Bolsonaro chegará ao fim do mandato sem realizar qualquer reforma profunda nas estruturas de nosso arcaico modelo de desenvolvimento. Como dizia Roberto Campos, “o Brasil não perde a oportunidade de perder oportunidades”. Márcio Coimbra para a Gazeta do Povo:
Bolsonaro
chegou ao poder cercado de expectativa, planos e promessas de liberdade
na economia. Trazia um ativo importante em sua equipe, Paulo Guedes,
que prometia um choque de economia de mercado que sacudiria os alicerces
de um Estado paquidérmico que havia deixado a população refém dos
burocratas. Mais Brasil e menos Brasília era seu lema. Nosso país,
sequestrado pela burocracia, deveria ser recuperado para os brasileiros.
Em
entrevistas, dizia que, se dependesse dele, venderia todas as estatais.
Os liberais somaram-se ao governo Bolsonaro engrossando seus quadros,
inclusive este articulista, que assumiu a direção da Agência Brasileira
de Promoção de Exportações (Apex-Brasil). Para a Secretaria de
Privatizações, escolheu-se mais um liberal, Salim Mattar. O time chegou
esperançoso, com ganas de mudar o Brasil.
Os
problemas não foram poucos. A resistência da burocracia e as tramas
internas do governo começaram a minar nossas ações. Na Apex, em pouco
tempo desembarcaram oficiais da Marinha, enquanto no Congresso Nacional
faltava apoio para a agenda liberalizante de Guedes. A proposta liberal,
que reduz o poder do establishment, foi combatida de forma intensa pela
burocracia, com receio de que desmontássemos os instrumentos de
benesses governamentais de suas corporações civis e militares.
Hoje,
desembarcados do governo, Paulo Uebel, Salim Mattar e este que vos
escreve, entre tantos outros, seguimos firmes e confiantes de que a
agenda liberalizante é o melhor caminho para o desenvolvimento do
Brasil. Infelizmente, os desafios foram imensos e fomos vencidos pelos
jogos de poder, burocracia militante, militares patrimonialistas e pela
mudança de perfil presidencial durante o mandato.
Roberto
Campos disse certa vez, referindo-se ao governo Collor: “É lamentável. É
um desperdício profundamente lamentável. É mais uma oportunidade que o
país perde. Para mim é mais uma esperança que se frustra. Nunca o
liberalismo, que é a minha razão política, esteve tão perto de acontecer
neste país, e nunca foi tão irresponsavelmente escorraçado”. Faço
minhas as palavras do embaixador Roberto Campos mais de três décadas
depois.
O
governo Bolsonaro traiu o credo liberal e também a agenda fundamental
de todos aqueles que acreditam nos instrumentos da liberdade de mercado
como pilar fundamental do desenvolvimento. Até o momento, o Planalto
transitou em sentido oposto, fortalecendo o patrimonialismo,
clientelismo e paternalismo, instrumentos contrários aos valores
liberais, uma equação que resulta em populismo, aumento de gastos e
irresponsabilidade fiscal. Para resumir em uma palavra: desilusão.
O
poder transforma, mas, no caso de Bolsonaro, a equação tem sentido
inverso. No poder, o presidente retornou ao seu estado natural, um
deputado do Centrão nacional-desenvolvimentista e corporativista, que
votou contra reformas liberalizantes propostas em governos anteriores.
Bolsonaro
chegará ao fim do mandato sem realizar qualquer reforma profunda nas
estruturas de nosso arcaico modelo de desenvolvimento. Como dizia
Roberto Campos, “o Brasil não perde a oportunidade de perder
oportunidades”.
Márcio
Coimbra, cientista político e mestre em Ação Política pela Universidad
Rey Juan Carlos, é coordenador da pós-graduação em Relações
Institucionais e Governamentais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie
Brasília, diretor-executivo do Interlegis no Senado Federal e ex-diretor
da Apex-Brasil.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nenhum comentário:
Postar um comentário