"Acabar com o MEC nos livraria de todo tipo de burocrata que constrói
sua vida e seu orçamento atormentando quem, de fato, se ocupa com a
educação". Relembrando artigo de Luiz Felipe Pondé, publicado pela Gazeta do Povo em 2017:
Perguntam com frequência o que eu acho da reforma do ensino médio e
similares. Seria um avanço ou um atraso? Reforma na educação depende do
burocrata de plantão.
Suspeito de que a educação seja uma das áreas de conhecimento mais
perdidas no mundo atual. De um lado, acumulam-se teorias de que a
educação deveria contemplar apenas disciplinas técnicas. De outro, que a
educação teria como principal papel a formação do cidadão.
Outros pensam que a educação deveria ser revolucionária em tudo, e
mais outros, que a educação deveria formar valores morais sólidos. A
lista vai longe, chegando mesmo ao caso daqueles que pensam que a
educação deveria ser uma assembleia aberta em que bebês votariam na
estrutura curricular do jardim da infância para evitar a opressão
patriarcal.
Alguns, mais semiletrados, inovam a cada dia a educação a partir do
palestrante mais na moda e da última teoria politicamente correta no
mercado. Uma ideia continuamente na moda entre os teóricos é que a
educação deveria educar para a democracia e o bem público. Platão
concordaria com a segunda parte, mas não com a primeira.
Alguns acham que a educação deveria ser construída apenas a partir
dos oprimidos. Este último caso é tão delirante que alguns chegam a
afirmar que falar errado, sem levar em conta as regras da gramática, é
uma forma de combate à opressão. “É nóis” deixa de ser uma licença
poética e passa a ser um grito de liberdade.
Alguns professores por aí chegam mesmo a “caçar a pauladas” (leia-se
“reprovar”) alunos que falem corretamente na aula sob acusação de
reproduzirem padrões de dominação da elite.
Jacques Derrida (1930-2004), filósofo francês criador do conceito de
“desconstrução”, segundo o qual a gramática é uma forma de teologia
porque unifica modos de expressão, nunca imaginaria que sua teoria (ele
falava francês correto) um dia seria usada como argumento para
reprovação de alunos que usam a gramática como manda o figurino.
Portanto, as teorias da educação são tão precisas quanto o tarô ou a
leitura do futuro na borra de café. A tentativa de unificá-las é pior
ainda, porque esta unificação virá sempre pelas mãos de duas ou três
pessoas que acreditam fielmente no que defenderam em seu doutorado.
Levar seu doutorado muito a sério é signo de baixa formação intelectual.
Há alguns meses o “mundo da cultura” entrou em êxtase crítico quando o
atual governo resolveu extinguir o Ministério da Cultura. Pelo que
afirmavam, os artistas e similares, sem o Ministério da Cultura ninguém
mais teria uma ideia sequer que prestasse nem ninguém conseguiria mais
realizar nenhuma obra “cultural”.
Claro, nossa elite cultural foi criada às custas de editais do
Estado, sem eles, a criatividade da elite cultural vai a zero em 24
horas.
Na época, não dei muita atenção ao tema porque penso que o Ministério
da Educação (MEC) é que deveria ser extinto, muito mais nocivo ao país
do que o Ministério da Cultura –apesar de este servir para todo tipo de
manipulação ideológica para qualquer lado da mesa de pingue-pongue
político e de cultivar uma certa preguiça moral e estética nos agentes
culturais nacionais.
Proponho que fechem o MEC. Não por razões de contabilidade. Coitado, o
MEC deve gastar pouca grana. Mas por razões culturais e pedagógicas.
Acabar com o MEC nos livraria de todo tipo de burocrata que constrói sua
vida e seu orçamento atormentando quem, de fato, se ocupa com a
educação, essa arte inexata que deveria ajudar os seres humanos a serem
mais humanos e menos bobos.
Sem o MEC acabariam essas reformas intermináveis, esse “centralismo
democrático do blá-blá-blá” e esse mercado paralelo de “aferição de
qualidade” do tipo Anade, Enade, Inade, Onade, Unade e similares
–varia-se a vogal, permanece a aleatoriedade dos critérios. Quem decide é
quem estiver no comando burocrático da hora.
A educação deveria estar na mão dos municípios. Melhor ainda: das
próprias escolas. A regra é: quanto menos burocrata, melhor qualidade na
educação e na vida. Fechem o MEC. Invistam a grana em ferrovias.
Luiz Felipe Pondé, escritor,
filósofo e ensaísta, é doutor em Filosofia pela USP e professor do
Departamento de Teologia da PUC-SP e da Faculdade de Comunicação da
Faap.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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