MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

quarta-feira, 30 de abril de 2014

O senso de urgência como oposição ao direitismo depressivo

   


urgency
Em 2004, Sam Harris lançou A Morte da Fé, dando o pontapé inicial no movimento neo-ateísta. Em 2006, Richard Dawkins lançou Deus, um Delírio, que se tornou um best seller mundial. Mas justiça seja feita: todo o framework já estava presente no livro de Harris.
O neo-ateísmo se tornou mais que a expressão de um grupo político (que, infelizmente, já começou apelando), mas simplesmente uma das mais completas aplicações de todos os frameworks presentes na guerra política, incluindo um extensivo uso de técnicas de propaganda, rotulagem e controle de frame.  Para além disso, quem leu as obras de David Horowitz, Saul Alinsky, Antonio Gramsci e George Lakoff pôde sacar logo de cara. Desde Sam Harris, eles utilizaram todas as técnicas possíveis de guerra política.
Como sou adepto da reconstrução (mais do que da desconstrução), entendo que o neo-ateísmo deve ser refeito e reaplicado sempre que necessário de acordo com os alvos necessários. Basta que um grupo oponente possua um conjunto de crenças contestáveis e que gerem consequências que podemos praticamente reaplicar o neo-ateísmo. A reconstrução do neo-ateísmo para a demolição do esquerdismo é o que chamo de neo-iluminismo. A religião política (esquerdismo) está para mim assim como a religião revelada está para Richard Dawkins.
O que me importa aqui, pelo momento, não é detalhar o neo-iluminismo, mas uma das lições fundamentais que os neo-ateus tinham a nos ensinar: a diferença entre o senso de urgência e o ativismo depressivo, assim como a preferência pelo primeiro.
No caso do direitismo depressivo, que devemos rejeitar como se fosse doença venérea, o discurso assume o formato da aplicação de técnica de propaganda chamada inevitabilidade. Com essa técnica, o adversário é sempre definido como um vencedor inexorável em todas as contendas possíveis. Essa proposta parte de uma visão basicamente depressiva de si próprio e de suas capacidades, assim como a uma superestimação indevida das capacidades do adversário.
Esse tipo de propaganda feita para o adversário deve ser substituída pelo senso de urgência, pelo qual demonstra-se ao público a urgência de aderirmos à opção sendo vendida. Aliás, segundo o papa da gestão de mudança, John Kotter, a criação de um senso de urgência é o primeiro passo fundamental para a implementação de qualquer mudança corporativa. Sem isso, as pessoas não “compram” a idéia.
A aplicação deste fundamento por Sam Harris começava com o seguinte raciocínio já nas primeiras páginas de A Morte da Fé:
  1. Hoje em dia, o ser humano possui poder de matança cada vez maior (armas químicas, bombas nucleares, etc.)
  2. Ao mesmo tempo, existem vários países onde temos teocracias (em que seus líderes tomam decisões irracionais, como, por exemplo, “invadir um país somente por que Deus disse”)
  3. A religião, portanto, pode causar o fim de nossa espécie se um desses teocratas decidir apertar o botão decisivo
  4. Desse jeito, a luta contra a religião não é apenas uma divergência metafísica, mas a luta pela sobrevivência de nossa espécie
Claro que há um erro grave no passo-a-passo acima. Não há indício algum de que guerras são causadas por crenças em Deus. Na verdade, participações em guerras são decisões econômicas tomadas estrategicamente. Pode até ser que algum líder político diga que faz uma ação “motivado por Deus”. Mas qualquer pessoa adulta acredita? Não seria uma tentativa de usar rótulos positivos (“decisão tomada por Deus”) para validar decisões tomadas por questões de auto-interesse? Enfim, a argumentação neo-ateísta é fraudulenta até dizer chega.
Não quero entrar nesse mérito aqui, pois defendo que ao reconstruirmos o neo-ateísmo para atacar a religião política devemos eliminar as fraudes intelectuais  propagadas por eles. Usemos apenas os recursos de guerra política (rotulagem, propaganda, assertividade, senso de urgência, controle de frame e as técnicas defendidas por Horowitz e Alinsky, dentre outros).
O importante é notar o quanto o recurso usado por Harris deu resultado. Ao invés de desanimar sua tropa, os animou para a luta. Isso por que ele os convenceu de que a luta era não só urgente como absolutamente necessária. Seus leitores saíam motivados não apenas para derrubar adversários políticos, como principalmente para salvar a espécie humana de sua extinção.
Sempre que chegamos em público e dizemos “que tudo está perdido” ajudamos a construir fracassos. Basicamente, motivamos nossos adversários e desmotivamos nosso exército. Ao usarmos o senso de urgência, definimos a necessidade de lutarmos até que os resultados venham. Os resultados precisam vir por que são urgentes, cabendo a nós conquistarmos esse resultado.
O que proponho aqui é aprendermos com os neo-ateus. O discurso do direitismo depressivo não tem serventia alguma, a não ser para nossos adversários. Tudo isso independente das racionalizações a serem usadas (como exemplo: “mas isso é apenas ser realista”). Na verdade, essas racionalizações sempre garantem vitória ao adversário. Por exemplo: será que se não tivéssemos tantas pessoas dizendo “nosso adversário sempre vai vencer” ele venceria com tanta facilidade suas batalhas? Claro que não.
Em 1994/5 o Palmeiras/Parmalat não parava de ganhar títulos. Na época me diziam: “Não adianta, vai chegar o dia em que só o Palmeiras vai ter títulos. Daqui a 10 anos, quando todos os títulos nacionais forem para ele, vocês verão. Melhor abandonar tudo.”. Resultado? O time caiu duas vezes para segunda divisão em dez anos. Claro que era difícil vencer o Palmeiras, mas o endeusamento de um adversário que venceu várias batalhas não era o melhor caminho. Na verdade, era o pior possível. Por sorte os torcedores dos outros times não caíram no discurso depressivo. Com certeza, o futebol ficou mais interessante com mais times disputados.
Se nosso adversário tem vencido muitas batalhas, é preciso apontar o senso de urgência em começarmos a vencer as nossas. Mas e a necessidade do realismo? Está no momento em que demonstramos ao público (e principalmente àqueles ao nosso lado) as consequências de não vencermos nossas batalhas.

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