Em vez de olhar a maneira como as pessoas se comportam, vendemos como elas deveriam se comportar. Luiz Felipe Pondé para a FSP:
Faz tempo que a análise de tendências de comportamento se transformou em marketing de comportamento.
Em vez de olhar a maneira como as pessoas se comportam, vendemos como
elas deveriam se comportar para serem vistas como alguém bacana.
Esse
processo de empobrecimento tende a acompanhar o ethos da maior parte
das redes sociais —mentir sobre si mesmo e supervalorizar a própria
inteligência, a fim de esconder a real estupidez, e editar a própria
imagem, a fim de encobrir a própria fealdade.
Quer
um exemplo? Quando uma marca importante oferece 72 gêneros diferentes
para seus consumidores dizerem qual é o seu, confunde-se marketing (a
mensagem é “aceitamos o que você é, seja lá o que você seja”) com o fato
de que identidades sexuais e de gênero não são estilos de lojas de moda
—tampouco há 72 estilos diferentes, talvez sejam sete, no máximo. O
próprio conceito de gênero pode desaparecer dentro de algum tempo,
passada essa moda.
O
mundo não será mais feminino, mas assexuado como tendência do
comportamento humano. A vida sexual está em baixa. As pessoas confiam
menos umas nas outras, homens e mulheres se entendem cada vez com menos
frequência.
A
vida sexual adulta exige compromissos que estão fora de moda. O celular
é o melhor contraceptivo no mercado. Além disso, filhos são um passivo
perigoso na carreira profissional das pessoas, principalmente das
mulheres, além de serem um passivo também na programação da vida
financeira a curto prazo. A vida tornou-se longeva, mas as almas
perderam o fôlego.
Arriscaria
dizer que a ideia de que o feminino deixará o mundo corporativo mais
doce, emocional e inclusivo significa imaginar que o ambiente de
trabalho não transforma, com o passar do tempo e com a piora da
competição, todo mundo em lobo e loba.
Esse
tipo de ideia confunde a mulher que entra para o mercado de trabalho
com a mãe e a avó que quase não existem mais no mundo. Em breve, todos
serão bestas e feras à caça dos mais fracos.
As
gerações mais jovens não farão o mundo melhor. Devo adiantar que nunca
existirá um mundo melhor, graças a Deus. A sociedade melhora em algumas
áreas, mas sempre acaba piorando em outras.
Como
diz o filósofo britânico John Gray, nascido em 1948, no seu maravilhoso
livro “Cachorros de Palha”, lançado no Brasil pela Record, nada seria
mais terrível do que uma humanidade perfeita. A espécie humana é formada
por um animal como qualquer outro da natureza. Sendo assim, não é dona
do seu destino.
Os jovens estão sendo despedaçados pelo mercado de trabalho e serão ainda mais escravos do que seus pais foram. O marketing
confunde essa geração ao dizer que eles podem trabalhar menos horas
convencionais, graças à internet. Na verdade, trabalharão muito mais
fora do esquema convencional de antes.
No
caso daqueles que, de fato, poderão trabalhar menos, poderão fazer isso
porque seus pais deram a eles essa condição material prévia. Não se
deve confundir nichos de comportamento com tendências viáveis de longo
ao alcance do amplo espectro.
A política será cada vez mais violenta e confusa. As eleições recentes aqui e nos Estados Unidos
nos levaram a crer que exista um cansaço na política profissional com
relação às polarizações, favorecendo, em alguma medida, partidos menos
afeitos aos polos, com históricos institucionais e com apelo centrista
—lembre-se que o eleito Biden era o candidato americano de centro .
Mas,
após a vitória, a pressão voltou dentro do próprio partido Democrata
americano. A instabilidade de vocação imediatista da guerra cultural dos
dias de hoje me parece dissociada dos festejos de uma possível ida ao
centro.
Isso
se deve à presença das redes sociais como ator político coletivo. Essas
redes têm uma natureza de pobreza semântica aguda que complica a
possibilidade de diálogos políticos institucionais. O próprio fetiche da
entrada do jovem no mundo partidário aumenta o risco de intolerância na
política profissional. Jovens são tolerantes apenas à música alta.
Enfim,
o século 21 será o século da mentira. O marketing será a principal
tarefa da filosofia —e a missão será destruí-lo como modelo de mundo.
Conseguiremos?
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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