Alessandro Buonopane*
A
Inteligência Artificial (IA) se torna cada vez mais presente em nossas
vidas a cada dia que passa. Ela já impacta diversos setores da
sociedade, da saúde e dos meios de transporte, passando pela educação e
chegando aos esportes e entretenimento. Diante de tal crescimento
acelerado, parece necessário também ampliar e construir um arcabouço de
medidas que possam regular essa tecnologia, em favor de usos éticos e
responsáveis pelo mundo.
No
último dia 21 de maio, a União Europeia aprovou uma lei inédita para
regular o desenvolvimento e a utilização da IA em seus 27
Estados-membros. A regulação europeia é resultado de uma ampla discussão
entre autoridades, especialistas e a sociedade civil de diversos
países, e que toma por peça-central os diferentes níveis de riscos
envolvidos no uso e desenvolvimento da IA. A expectativa é mitigar os
aspectos positivos e negativos que envolvem essa tecnologia.
Como
toda evolução tecnológica, os riscos podem ser resumidos pelos
percalços já experimentados pelo mundo. Já foram registrados casos em
que uma plataforma de IA apresentou respostas enviesadas ou
preconceituosas. A criação de deepfakes para fins maliciosos,
seja na aplicação de golpes financeiros ou em campanhas eleitorais, é
outro temor presente. A falta de transparência, a segurança de dados, o
uso de informações para manipulação e até a ameaça aos empregos são
outros elementos em pauta quando falamos na emergência de uma regulação
da IA.
Por
tudo isso, a iniciativa europeia aparece como um possível farol dentro
de um mar ainda revolto, se considerarmos as múltiplas complexidades que
envolvem a IA. De saída, precisamos ter a ciência de que a tecnologia,
por sua própria natureza, anda à frente de normas. E, por isso, tenho a
visão de que é preciso respeitar uma tríade de fatores para um bom uso
da IA no futuro: extrair o máximo potencial dela por meio de regulação,
participação democrática, e políticas em favor da inovação.
Não
faltam exemplos para identificarmos o potencial extraordinário da IA.
Cuidados de saúde personalizados na identificação e prevenção de
doenças, agricultura sustentável, o advento dos carros autônomos, o
desenvolvimento de novas fontes de energia limpa... a lista cresce à
medida que essa tecnologia se mantém em constante evolução, e novas
aplicações para ela surgirão a todo o momento daqui para frente.
Todavia, para que esse potencial seja liberado, é necessário o
engajamento para a formulação de políticas favoráveis ao nosso futuro.
No
Brasil, o pioneirismo das autoridades europeias inspira o projeto mais
avançado quanto ao tema da regulação da IA, que tramita no Senado
Federal. Há uma perspectiva de que a proposta seja analisada pelos
senadores até o fim deste ano, seguindo depois para análise na Câmara
dos Deputados – audiências públicas prometem abrir espaço para que
outros agentes vinculados à tecnologia e aos direitos humanos apresentem
as suas contribuições. No discurso político, a promessa é de buscar
segurança, transparência, responsabilidade e ética, sem travar o
desenvolvimento tecnológico.
É
importante mencionar que o modelo europeu de regulação da IA não é o
único. Podemos mencionar que há outras abordagens em andamento, como a
chinesa (ditada e controlada pelo governo) e a norte-americana (mais
alinhada à competitividade das chamadas big techs). Além dessas
iniciativas mais individualizadas, devemos mencionar os esforços quem
vai além de iniciativas locais, que projetam a construção de uma
regulação de âmbito global, com discussões em andamento nos âmbitos da
ONU, do G7 e do G20.
Para
a sociedade (e aqui incluo o ambiente de tecnologia e negócios), é
sintomática a sensação de que todas essas discussões são muito válidas e
necessárias, tanto que consultas públicas, fóruns de discussão e
workshops seguem sendo realizadas nos principais países do planeta.
Porém, é preciso ter o devido tempo para o entendimento, capacitação e
abertura para opiniões, estudos e demais insumos que possam enriquecer a
discussão. A IA é um fenômeno imparável, que pede uma regulação
própria, mas há muito na legislação atual – no Brasil temos aspectos já
contemplados no Marco Civil da Internet e na Lei Geral de Proteção de
Dados Pessoais (LGPD) – que podem ser aproveitados.
Existe
também o entendimento de alguns setores da economia de que o uso da IA
poderá pedir por regramentos específicos. Uma das áreas que mais investe
em tecnologia é a bancária, e nela há preocupações sobre
competitividade e inovação, caso legisladores caminhem para um caráter
mais intervencionista. Por isso, parece ainda necessária uma maturação
para incentivar segurança jurídica, investimentos em pesquisas e novas
tecnologias de IA éticas e responsáveis.
O
que gera menos controvérsia é que todos queremos evitar a utilização
nociva da IA, algo que já vemos em episódios de desinformação, da
criação de deepfakes e protagonizados por cibercriminosos. Na
mesma medida, essa tecnologia possui tanto potencial construtivo que é
impositivo que a discriminação, a desigualdade social e a falta de
transparência e privacidade sejam combatidas sem trégua.
A
velocidade da IA é tão grande que, no momento em que escrevo esse
artigo, é muito provável que alguma novidade em torno dessa tecnologia
esteja em andamento em alguma parte do planeta. Desta forma, a
rediscussão da sociedade e seus personagens multidisciplinares terá de
ser baseada tanto na cumplicidade quanto no entendimento de que estamos
falando de uma regulação que não terá uma data para terminar.
Embora setores da sociedade ainda temam pelos avanços da IA nos próximos anos e décadas, é mais factível enxergá-la como um copiloto na nossa vida particular e profissional. Assim como no uso diário dessa tecnologia, o homem e sua autonomia seguem como centro das ações. O mesmo vale para os debates em andamento e os que virão.
*Alessandro Buonopane é CEO Brasil da GFT Technologies
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