POLITICA NORUEGUESA
Reportagem de Gabrie3l Arruda de Castro para a Gazeta do Povo:
A
baixa relevância da ciência brasileira, quando comparada à de outros
países, é um fato que pode ser observado por diferentes tipos de
análises. Mas também é possível, em tese, que a elite dos nossos
cientistas se destaquem e, assim, ajudem a salvar a reputação do atual
modelo de ensino superior. Em tese. Na prática, mesmo os artigos
brasileiros mais citados não têm o desempenho esperado quando colocados
no contexto global. E as ciências humanas são a área com pior
desempenho. Essa é a conclusão de um novo estudo ao qual a Gazeta do
Povo teve acesso.
O
professor Marcelo Hermes-Lima, do Instituto de Biologia da Universidade
de Brasília (UnB), analisou os papers brasileiros mais citados nos
últimos anos. Ele escolheu os 10% do topo da lista, e traçou uma
comparação com outros países. A conclusão é de que, no cômputo geral,
esses 10% equivalem a 8,6% dos artigos da elite global, de acordo com os
dados mais recentes. O esperado seria que a elite brasileira tivesse
pelo menos 10% dos 10% mais citados no campo internacional – ou seja,
que a nossa elite tivesse um desempenho equiparado ao da "elite
mundial".
O resultado também mostra uma grande diferenciação entre as diferentes áreas de pesquisa.
Um
dos destaques é a Química, área em que 14,7% dos artigos de elite
publicados por brasileiros em 2018 estão entre os 10% mais citados no
mundo - uma evolução considerável desde 20 anos antes, quando o índice
estava próximo de 5%. Ao mesmo tempo, a média geral do desempenho dos
artigos brasileiros na área da Química tem caído. Isso aponta para um
distanciamento entre os pesquisadores de ponta e os demais.
“Enquanto
o impacto médio da nossa produção cai de 2005 para cá, há um aumento de
estudos muito influentes dentro do total de artigos publicados – ou
seja, ocorre uma elitização (do ponto de vista intelectual) na área de
Química. Isso mostra que a elite de nossa ciência química se distancia
cada vez mais do pesquisador médio na área”, explica o relatório.
Mau desempenho nas humanas
Nas
ciências humanas, todas as seis disciplinas estão abaixo do esperado -
ou seja, os 10% de artigos brasileiros mais citados ficam abaixo dos 10%
mais citados globalmente.
Apenas
em Administração o índice se aproximou da média (9,8%). Em seguida,
aparece a Economia (7%). Em situação ainda pior, estão a Psicologia
(4,1%), as Ciências Sociais (2,1%) e as Artes e Humanidades, com o pior
índice (0,8%). De acordo com o professor Marcelo Hermes-Lima, o mau
desempenho não pode ser atribuído apenas à falta de financiamento
adequado. “Esse resultado das humanas é o mais catastrófico, porque o
desempenho foi caindo justamente na era de maior influxo de dinheiro. E
nós estamos falando da elite das humanas”, reforça.
Outras
áreas com baixo desempenho de acordo com a classificação feita pelo
pesquisador são a Matemática (3,7%) e a Veterinária (1,7%). Como
destaques, acima do limiar de 10%, aparecem as áreas de Energia (15,5%),
Engenharia Química (15,1%), Química (14,7%), Meio Ambiente (14,1%),
Física (14%) e Imunologia (12,6%).
Bio-Agro 7,4
Bioquímica 13
Farmacologia 12
Imunologia 12,6
Neuro 14
Medicina 9,1
Odontologia 7,3
Enfermagem 6,4
Veterinária 1,7
Saúde-outros 5,3
Física 14
Matemática 3,7
Meio Ambiente 14,1
Química 14,7
Geologia 10,3
Engenharias 9,0
Computação 5,3
Materiais 10,6
Engenharia Quím. 15,1
Energia 15,5
Ciências Sociais 2,1
Artes e Human. 0,8
Psicologia 4,1
Administração 9,8
Economia 7,0
Paquistão: exemplo positivo
Um
exemplo positivo citado no estudo é o do Paquistão, um país cujo
Produto Interno Bruto (PIB) per capita é apenas um quinto do brasileiro.
Nas últimas duas décadas, o país deu um salto expressivo na qualidade
da sua produção científica, e superou o desempenho dos brasileiros mesmo
nas áreas em que o Brasil se destaca, como a Física.
No
valor agregado, levando em conta todas as áreas de pesquisa, a
diferença é ainda mais evidente: tendo em conta sempre o critério dos
10% de artigos mais citados de cada país, o Paquistão saltou de
aproximadamente 4% no índice global em 2000 para mais de 14,4% em 2018
(embora os dados de 2019 estejam disponíveis, eles são menos confiáveis
por serem muito recentes). No mesmo período, o Brasil patinou por volta
dos 8%, com uma ligeira evolução nos últimos anos (de 2005 para 2019, o
índice passou de 7,4% para 8,6%).
Para
efeitos de comparação, países com similaridades culturais e econômicas
apresentaram índices superiores ao do Brasil no índice que leva em conta
todos os campos da ciência: é o caso do Chile (13,1%) e de Portugal
(14,5%).
Por
fim, o estudo também analisou a "super-elite" da pesquisa, que abrange
os 1% de artigos mais citados. Também por esse critério, o Brasil fica
abaixo do esperado. O 1% de artigos mais citados corresponde a 0,8% da
super-elite global, quando o natural seria que eles representassem pelo
menos 1% desse número. Entretanto, apesar de estarmos atrás de Paquistão
(1,7%), Portugal (1,7%) e Chile (1,6%) neste critério, o ponto positivo
é que a participação da super-elite brasileira tem aumentado. O
percentual passou de 0,4% para 0,8% entre 1996 e 2018. Esses números,
entretanto, são menos representativos porque, devido ao número reduzido
de artigos nesta categoria, a oscilação nos índices tende a ser maior.
O
relatório do professor Hermes-Lima sugere que o Brasil precisa dar
atenção especial a quatro áreas cuja relevância está em queda, quando
levado em conta o desempenho da elite dos pesquisadores: as Artes e
Humanidades, a Matemática, a Bioquímica e a Odontologia. “A elite da
comunidade acadêmica é o motor da inovação científica. Se ela está
ineficiente e com baixo impacto, há grande chance de afetar o
pesquisador médio”, diz ele.
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