"Estamos quase no meio do segundo turno. As grandes escolhas foram
feitas. Não criei essa situação. Forças poderosas estiveram em choque. É
razoável que, prevendo o desfecho da batalha, comece a olhar para a
frente, tentando desvendar, a partir da experiência, uma fórmula de
lidar com o poder emergente". Fernando Gabeira, um tanto cheio de dedos,
via O Globo:
Manifestações dos leitores são um estímulo para avançar um pouco
nesse oceano de emoções eleitorais. Alguns acham que trato de temas
etéreos, que não interessam agora. Outros, que sou condescendente com
Bolsonaro.
Talvez as pessoas estranhem que me dedique a um cenário
pós-eleitoral, pois acho que o resultado do segundo turno é
relativamente previsível. Os que me acusam de condescendente não
percebem que estou tentando transferir uma experiência de relação com
Bolsonaro para oferecer, se não uma tática, elementos de uma tática para
o futuro próximo.
Minha experiência é de quem defendeu no Parlamento bandeiras que
Bolsonaro ataca. As frases preconceituosas que ele eventualmente dizia
são as mesmas que ouvimos nas ruas de todo o Brasil.
Minha relação com ele era de alguém que representava minorias, que
até hoje apoio, com alguém que, no meu entender, estava mais perto do
espírito majoritário das ruas.
Um ponto de convergência foi a luta contra a corrupção. Aliás, foi
essa luta, no meu tempo de político, que me permitiu disputar com alguma
chance eleições majoritárias.
Minha atitude não foi a de rotular de fascista, misógino, racista ou
homofóbico, mas compreender que, por baixo dessas reações populares,
existe uma insegurança sobre as mudanças culturais, e é preciso buscar
avanços que não provoquem um retrocesso maior. Discussões em baixo nível
no Congresso contribuem para abrir a Caixa de Pandora na sociedade.
Hoje, infelizmente, está aberta.
O primeiro ponto de contato para enfrentar a maioria, portanto, é
afirmar que movimentos minoritários e culturais não precisam ser
coniventes com a corrupção dos partidos de esquerda, ter vínculos com o
poder, nem depender financeiramente dele. Delicado também será enfrentar
a política ambiental de Bolsonaro, que pretende fundir os ministérios
da Agricultura e do Meio Ambiente.
Compreendo que existam interfaces entre agricultura e meio ambiente.
Mas os problemas ambientais são muito mais amplos: poluição urbana,
destinação do lixo, redução das emissões, e há ainda o mar com seus
corais, esperando uma ampla política de proteção.
Um ministro da Agricultura dificilmente seria capaz de cuidar de
todos esses temas. Bolsonaro afirma que uma de suas missões é acabar com
a indústria de multas do Ibama.
É um erro acenar com isso, embora possam existir multas excessivas ou
mal aplicadas. O ideal seria uma política de preparação dos próprios
agricultores para que pudessem produzir nas condições mais amigáveis ao
meio ambiente.
Isso não é um argumento apenas ecológico, no sentido de preservar a
produção a longo prazo. As regras internacionais são cada vez mais
exigentes: é também uma questão econômica.
Não pensem que não tenho consciência do enorme trabalho que teremos.
Desde o princípio, afirmei que a tática da esquerda estava errada. Além
de não reconhecer seus erros, atrelou o destino ao de um homem na
cadeia, supondo que estava repetindo a história de Mandela.
Ao atrelar o destino a Lula, o PT escolheu o caminho mais difícil. E a
esquerda saiu dividida. Ciro talvez fosse um pouco mais competitivo.
Ainda assim, a onda era muito forte.
Isso tudo é passado. Estamos quase no meio do segundo turno. As
grandes escolhas foram feitas. Não criei essa situação. Forças poderosas
estiveram em choque. É razoável que, prevendo o desfecho da batalha,
comece a olhar para a frente, tentando desvendar, a partir da
experiência, uma fórmula de lidar com o poder emergente.
Claro que, nos embates que nos esperam, outras posições vão surgir.
Creio ter aprendido alguma coisa com a eleição de Donald Trump. Ali
ficou claro que era preciso rever a tática, pois as críticas acusatórias
só o faziam crescer.
Muita gente se disse surpreendida com o que aconteceu nas eleições.
Algumas surpresas sempre acontecem. Mas quantos não quiseram ver, por
achar que as coisas estavam se desenrolando de uma forma que não lhes
agradava.
Bolsonaro era recebido por pequenas multidões nos aeroportos. Falava
de luta contra a corrupção e, embora alguns concordem, foi ele que
percorreu o Brasil defendendo-a. Bolsonaro falava de segurança pública, e
não houve um programa de segurança alternativa contra o seu. Vi seu
crescimento e notei como os ataques o fortaleciam.
Só me resta agora segurar a onda do jeito que aprendi. Não significa que esteja certo. Apenas uma voz.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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