Nosso John Locke com creme hidratante acha muito indelicado da parte do
povo manifestar sua insatisfação contra quem sempre usou o país para
satisfazer seus próprios interesses. Carlos de Freitas, via Senso Incomum:
É longa a lista de livros que aborda o papel do intelectual no mundo
moderno. Todos parecem concordar que um intelectual é uma das
importantes peças para a manutenção da ordem pública, depois dos
banheiros químicos e das enchentes.
Parece que, no Brasil, boa parte do que se convencionou chamar de
intelectual, em maior ou menor grau, é apenas alguém com uma aceitável
habilidade motora para expor suas idéias. Por aqui, mais que os
pensamentos, são os gestos que definem quem é ou não um pensador.
Quando um Karnal elabora todo um gestual, influenciado pelo melhor do
teatro japonês, técnicas avançadas de Tai Chi Chuan e de kung fu, para
dizer que o mar é azul, mas pode ser verde também, percebemos que idéias
e proteínas são bem menos importantes que suspensórios e creme para
acne.
Quem não fica embevecido quando um Clóvis de Barros, como se
estivesse contemplando a estrondosa face de Deus, após falas
intranquilas, chega à conclusão mara-maravilhana de que “a vida é (pausa
tcheckoviana) dor e sofrimento, se você preferir”? Dá uma vontade na
gente de se desapegar dessa vida, ingerindo umas trezentas cápsulas de
cianureto, ou não?
Quem não se lembra do ataque de tecidos flácidos de Marilena Chauí,
musa inspiradora do poema A Xeroxona, de Bruno Tolentino, berrando até
babar que ODEIA a classe média? Um clássico da nossa intelectualidade.
Agora, Luiz Felipe Pondé, em escanteio mal batido na Gazeta do Povo,
não quer que você saia de casa no dia 15. Nosso Kant que come cupcake e
bebe champanhe diz que Bolsonaro faz o que Lula já fez: colocar o povo
contra as elites.
Pondé não vê diferença entre as elites em questão. Para nosso
Descartes com almofadinha pra hemorróida, Lula, comprando políticos,
indicando juízes e alimentando o bolso do jornalismo profissional, é
igual a Bolsonaro, que não aceita fazer conchavos com esses mesmos
políticos, juízes e profissionais do texto.
Críticas ao governo seriam bem-vindas. Mas, parece que nossa classe
pigarreante não tem muito o que dizer. Pondé alega método na estupidez
de Bolsonaro. A única coisa que não tem método mesmo é o texto do
acadêmico. Aliás, nesse trecho, vemos o português naufragar para que “o
método navegue de braçada”:
“O método Bolsonaro também navega de braçada nas consequências políticas da comunicação em redes sociais.”
Pondé acha que a falta de representatividade (furto-me a comentar o
neologismo empregado pelo nosso Espinosa de calça de couro) das vontades
do povo no congresso, no STF e na mídia é uma sensação apenas. Pura
subjetividade de quem come apenas uma vez a cada dois dias.
Acha também que é hora de bater de volta. Sabe-se lá em quê ou em
quem. No povo? Seria divertido nosso Leibniz tropical colocar o cachimbo
de lado e ir trocar uns socos com o Augusto Nunes, por exemplo. Mas
Pondé é só pose. Sua consciência trágica é a de quem vê o desamparo
existencial do ser quando quebra uma unha ou fica com um fiapo de
lagosta entre os dentes.
O melhor ficou para o final. Nosso Rousseau de dockside sem meia cita
a mais caricata das personagens do momento: Vera Magalhães. Eça de
Queiroz diz que “cada nação possui um tipo criado para o riso público”.
Estamos delineando finalmente nosso tipo digno do mais refinado
escárnio: o tipo midiático.
São os tipos irônicos por excelência. Observam o mundo lá do alto de
suas posições, tratando todo aquele que não comunga de sua visão
especial e única, como resto. Mas, como na bíblia, é o resto fiel que
permanece imune às vicissitudes da história.
O nossos ungidos guardiões da opinião pública desprezam qualquer
opinião popular. Gostam mesmo é de usar seus prestígios para fazer
negócios. A elite falante profissional depende de um povo idiotizado
para continuar nos auditórios das livrarias mostrando a meia dúzia de
esnobes abobados como suas inteligências são iluminadas.
Pondé é o pingentinho de couro no cadarço da sofística. Um mundo
organizado pela sua destreza cerebral seria o que? Um pondemônio?
Nos vemos no dia 15.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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