Por Fernando Cabral*
Não é de hoje que a alta do dólar é música aos ouvidos de grandes exportadores, afinal, moeda desvalorizada possibilita vantagem competitiva mundo afora. Com a deterioração do real, estrangeiros desfrutam de bens e insumos com baixo preço em nosso país tropical. Podemos dizer o mesmo para os investidores estrangeiros que desejam fazer fusões e aquisições (F&A) cross-border no Brasil?
Evidentemente que decisões de aquisições de empresas estrangeiras não se limitam a questões cambiais favoráveis. Outros fatores exógenos, como política, imprevisibilidade e intervenção do governo na economia, são algumas variáveis relevantes típicas de nosso país que influenciam a tomada de decisão. Segundo estudo feito pelo PhD em finanças e professor da Universidade Tulane (EUA), Eduardo Pablo, por meio de regressões logísticas, as determinantes que justificam F&A cross-border na América Latina são relacionadas aos maiores custos de financiamento que a empresa-alvo tem em relação às adquirentes.
Ao analisar a correlação da série histórica do Enterprise Value (valor real das companhias) das empresas listadas na B3 e o dólar no período de cinco anos (2014-2019), observa-se que não há evidências da influência da valorização do dólar no valor real das organizações, mesmo se for levado em consideração a representação de 45% dos estrangeiros na B3.
Fato é que a cada oscilação de desvalorização da moeda, ressurge nas mídias a ideia de existir boas oportunidades para estrangeiros adquirirem instituições brasileiras. Talvez uma explicação para isso seja a relação cognitiva de que viajantes pagam menos em países de moeda dispare. Tal suposição e pressuposto em fusões e aquisições teria a mesma lógica.
O que poucos mentalizam, porém, é: quando gastamos lá fora, no “dia seguinte” ganhamos em moeda local. Ao adquirente estrangeiro, que investe em países emergentes com câmbio desvalorizado – diferente do turista – receberá todos os fluxos futuros na moeda local, cuja conversão e repatriação será sempre desfavorável. Então, sob a ótica de criação de valor, o câmbio isoladamente parece não justificar o investimento.
Em meados de 2000, mesmo com o dólar desvalorizado, havia grandes investimentos estrangeiros no Brasil. Na época, emergiam expectativas: o Brasil era a “bola da vez”. Hoje, mesmo com o câmbio favorável para estrangeiros, as expectativas são baixas. A falta de previsibilidade minou qualquer possibilidade de investimentos internos e externos.
Por fim, encontrar ativos de qualidade que justifiquem a entrada de estrangeiros no Brasil nem sempre é tarefa fácil. O câmbio favorável ao adquirente internacional pode ser um estimulante adicional para F&A de baixo custo, mas embora atraentes, não são necessariamente criadores de valor. O barato sempre será relativo.
*Fernando Cabral é bacharel em Administração de Empresas pela UNAERP com especialização em Controladoria e Finanças pela Fundace/Fea – USP Ribeirão Preto. Como avaliador de empresas na Gordon Valuations, tem mais de cinquenta avaliações registradas desde 2007. No papel de advisor, já prestou assessoria para empresas de diversos segmentos e tamanhos. Como profundo estudioso e pesquisador das áreas de Finanças e Custos Gerenciais, lança nesta quinta-feira (26), na Livraria da Vila, a obra Avaliação de empresas – e os desafios que vão além do Fair Value, pela Lura Editorial.
Site do autor:http://avaliacaodeempresa.com.br/
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