A eleição não é tão boa assim para Bolsonaro. O problema é que Lula e o PT contam com uma base parecida de eleitores incondicionais, que votarão nele independentemente do que ele diga ou faça. Luciano Trigo para a Gazeta do Povo:
Sempre
hesito diante do impulso de escrever sobre pesquisas eleitorais, porque
invariavelmente uma parcela dos leitores reage sem ler, com argumentos
do tipo “Mas você acredita em pesquisas?” – ou, pior ainda, chamando o
articulista de petista (ou de bolsominion, conforme o caso). Mas não
resisto a comentar a nova pesquisa * do Paraná Pesquisas, divulgada
ontem, porque de certa forma (e infelizmente) ela confirma o que escrevi
no final de 2020, no artigo “O risco de um segundo turno sangrento em
2022 é real”.
Naquele
momento Lula ainda estava legalmente impedido de ser candidato, mas
como no Brasil a interpretação das leis muda ao sabor do vento, já havia
um sentimento de que o STF ia mudar as regras do jogo mais uma vez,
desdizendo o que já tinha dito em relação à competência para julgar os
crimes expostos pela Operação Lava-Jato – como, aliás, o Supremo já
fizera em relação à prisão em segunda instância. Insegurança jurídica, a
gente se vê por aqui.
Mesmo
sem Lula no páreo, eu advertia, a polarização do país apontava para uma
reedição da eleição de 2018, com Bolsonaro enfrentando o candidato do
PT em um segundo turno violento. Com Lula elegível, a situação piorou.
Basicamente porque os eleitorados dos dois candidatos têm uma coisa em
comum: ambos estão tão convencidos da vitória que não aceitarão a
derrota.
A
hipótese da volta de Lula ao poder é tão insuportável para a direita
quanto a hipótese da reeleição de Bolsonaro é insuportável para a
esquerda. Isso sinaliza que em 2022 a atmosfera ficará irrespirável, nas
ruas e nas redes sociais. Nada de bom pode vir daí. Mas vamos aos
números da pesquisa.
(Antes,
uma observação: pelo histórico apresentado nos últimos anos, o Paraná
Pesquisas me parece o mais competente e confiável em pesquisas
eleitorais, e digo isso com base em um critério muito simples: é o
instituto que mais acerta. Um segundo critério é o bom senso: por
exemplo, uma pesquisa recente que deu uma vantagem absurda para Lula no
segundo turno, aliás citada no último artigo de Alexandre Borges,
“Apoiar candidato que perde para Lula é ajudar Lula. Lide com isso”, não
convenceu quase ninguém porque discrepava absurdamente das tendências
apontadas por todas as demais pesquisas feitas desde a eleição de
Bolsonaro. Além disso, o timing da divulgação dessa pesquisa,
praticamente simultânea à decisão de Facchin que tornou Lula elegível,
me pareceu, digamos, suspeito - e com algo de teatral.)
Primeiro turno:
Em
todos os cenários da pesquisa do Paraná Pesquisas, Bolsonaro aparece à
frente de Lula no primeiro turno, e em nenhum cenário aparece um
terceiro nome com reais condições de ameaçar um dos dois. Conclusões
possíveis:
1.Neste momento, a não ser que aconteça algo de muito inesperado, um segundo turno entre Bolsonaro é Lula parece quase inevitável; não haverá terceira via;2.O chamado “centro” vem se mostrando incompetente para criar uma narrativa atraente para o eleitor – e mais incompetente ainda para buscar a união em torno de um nome eleitoralmente viável;3.Levará vantagem no segundo turno o candidato mais hábil em atrair os votos dos demais candidatos.
A
pesquisa é boa para Bolsonaro? Evidente, por ser uma demonstração de
força e resiliência do presidente. Depois de mais de um ano de pandemia e
de consequente crise econômica, sem falar nos ataques diários e na
sabotagem explícita da grande mídia, Bolsonaro conserva a lealdade de
mais de um terço do eleitorado. São os eleitores incondicionais, que
proporcionam um base confortável para o presidente no primeiro turno e a
garantia de uma vaga no segundo.
Mas
não é tão boa assim. O problema é que Lula e o PT contam com uma base
parecida de eleitores incondicionais, que votarão nele independentemente
do que ele diga ou faça. E a diferença apontada pela pesquisa é muito
pequena. Nenhum dos dois candidatos está em condições de cantar vitória -
e subestimar o potencial do adversário pode vir a ser um erro fatal
para os dois lados.
Segundo turno:
Os
números do segundo turno são resultado de dois fatores combinados,
ambos difíceis de estimar: a redistribuição dos votos dos candidatos
derrotados no primeiro turno e o grau de rejeição dos dois candidatos. É
fácil visualizar eleitores que rejeitam Bolsonaro, mas que, para evitar
a volta do PT ao poder, votarão nele mesmo assim – bem como eleitores
que odeiam Lula, mas que, para evitar a reeleição de Bolsonaro, votarão
nele mesmo assim.
Outro
fator a considerar aqui: a pesquisa do Paraná Pesquisas contabiliza
todas as respostas, incluindo os votos brancos e nulos. Descartadas
essas respostas, e só considerado os votos válidos, por uma regra de
três simples os números passam a ser:
Bolsonaro: 51,6%
Lula: 48,4%
Em outras palavras: empate técnico.
A eleição do fim do mundo
Nas
outras simulações de segundo turno, tanto Bolsonaro quanto Lula
derrotam com facilidade qualquer outro candidato. A situação do PSDB
parece particularmente desesperadora, já que Luciano Huck não se decide e
João Dória não decola – a ponto de terem lançado como balão de ensaio o
nome do desconhecido governador do Rio Grande do Sul, que aparece com
menos de 1% das intenções de voto.
Outra tabela interessante da pesquisa é a que mostra o potencial eleitoral comparativo dos candidatos:
Como
se vê, Bolsonaro e Lula apresentam índices altíssimos de rejeição, o
que significa que o presidente eleito terá que lidar com o ódio ou
antipatia de metade do eleitorado – o que tornará muito difícil a tarefa
de governar o país.
Ciro
e Dória apresentam uma boa margem de crescimento (eleitores que admitem
votar neles, ainda que não sejam seu candidato preferencial). Aqui a
notícia não é boa para Bolsonaro, já que os votos de Ciro tendem a
migrar integralmente para Lula, mas os votos de Dória não devem migrar
na mesma proporção para Bolsonaro. Isso porque o PSDB, já desde a
eleição passada, prefere bater em Bolsonaro a bater no PT (e não
faltarão explicações para isso).
A
situação de tensão e de conflito permanente vai continuar. A
intolerância a quem pensa de forma diferente, deliberadamente cultivada
no Brasil como estratégia política já há 20 anos, vai persistir, ou
mesmo aumentar. Não duvido que haja violência nas ruas. Para quem sonha
com um país normal, no qual parentes e amigos não rompem relações por
causa de política, a melhor saída pode ser o aeroporto.
* Pesquisa Nacional – Situação Eleitoral para o Executivo Federal em 2022 e Avaliação da Administração Federal/ Maio 2021
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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