quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Dilma só procurou Cunha porque ele é mais forte como presidente da Câmara do que ela como presidente da República


A presidente Dilma Rousseff não viu outra saída: teve de procurar Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara, para conversar. Ela pediu a sua ajuda para que o Congresso não aprove medidas que agravem a situação econômica do país. Numa circunstância assim, o que vocês acham que ele disse além de “sim, claro!, presidente”? Leio aqui e ali que, depois do encontro, o deputado adotou um tom mais ameno. Para ser franco, não reparei. Até porque, com a presidente propriamente, ele nunca havia sido agressivo. Os embates maiores se deram com Rodrigo Janot — que ele considera estar atuando em parceria com o Planalto.
Muito bem! Depois do encontro com Dilma, Cunha anuiu com aumento de impostos? Não! Segundo ele, a solução passa pelo resgate da confiança — no que está certo; a questão é saber como — e pela queda da taxa de juros, cuja altitude paralisa a economia. Está parcialmente certo da seguinte maneira: com juros na estratosfera, de fato, ninguém investe. Mas por que estão na estratosfera?
Mais ainda: a cada elevação de 0,5 ponto percentual da Selic, a dívida pública cresce R$ 15 bilhões. A partir de determinado ponto, ficou claro que a elevação da Selic estava fazendo disparar a dívida e aprofundando a recessão, sem, no entanto, ter impacto significativo na inflação.
Para o deputado, segundo informa a Folha, menos grave do que apresentar um Orçamento no vermelho é passar ao mercado a ideia do descontrole da dívida pública — o que também é verdadeiro.
E Cunha disse uma coisa óbvia, que já observei aqui no blog: Dilma não pode jogar nos ombros do Congresso a responsabilidade de equilibrar o Orçamento. Não faz sentido. É a Lei de Responsabilidade Fiscal que a obriga a apresentar uma peça que, quando menos, aponte a fonte de recursos para os gastos previstos. Ora se tem graça um governo dizer: “Pretendo gastar tanto porque estas são as minhas prioridades, e vocês se virem para achar o dinheiro”.
Cunha negou que os dois tenham conversado sobre a Lava-Jato ou sobre o impeachment e disse que, de projetos específicos, só se falou daquele que prevê a repatriação de dinheiro. O deputado afirmou ter dito a Dilma que a Câmara só votará essa proposta se partir do Executivo.
Explica-se: o governo quer repatriar dinheiro não declarado de brasileiros depositado no exterior. Lá chegou de maneira necessariamente ilegal. Estima-se que poderiam entrar no país algo em torno de R$ 200 bilhões.
A proposta, que tramita no Senado, é de um senador de extrema esquerda: Randolfe Rodrigues, do PSOL (AP). Esse ingresso custaria o pagamento de 17,5% de multa e de 17,5% de impostos. Tudo saindo conforme o desejado, o governo conseguiria arrecadar pelo menos R$ 70 bilhões — que seriam usados para compensar Estados que sofressem perdas com mudanças que o governo pretende fazer no ICMS.
Apesar da multa e do imposto, a Câmara quer que o governo se comprometa com o tema para que a anistia, no que diz respeito à questão penal, não pese sobre os ombros da Câmara. É bem verdade que a taxação será de tal sorte elevada que é possível que muitos titulares de contas secretas prefiram deixar o dinheiro onde está. A menos que o governo tivesse como mapear esses recursos. Mas, pelo visto, não tem. Ou não apoiaria, como posso chamar?, esta repatriação premiada.
Pois é… Não há nada de errado em Dilma conversar com o presidente da Câmara. Aliás, ela já deveria tê-lo feito há tempos. O estranho é não conversar. Nessa relação, o Planalto esticou a corda achando que ela arrebentaria do lado de Cunha. Pode até vir a acontecer. Mas não aconteceu ainda. E, hoje, Dilma é mais fraca como presidente da República do que Cunha como presidente da Câmara.
E é por isso que ela a o procurou, não o contrário.
Por Reinaldo Azevedo

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