
Miro volta ao PDT para coordenar a campanha de Ciro Gomes
Caio Sartori
Estadão
Político cuja trajetória se confunde com a da Nova República surgida com o fim da ditadura em 1985, o ex-deputado Miro Teixeira está de volta ao PDT após passagens curtas pelos nanicos Rede e Pros. Convidado pelo presidente nacional pedetista, Carlos Lupi, para coordenar a campanha de Ciro Gomes à Presidência em 2022, o carioca de 75 anos topou o desafio. Ressalta, porém, que é sempre o candidato quem assume, na prática, a coordenação da empreitada eleitoral.
Para vencer o presidente Jair Bolsonaro, o ex-deputado federal por 11 mandatos e ex-ministro das Comunicações no primeiro governo Lula prega que a campanha retome símbolos nacionais que considera “sequestrados” pelo bolsonarismo. Também propõe que tenha como mote “o dever da esperança”, expressão retirada do título de um livro lançado recentemente por Ciro.
Por que essa volta ao PDT e qual é o projeto que será tocado?
Tudo atrasou um pouco por causa da pandemia. Todos os
grupos de que participo têm sido sobre isso, e as discussões foram sendo
travadas. Um dia, o Lupi participou de um desses grupos e começou a
dizer que minhas ideias eram muito parecidas com as que o Ciro vinha
travando, e falou para eu voltar ao PDT. Alguns deputados e o próprio
Ciro começaram a me escrever, mas foi o Lupi quem comandou o processo.
Eles usaram, tanto o Lupi quanto o Ciro, a história de coordenar a
campanha.
E vai coordenar?
Olha, eu vi todas as campanhas presidenciais desde o fim
da ditadura. Quem coordena a campanha à Presidência da República é o
candidato, não outra pessoa. Se outra pessoa ficar imaginando que vai
coordenar, vai virar um problema.
Então o que acaba sendo na prática?
A função é coordenar programa de governo. O Ciro tem isso
aqui, ó (mostra um exemplar do livro “Projeto Nacional: O Dever da
Esperança”, de autoria do presidenciável). Acho que “dever da esperança”
tem que ser o mote da campanha, em cima de outra discussão que tenho
travado: temos de gostar do Brasil. O Bolsonaro está dizendo que ele é
quem gosta do Brasil, usa o verde e o amarelo. Nós é que gostamos do
Brasil.
O senhor então acha que houve um sequestro de símbolos nacionais por parte do presidente Bolsonaro?
Acho que sim. Eu frequento o Maracanã e, em jogo da
seleção, escuto “Sou brasileiro com muito orgulho, com muito amor”.
Vamos cantar isso aí. O Exército não é do Bolsonaro, é da Pátria. “A
Polícia Militar atende ao que o Bolsonaro mandar”. Não, atende ao que a
lei manda. Temos que acabar com essas coisas, estão nos dividindo. Estão
acabando com a possibilidade de se ter discussões racionais.
Qual será o Ciro de 2022? Mais à esquerda ou o Ciro “terceira via”?
Não acho que vá haver unidade dos partidos. Essa conversa
de “No segundo turno todo mundo se junta”… Vamos parar com essa
conversa. Isso aí é para quem não é do ramo. É no primeiro turno que se
elegem deputados e senadores. Os partidos se juntam ou não se juntam por
causa dos fundos partidário e eleitoral. Isso gerou no Brasil empresas
partidárias, não partidos políticos. Então acredito que, tirando um ou
outro, não vai haver grandes alianças. Vamos correr o Brasil, falar com
as pessoas. E vamos de verde e amarelo.
Mas para que lado Ciro deve ir mais?
Não estou falando do Ciro, e sim do meu pensamento. O Ciro
tem as ideias dele publicadas. Acho que essa divisão esquerda-direita
atualmente é muito criada por uma extrema-direita que se organizou no
mundo todo para separar as pessoas, dividi-las, e criar uma
radicalização que afasta a racionalidade. O cidadão está desesperado
pensando em emprego, em comida. Essa questão toda (de ódio) foi criada
por grupos que não são de uma direita democrática.
Nessa linha, o senhor acha que Bolsonaro configura uma ameaça à democracia?
Ameaça à democracia acho que não existe. A democracia está
garantida aqui (mostra um exemplar da Constituição). Essa história de
dizer que a democracia é o que as Forças Armadas querem… Não. Elas estão
submetidas à Constituição. Pode ser que passe pela cabeça do Bolsonaro
(ameaçar a democracia), mas não podemos normalizar isso como realidade.
Acho que alimentar a exceção é um erro brutal. A democracia veio para
ficar, e isso é uma virtude da Constituição.
Mas vê movimentos nesse sentido por parte do presidente Bolsonaro?
Acho que o Bolsonaro cria factoides. A oposição não cria
problemas para o Bolsonaro, então ele cria problemas para ficar
debatendo com ele mesmo. Cria o problema, tem a repercussão na mídia,
ele responde a mídia, depois volta atrás. É deliberado. Não vamos achar
que estamos diante de um idiota. Não estamos diante de um idiota. É uma
pessoa preparada para viver na adversidade física.
Como o senhor analisa eleitoralmente o presidente para 2022?
Ele é, muito provavelmente, o único garantido no segundo
turno. Tem público. Não se vai derrotar o Bolsonaro odiando o Bolsonaro.
É analisando, mostrando isso às pessoas, não caindo nesses factoides
que ele cria. O que precisa ser cobrado do Bolsonaro é governo. É
preciso racionalizar esse desgoverno. O que está sendo feito para gerar
emprego? E para desatar os nós do desenvolvimento brasileiro? Por que,
com nossa capacidade industrial, estamos registrando perdas enormes?
Quanto à composição política, como o senhor avalia essa aproximação dele com o Centrão?
O Centrão serviria para votar o impeachment do Bolsonaro,
não é? Então você vai censurar o Bolsonaro por ter levado o Centrão para
apoiá-lo? O Centrão é algo que precisa ser mais bem explicado. Existia
um centro, ali na Constituinte, que todo mundo procurava de alguma forma
convencer – porque, se convencesse, ganharia. Teve um dia que o Roberto
Cardoso Alves chegou ao microfone e deu um grito: “É dando que se
recebe, o presidente da República precisa entender isso.” Aquilo gerou
uma perplexidade. Ali começa a surgir essa organização que virou o
Centrão como se conhece hoje. Censurar o Bolsonaro por causa do Centrão,
que estaria sendo aplaudido se aprovasse um impeachment, é hipocrisia.
Do ponto de vista dos crimes de responsabilidade, acha que Rodrigo Maia devia ter aberto um processo de impeachment?
Eu fui contra no início (cita um debate do qual participou em
2020, antes dos acontecimentos mais recentes). Hoje, você pode encontrar
razões para requerer o impeachment do presidente, em função da
pandemia. Aquela ordem, por exemplo, que deu a aliados para invadirem
hospitais. Estava violentando a Constituição, expondo a vida das
pessoas, violando o Código Penal. Mas acho que o objetivo não pode ser
buscar o impeachment do Bolsonaro nem de qualquer um. O impeachment, ou
existe na sua face ou não existe. No momento, as pessoas não estão
clamando pelo impeachment.
Então para o senhor o foco é derrotá-lo nas urnas?
Sim. Analisando o desgoverno dele. O fundamental é mostrar
que ele não está governando, que não tem governo. É perder o ódio e
analisar. Eu não assinaria o impeachment do Bolsonaro.
Mas, na prática, como derrotá-lo? Como o senhor defende que o Ciro chegue para 2022?
Com as propostas que ele tem. Mostrando como o Brasil é rico, tem potencial.
E quem buscar para formar uma aliança?
Isso vai surgir no curso do processo. Eu acredito que ele
conseguirá um apoio da população para que candidaturas sejam retiradas
ainda no primeiro turno. Essa história de combinar segundo turno é para
quem não conhece o processo eleitoral. Creio que o Ciro vai empolgar no
primeiro turno.
Acha que alguma das forças que já estão colocadas poderiam se unir a ele?
Acho difícil. O PT, por exemplo, não renuncia a uma candidatura própria.
O episódio envolvendo o
segundo turno de 2018, quando Ciro foi para Paris, não atrapalha ele no
eleitorado de esquerda e com o PT?
Acho que não. Eu nem me lembrava disso até você falar. No
segundo turno, as pessoas dizem que vão apoiar uma pessoa ou outra, mas o
eleitorado não fica esperando quem o seu candidato vai apoiar. Já se
decide logo para onde vai quando acaba o primeiro turno.
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