Em artigo publicado pelo Instituto Liberal,
do qual é diretor, João Luiz Mauad explica um dos conceitos
fundamentais de Hayek, a "ordem espontânea" - com o mercado na linha de
frente:
Segundo Adam Smith,
os indivíduos não buscam conscientemente benefícios econômicos para a
sociedade. No entanto, conduzidos pela pressão da competição e pelos
incentivos dos ganhos pessoais, esses benefícios surgiriam
espontaneamente, através das interações efetuadas no mercado. Os
benefícios sociais seriam, portanto, derivados do funcionamento de uma
ordem espontânea, e não de um propósito consciente.
Na perspectiva de
Adam Smith, as limitações morais do homem em geral, e seu auto-interesse
em particular, não são lamentados nem tampouco vistos como algo que se
deva modificar. Pelo contrário, são tratados como fatos, vale dizer,
como características intrínsecas e próprias da vida. De acordo com esse
entendimento, o objetivo fundamental seria perseguir os melhores
resultados possíveis (morais e sociais) a partir das limitações
existentes, ao invés de dissipar energias tentando alterar a natureza
humana, um intento que Smith considerava tão vão quanto sem sentido.
Como ensinou Hayek, o
mercado não é a única forma de interação espontânea entre indivíduos
que cria ordenamentos altamente complexos e organizados. A grande
maioria dos idiomas e, mais recentemente o advento da internet, são
outros exemplos dessas interações. Este é um ponto muito importante,
pois tendemos a acreditar que todos os resultados positivos da atividade
humana são conseqüências de ações deliberadas e planejadas, o que não
é, absolutamente, verdadeiro.
Hayek sustentava que o
funcionamento da sociedade depende da ligação coordenada de milhões de
fatos e ações individuais, cujo conjunto ninguém seria capaz de
conhecer. Segundo ele, o conhecimento humano abrange toda a
multiplicidade da experiência do homem através dos tempos, algo
demasiado complexo para uma articulação explícita que se pudesse
apreender. Trata-se de uma “sabedoria sem reflexão, inculcada tão
profundamente que se converte praticamente em reflexos inconscientes”.
Segundo o austríaco, este conhecimento sistêmico, manifestado de forma
não articulada na cultura popular, teria mais probabilidade de acerto do
que as arrogantes visões de uns poucos intelectuais.
Por isso, na
concepção de Hayek a sociedade deve ser comparada a um organismo vivo,
que não pode ser reconstruído sem conseqüências fatais, como, aliás,
restou comprovado através das diversas experiências coletivistas
malsucedidas do Século XX.
Hayek não negava a
relativa superioridade dos chamados “especialistas” dentro de um
determinado setor do conhecimento humano. O que ele refutava, com certa
veemência até, é que tal superioridade, principalmente em virtude do seu
cunho limitado e restrito, pudesse estender-se por sobre outros tipos
de conhecimento amplamente fragmentados e difusos. É dentro dessa
perspectiva que a interação sistêmica de muitos deve ser sempre
considerada superior à sabedoria específica de poucos.
Ortega y Gasset foi
outro que resumiu de forma brilhante o perigo que representa a
arrogância do conhecimento especializado quando asseverou que o
especialista “não é um sábio, porque ignora formalmente o que não entra
na sua especialidade; mas tampouco é um ignorante, porque é “um homem de
ciência” e conhece muito bem a sua fração de universo. Devemos dizer
que é um sábio ignorante, coisa sobremodo grave, pois significa que
tenderá a se comportar em todas as questões que ignora não como um
ignorante, mas com toda a petulância de quem na sua questão especial é
um sábio.”
Entretanto, engana-se
quem acha que a ausência de planificação central no livre mercado seja
sinônimo de falta de planejamento. Na verdade, o mercado um sistema
extensiva e racionalmente planejado. Só que o planejamento capitalista
se dá de forma pulverizada, através da ação de cada indivíduo, família,
empresa ou organização. Quem quer que pense numa determinada ação
econômica que lhe pode ser benéfica, assim como nos aspectos
operacionais da sua consecução, estará realizando parte da
“planificação” de uma economia de mercado.
De acordo com o
professor George Reisman, “um gigantesco e extensivo planejamento
econômico privado não somente existe, mas é totalmente coordenado,
integrado e harmônico no capitalismo”. Todo esse planejamento dos
indivíduos, das famílias e das empresas é regulado por um mecanismo
sólido, autônomo e extremamente eficiente, denominado “sistema de
preços”.
É o “termômetro” dos
preços que leva os agentes do mercado a estarem continuamente se
re-planejando, em resposta às alterações da oferta e da demanda, de
forma que cada participante esteja sempre buscando maximizar seus lucros
ou, de modo inverso, minimizar suas perdas. Essa é a maneira pela qual
se assegura que cada processo produtivo seja gerenciado de modo tal que
acabe colaborando para maximizar a eficiência do sistema como um todo.
Por outro lado e por
sua própria natureza, o intervencionismo e a tentativa de planificação
central tiram dos indivíduos não só a possibilidade como o interesse
pelo planejamento, cuja realização fica restrita a meia dúzia de
burocratas, sob a absurda e virtualmente perturbada crença de que seus
cérebros “especialíssimos” poderiam alcançar a capacidade de um Deus
onisciente e onipresente. Como resultado, o planejamento racional e
pulverizado do mercado dá lugar à ineficiência econômica, ao desperdício
de recursos escassos, aos privilégios de toda sorte e à corrupção
sistêmica.
blog orlando tambosi
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