BLOG ORLANDO TAMBOSI
Quem se sente livre para comemorar a morte de um adversário também se sentirá livre para tentar matar as palavras dele fora do âmbito do debate. Mario Sabino para O Antagonista:
Fico
genuinamente horrorizado quando vejo alguém comemorando a morte de um
adversário ou a doença de um desafeto. Para mim, a reação é medida de
caráter e formação. Quem festeja a morte de Olavo de Carvalho, por mais
deletério que o guru de Jair Bolsonaro tenha sido, mostra a mesma
flacidez moral de quem comemorou o câncer de Lula ou de Dilma Rousseff.
Do lado da esquerda, houve também quem festejasse a facada em Jair
Bolsonaro, durante a campanha de 2018 — o que, para além de falta de
escrúpulos, denota obtusidade política, uma vez que o atentado ajudou
muito a que ele vencesse a eleição presidencial.
Nas
condições normais de temperatura e pressão (guerras são exceção, mas
ainda assim há códigos a serem observados), adversários têm de ser
derrotados no campo das ideias, não por meio da eliminação física — que
não se restringe à morte ou a doenças incapacitantes. A eliminação
física se dá também por meio do amordaçamento de vozes discordantes e da
censura judicial pura e simples.
Quem
se sente livre para comemorar a morte de um adversário também se
sentirá livre para tentar matar as palavras dele fora do âmbito do
debate. A cultura do cancelamento é também assassinato, desejo de
eliminação física. Em 1852, o escritor francês Gustave Flaubert, que
enfrentou um processo criminal por causa do romance Madame Bovary, que
causou escândalo na época, escreve numa carta: “A censura, qualquer seja
ela, parece-me uma monstruosidade, algo pior que o homicídio; o
atentado contra o pensamento é um crime de lesa-alma”.
Festejar a morte ou a censura de um oponente revela ausência de metro moral e o raquitismo das próprias ideias.
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