É muito ruim para a democracia que o Poder Legislativo seja tão odiado, adverte J. R. Guzzo em sua coluna no Estadão:
Tanto faz, de certa forma, quanta gente vai ou não vai para a rua, ou
quantas vezes está disposta a ir no futuro mais próximo. Além e acima
de tudo isso, há um fato que não muda: o Congresso Nacional e todo mundo
que está lá dentro formam hoje um dos grupos de seres humanos mais
odiados do Brasil. Se fizessem uma “pesquisa de opinião” perguntando ao
brasileiro qual o ambiente que ele respeita mais – a penitenciária da
Papuda ou a dupla Câmara-Senado – qual você acha, sinceramente, que
seria a opinião da maioria?
Melhor não fazer pesquisa nenhuma, não é mesmo? A Papuda, na verdade,
bem que poderia ser hoje a residência verdadeira de muitos dos nossos
parlamentares – levando-se em conta que até setembro de 2019 cerca de
100 deputados, pelo menos, respondiam a ações penais no STF.
É muito ruim para a democracia de qualquer país que o Poder
Legislativo seja tão detestado como o brasileiro. É muito pior, ainda,
que os culpados disso sejam os próprios deputados e senadores, pelos
atos que cometem e pela conduta que exibem ao público. Não é o
“fascismo” que está sabotando o Congresso, nem a direita – embora
existam, sim, grupos de extremistas que querem acabar com a história
toda mandando para lá um cabo e dois soldados. Mas essa turma jamais
seria capaz de derrubar um guarda noturno se tivesse como alvo pessoas
de bem.
É o caso? Não é – e não adianta fazer de conta que é. A maioria da
população, hoje, iria aplaudir se a Câmara e o Senado fossem fechados
por um ato de força, ou ficariam indiferentes. Uma democracia assim está
doente.
A verdade é que são eles mesmos que construíram, tijolo por tijolo, a
sua imagem infame junto à maioria da população. A mídia, os partidos,
as entidades que representam alguma coisa, os sociólogos, etc. se
levantam indignados em defesa do Congresso. Queriam o quê? Basta ver o
que fazem, no dia a dia da vida real, os deputados e senadores. Não é só
a questão criminal – estão sendo processados por peculato, concussão,
lavagem de dinheiro, corrupção passiva e ativa, falsificação de
documento. Conseguem, até mesmo, ser acusados em ações penais por
trabalho escravo. Talvez pior que isso seja a postura que, no entender
das pessoas, eles têm diante do interesse público – sempre que veem
alguma chance, ficam contra. Escondem-se atrás de crimes coletivos, no
plenário, para saquear o País.
Os congressistas brasileiros são, eles mesmos, uma dificuldade quase
insuperável para quem, honestamente, quer defender o Poder Legislativo.
Às vezes, até, nem merecem a imagem que têm. Ainda no ano passado, por
exemplo, aprovaram a reforma da Previdência Social, uma obra que poucos
parlamentos do mundo fizeram até hoje. Mas isso já está esquecido – o
que interessa é o que o povo acha deles agora. E agora, além do passivo
criminal, são vistos como inimigos de tudo o que o governo tenta fazer
para melhorar o País, e como bandidos que agem o tempo todo contra as
mudanças que o Brasil precisa.
Nada pode ser considerado normal quando o presidente da Câmara dos
Deputados faz 250 viagens em jatinhos da FAB durante o único ano de 2019
– mesmo porque uma das razões alegadas para isso é o fato de que ele
não pode andar em nenhum meio de transporte público, para não ser
triturado por vaias. Temos, aí, que o chefe da Casa do Povo não pode
chegar a um metro do povo.
É aceitável, uma coisa dessas? Apesar de toda a sua mediocridade, que
sempre funciona como um manto protetor para qualquer político, os
presidentes da Câmara e do Senado estão hoje entre as pessoas mais
abominadas do País. Não dá para funcionar assim – com ou sem gente na
rua.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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