| 06 Julho 2016
Artigos - MIDIA SEM MÁSCARA
Artigos - MIDIA SEM MÁSCARA
Após algum tempo vendo ao vivo um filósofo filosofar de verdade
(i.e. Olavo de Carvalho) e logo após ver o surgimento de outras grandes
mentes que descobriram o próprio potencial através dos ensinamentos do
professor, algumas diferenças intelectuais entre essas pessoas e as
demais foram se revelando conforme os via se desenvolver.
Porém, o símbolo que cristalizou essa percepção foi aquilo que o ensaísta Nassim Nicholas Taleb chamou em A lógica do cisne negro de “antibiblioteca” (grifos nossos):
O
escritor Umberto Eco pertence àquela classe restrita de acadêmicos que
são enciclopédicos, perceptivos e nada entediantes. Ele é dono de uma
vasta biblioteca pessoal (que contém cerca de 30 mil livros) e divide os
visitantes em duas categorias: os que reagem com: “Uau! Signore
professore dottore Eco, que biblioteca o senhor tem! Quantos desses
livros o senhor já leu?”, e os outros — uma minoria muito pequena — ,
que entendem que uma biblioteca particular não é um apêndice para elevar
o próprio ego, e sim uma ferramenta de pesquisa. Livros lidos são muito menos valiosos que os não lidos. A
biblioteca deve conter tanto das coisas que você não sabe quanto seus
recursos financeiros, taxas hipotecárias e o atualmente restrito mercado
de imóveis lhe permitam colocar nela. Você acumulará mais conhecimento e
mais livros à medida que for envelhecendo, e o número crescente de
livros não lidos nas prateleiras olhará para você ameaçadoramente. Na
verdade, quanto mais você souber, maiores serão as pilhas de livros não
lidos. Vamos chamar essa coleção de livros não lidos de antibiblioteca.
Após
algum tempo ficou mais claro que a grande diferença entre um verdadeiro
intelectual e um sujeito mediano que entendeu parte considerável
daquilo que estudou (na melhor das hipóteses o suficiente para conseguir
um emprego bom e ser um ‘bom cidadão’) é que o primeiro tem muito mais
consciência do campo de coisas que ele sabe que não sabe.
Para
entendermos o que isso quer dizer recorramos a Sócrates, o filósofo,
quando falava justamente de um sujeito ao qual conversou (grifos
nossos):
Examinando,
pois, a fundo este homem — não preciso de citar o seu nome; era um dos
nossos homens de Estado — , observando-o bem ao longo de uma conversa,
Atenienses, fiquei com a seguinte impressão: pareceu-me que este homem
passava por sábio aos olhos da maioria das pessoas e sobretudo aos seus
próprios olhos, mas na realidade o não era. Tentei, por isso,
demonstrar-lhe que se enganava, ao julgar que era sábio. Isto me fez
incorrer na sua inimizade, bem como na da maioria dos que assistiram à
nossa conversa. Ao retirar-me, ia fazendo comigo esta reflexão: “Sou,
sem dúvida, mais sábio que este homem. É muito possível que qualquer um
de nós nada saiba de belo nem de bom; mas ele julga que sabe alguma
coisa, embora não saiba, ao passo que eu nem sei nem julgo saber. Parece-me, pois, que eu sou algo mais sábio do que ele, na precisa medida em que não julgo saber aquilo que ignoro” [Apologia de Sócrates, 21cd]
Pois
bem! Sócrates acabou de dizer que a maior diferença entre ele e o outro
sujeito não era tanto o nível de conhecimento de ambos, mas sim o tanto
que cada um sabia o quanto não sabia. Há uma diferença entre dizer que
se sabe algo e a capacidade de julgar tanto o tamanho da sua sabedoria
quanto o tamanho da sua ignorância. (O princípio da honestidade
intelectual também está patente na parte grifada.)
Por fim, segue um diagrama que ilustra o que foi aqui dito. Começamos com o “homem-massa” do espanhol José Ortega y Gasset (v. A Rebelião das massas) ou o “cretino fundamental” do nosso Nelson Rodrigues. Como podemos ver, o homem-massa se acha um “señorito satisfecho”
e, como tal, se passa por sábio aos próprios olhos. Já um gênio como
Sócrates está muito mais ciente do desconhecido que o cerca, se
comparado a um dos “homens de Estado” ao qual ele confrontou seus
conhecimentos.
Obs.: Obviamente as proporções não estão perfeitas, mas ilustram com considerável fidelidade o que se tentou ilustrar no texto.
(Imagem: Jesus entre os doutores, Albrecht Dürer, 1506)
Leonildo Trombela Júnior é jornalista e tradutor.
https://medium.com/@ltjunior
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