Marcus André Melo
Folha
Sérgio Moro e Filippo Mancuso têm duas coisas em comum: ocuparam a pasta da Justiça sob Bolsonaro e Berlusconi. E perderam os cargos em meio às disputas da Lava Jato e de sua congênere italiana, a Operação (Mãos Limpas (Mani Pulite, 1992-1993).
Mas há também diferenças marcantes entre os dois. Moro foi demitido por Bolsonaro; Mancuso foi destituído do cargo por meio de uma moção de censura no parlamento.
RACHADINHAS – Moro perdeu o cargo por não se curvar a Bolsonaro em sua estratégia de proteger o clã familiar das investigações sobre rachadinhas. Mancuso foi punido por proteger Berlusconi e interferir nas investigações da Mani Pulite e contra a máfia. No parlamento se uniram a esquerda e a Lega Nord.
Sim, a comparação entre o Brasil e a Itália sugere importantes paralelos, mas leva também a erros interpretativos. O sinal político está trocado. As operações anticorrupção levaram à debacle eleitoral dos principais partidos.
Na Itália, aconteceu com a Democracia Cristã (DC), de centro-direita, e o Partido Socialista (PSI), de centro-esquerda, da coalizão que estava no poder, e à qual pertenciam 84% dos políticos indiciados. A DC minguou e mudou de nome; o PSI, não elegeu ninguém. Ambos os partidos desapareceram, o que não ocorreu no Brasil.
VENDETA FAMILIAR – Mancuso foi o braço judicial utilizado por Berlusconi na vendeta familiar contra magistrados que, segundo ele, perseguiam os políticos de direita. Como no caso do clã Bolsonaro, as denúncias contra a “famiglia” Berlusconi não mantinham relação direta com a Operação Mani Pulite. Seu irmão foi preso por propina paga pela Fininvest, a holding familiar.
Estas operações deflagraram reformas eleitorais históricas: a Itália abandonou o sistema de representação proporcional vigente de 1948 a 1992; o Brasil proibiu o financiamento empresarial de campanhas.
Berlusconi perdeu a primeira batalha, mas ganhou outras. Chicanas fizeram com que outra ação contra a Fininvest tivesse que ser retomada do zero, levando-a à prescrição. A reação do establishment na Itália parece ter prevalecido, como está acontecendo no Brasil.
CORRUPÇÃO REDUZIDA – Em estudo rigoroso sobre o impacto da Mani Pulite, Asquer, Golden e Hamel comparam a participação de políticos envolvidos em corrupção nas eleições antes e depois da Mani Pulite. Concluem que ela se reduziu consideravelmente.
Os eleitores passaram a demandar políticos limpos, punindo os envolvidos em corrupção. Possivelmente “uma reação contra a reação” conservadora contra a Mani Pulite. Mas o mais importante segundo o estudo é que a oferta de políticos sujos diminuiu.
Ainda é cedo para analisar o impacto da Lava Jato. A lição a tirar do estudo é que o teste será em 2022.
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