Mas,
como tudo hoje na comunicação corporativa, esse argumento é falacioso.
Uma mentira. Por quê?
Simplesmente
porque os mecanismos digitais de travamento dos processos estão a
serviço dos próprios bancos e suas seguradoras que valem bilhões de
dólares. Os bancos, e suas seguradoras, sim querem se proteger dos
riscos que são os clientes e da possibilidade de ter que ressarci-los em
caso de sinistros.
A
comunicação dos bancos hoje é o maior exemplo das mentiras
comportamentais que o capitalismo lança mão no seu momento mais
glorioso, em que tudo, mesmo a esquerda, mama em suas tetas.
Mesmo
que serviços de atendimento ao consumidor existam, todos eles são uma
caricatura da realidade.Não servem para nada. A desumanização no
importante setor de serviços é um sinal do futuro que nos espera. Só
idiotas de mercado não veem isso.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nenhum comentário:
Postar um comentário