Usar
truques fiscais para ter ganho eleitoral foi uma estratégia usada muito
recentemente, e que todos sabem como terminou. Editorial da Gazeta do Povo:
O
relator da PEC Emergencial jura que não tem planos de furar o teto de
gastos, e até telefonou para o ministro Paulo Guedes para se explicar.
Mas o fato é que existe, sim, uma minuta do relatório do senador Márcio
Bittar (MDB-AC), enviada a líderes partidários a pedido do presidente do
Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP) e obtida pela imprensa, que previa um
truque para driblar o teto provisoriamente e cujo conteúdo foi
confirmado por técnicos do Congresso. As idas e vindas do relatório da
PEC Emergencial – que deveria ter sido apresentado na segunda-feira, dia
7, segundo promessa do líder do governo no Senado, Fernando Bezerra
(MDB-PE), mas até agora não foi divulgado – mostram como os “fura-teto”
não dormem em serviço e insistem em prejudicar a credibilidade do país
em nome de interesses imediatistas.
Após
o vazamento da minuta, passou-se a alegar que o trecho em questão era
de uma versão antiga da PEC dos Fundos, cuja relatoria era de Otto
Alencar (PSD-BA) – o senador abriu mão do posto para que ela fosse
incorporada à PEC Emergencial. O que ficou sem explicação foi como a
regra fura-teto entrou na minuta, e a esta altura ninguém assumirá a
autoria do enxerto. O drible no teto passa justamente pela extinção de
fundos públicos infraconstitucionais que não sejam confirmados pelo
Congresso em até dois anos depois da promulgação da emenda
constitucional que resultar da PEC Emergencial. São bilhões de reais que
estão parados nos cofres públicos, e que, pela regra presente na minuta
vazada, poderiam ser gastos em infraestrutura, programas voltados à
erradicação da pobreza (o que inclui o Bolsa Família ou seu possível
substituto, o Renda Cidadã), ações de segurança de regiões de fronteira,
revitalização da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco e projetos de
pesquisa e desenvolvimento científico, tecnológico e inovação, sem
precisar obedecer ao limite imposto pelo teto.
Bittar
reafirmou seu compromisso com a agenda econômica do governo e com o
ajuste fiscal. Em nota, afirmou que “o meu relatório não trará nenhuma
flexibilização ao teto de gastos” e que “seguiremos apoiando a agenda da
austeridade e da responsabilidade fiscal, trabalhando pelas reformas
estruturantes, pela melhora das contas públicas e pela retomada da
economia”. Além do telefonema de Bittar, Guedes recebeu uma nova minuta
na segunda-feira, sem o dispositivo fura-teto; na terça-feira, foi a vez
de os líderes partidários receberem o texto, de acordo com o relator.
Mas só a apresentação formal do relatório permitirá ter certeza a
respeito da presença ou ausência deste ou de outros truques para
contornar o teto de gastos.
A
certeza que o episódio deixa é a de que os adversários do teto de
gastos não descansam. Alguns o rejeitam por convicção ideológica, vendo
no gasto público o grande motor do desenvolvimento econômico; para
outros, o teto acaba inviabilizando despesas que renderiam importantes
dividendos eleitorais. Este último grupo inclui tanto parlamentares
quanto setores do governo, como o Ministério do Desenvolvimento
Regional. Há quem julgue que aumentar a despesa governamental é a única
forma de o presidente Jair Bolsonaro manter a popularidade conquistada
com medidas como o auxílio emergencial distribuído durante a pandemia de
Covid-19 e que deve ser encerrado no fim deste ano.
O
teto de gastos já foi deixado de lado emergencialmente, para acomodar
as necessárias despesas feitas para amenizar o estrago causado pelas
restrições aos negócios impostas para conter o coronavírus. A situação,
no entanto, justificava a medida. Coisa muito diferente é relativizar a
regra propriamente dita, abrindo exceções que, todos sabem, começam
pequenas, mas acabam se avolumando até que o descontrole volte a ser a
norma. Se Bolsonaro quer que a economia seja um ponto forte em seu plano
de reeleição, o caminho é o compromisso com o ajuste fiscal, elevando a
confiança do investidor interno e externo, o que por sua vez trará
geração de emprego e renda. Usar truques fiscais para ter ganho
eleitoral foi uma estratégia usada muito recentemente, e que todos sabem
como terminou.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nenhum comentário:
Postar um comentário