Claro que o governo tem sido uma girândola de gênios, mas António Costa
(e Silva) é ainda mais genial do que os restantes. Prova? Se não fosse,
António Costa, gênio entre gênios, não o escolheria. No Observador, a crônica semanal de Alberto Gonçalves, sempre um texto primoroso, desta vez bem à portuguesa:
O convite de António Costa a António Costa (e Silva) para salvar a economia foi uma ideia maravilhosa. Isto
porque António Costa (e Silva) é genial. Claro que o governo tem sido
uma girândola de génios, do Ronaldo das Finanças ao Mantorras da
Economia, sem esquecer os diversos Quaresmas e Barriganas que integram a
ilustre família Vieira da Silva. Mas António Costa (e Silva) é ainda
mais genial do que os restantes. Prova? Se não fosse, António Costa,
génio entre génios, não o escolheria.
O convite de António Costa a António Costa (e Silva) para salvar a economia foi uma ideia excelente.
Isto porque António Costa (e Silva) é rápido. Em apenas dois dias,
desenhou um plano para 10 anos. E note-se que trabalhou de borla. Se o
governo não fosse forreta e lhe tivesse adiantado uns trocos, o coitado
teria matutado por 10 dias e planeado a economia para o próximo meio
século. Ou vinte dias para um século inteiro. E custava tanto patrocinar
António Costa (e Silva) durante um mês e assegurar a nossa prosperidade
até 2170?
O convite de António Costa a António Costa (e Silva) para salvar a economia foi uma ideia fantástica.
Isto porque António Costa (e Silva) é realista. Há dois anos, afirmou
que não valia a pena investir em Portugal porque, ao contrário do PSD do
tempo de Álvaro dos Santos Pereira (palavras dele), o PS governa “em
função do que dizem os autarcas e a opinião pública, sem haver uma
visão”. Se cada empresário com dois dedos de testa e uma mão fora do
bolso do contribuinte pensasse assim, haveria por cá muito menos
falências. E menos empresas. E menos salvadores. E menos trapaceiros.
O convite de António Costa a António Costa (e Silva) para salvar a economia foi uma ideia divina.
Isto porque António Costa (e Silva) é experiente. Aqui há décadas,
apetrechado de um mestrado informal em maoismo, andava metido naqueles
grupelhos que se combatiam para decidir quem mandava em Angola e assim
melhor açambarcava as riquezas e explorava os infelizes cidadãos. O
currículo dá-lhe um conhecimento privilegiado do que é a corrupção, o
terceiro mundo e, desculpem a redundância, Portugal.
O convite de António Costa a António Costa (e Silva) para salvar a economia foi uma ideia impecável.
Isto porque António Costa (e Silva) é original. Foi o próprio António
Costa a garantir que o seu quase homónimo “pensa fora da caixa”. De
início, julguei que se referia ao banco público, a CGD, cujas
instalações, por razões insondáveis, impediam o homem de raciocinar em
condições. Depois percebi que é uma daquelas expressões infantis, que no
caso tenta significar “inovação” ou algo similar. A propósito de
expressões cretinas, António Costa (e Silva) jura que “ser membro do
governo não faz parte do [seu] ADN”. Segundo António Costa, a
circunstância de António Costa (e Silva) pensar fora da caixa “ajuda a
ir mais além”. Estou em pulgas para descobrir onde.
O convite de António Costa a António Costa (e Silva) para salvar a economia foi uma ideia estupenda.
Isto porque António Costa (e Silva) é tradicionalista. Afinal, vai
conceber (ou já concebeu, em dois dias) o enésimo programa socialista
para elevar o país ao Olimpo das nações. Se os anteriores correram tão
bem, não há motivo para que este não corra melhor: em teoria, o que
distingue o socialismo é a capacidade de aprender com os erros – caso,
na prática, o socialismo não fosse perfeito logo à partida.
O convite de António Costa a António Costa (e Silva) para salvar a economia foi uma ideia magnífica.
Isto porque António Costa (e Silva) é socialista. Após muito reflectir
(dois dias, caramba), concluiu que aquilo de que Portugal carece é de
mais intervenção estatal. Pelos vistos, havia cerca de 0,04% da
sociedade a que o Estado não chegava e, logo, era incapaz de purificar.
De futuro, deixará de haver. Um alívio.
O convite de António Costa a António Costa (e Silva) para salvar a economia foi uma ideia esplêndida.
Isto porque António Costa (e Silva) é poeta. Escreveu, que eu tivesse
apurado, as obras “Aroma de Pitangas num País Que Não Existe”, “Jindungo
nos Olhos dos Outros é Mufete”, “Jacarandá e Mulemba”, “Fotografias
Lentas do Diabo na Cama” (acreditem se quiserem: só um dos títulos é
falso). Este último tem epígrafes de Goethe e Pound. Felizmente,
segue-se António Costa (e Silva), com deslumbres assim incontestáveis:
“O fluxo do tempo/Percorre o corpo/Dia a dia/Ano a ano”.
O convite de António Costa a António Costa (e Silva) para salvar a economia foi uma ideia prodigiosa.
Isto porque António Costa (e Silva) é altruísta. Em vez de assinar os
livros sozinho, em todos cedeu metade das páginas a Nicolau Santos,
outro nome forte da poesia e do jornalismo e o responsável por mostrar
ao mundo outro Silva, outro poeta e outro grande economista do PS: o
inesquecível Artur Baptista. Como não se compara o sublime, não
compararei as líricas de ambos. Cito o conhecido crítico literário Pedro
Santos Guerreiro, prefaciador de um dos livros, para dizer que na
poesia de António Costa (e Silva) “há beijos, muitos beijos
(beijos-mulher), há aromas, há silêncios, há olhos fechados que pensam o
sabor da beleza”, e que o que há em Nicolau Santos “não é sexo (também é
sexo) nem é busca de musa (também é busca de musa), é, no final, amor,
sempre o amor”. Assim é que é bonito.
O convite de António Costa a António Costa (e Silva) para salvar a economia foi uma ideia brilhante. Isto
porque António Costa (e Silva) duplica no calendário cada plano
quinquenal de Estaline, e terá um impacto certamente menos exuberante em
matéria de pobreza, fome e canibalismo. A desvantagem é que os génios
de Estaline frequentemente não sobreviviam aos respectivos sonhos, e à
semelhança do bom povo terminavam em valas comuns. Os génios escolhidos
por António Costa acabam os geniais planos melhor do que começaram, ao
contrário da ralé. Nisso a URSS era democrática.
Nota: esta coluna e o autor dela vão de férias por uma semana.
Regressam ambos dia 20. Entretanto, respeitem as indicações da DGS e do
governo, sejam elas quais forem. Quando isto acabar, vamos todos
abraçar Portugal. Vai correr tudo bem. Aliás, já corre.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nenhum comentário:
Postar um comentário