sábado, 29 de novembro de 2014

A força da mulher no campo


Mão de obra feminina amplia lucro de produtores. Desafio é conciliar trabalho com cuidados com a família
 
 
Lorena Soares
Especial para O HOJE

As mulheres estão conquistando cada vez mais espaço no campo, atingindo 10% da força de trabalho em 2014, o que significa um crescimento de 7% nos últimos dez anos, segundo pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Marketing Rural. O vigor dos homens é substituído pela delicadeza e precisão das mulheres na hora da colheita de legumes e frutas sensíveis. O resultado é o melhor aproveitamento da produção e o consequente aumento dos lucros em cerca de 30%. O que se tornou um trunfo para os produtores também é um grande desafio para as mulheres. Elas conciliam o trabalho na lida com os cuidados com a casa e a educação dos filhos, além das preocupações com a própria beleza e saúde.
Em Goianápolis, a cerca de 40 km de Goiânia, os produtores do tomate-cereja apostam nas mulheres como diferencial para conseguir resultados positivos na hora da colheita. José Moreira, de 55 anos, planta essa variedade de tomate há 16 anos na região. A experiência mostrou que as mulheres têm maior aproveitamento no trabalho do campo devido às próprias características do gênero. “As mulheres são mais delicadas e atenciosas na hora de colher o tomate, além de conseguir trabalhar em um ritmo forte. Os homens são mais desajeitados e acabam derrubando os tomates verdes enquanto estão colhendo os maduros”, explica o produtor. José Moreira estima que, desde quando adotou a mão de obra feminina na plantação, o aumento nos ganhos chegou a 30%. “É um excelente custo benefício para quem trabalha com variações mais delicadas de frutos”, afirma.
A jornada de trabalho é praticamente igual a dos homens. A lida começa cedo, por volta das 7 horas, e termina às 17 horas. Antes de chegar à plantação, alguns minutos na frente do espelho para cuidar da beleza e da saúde. Neura de Jesus, de 35 anos, capricha no protetor solar para evitar doenças como o câncer de pele e também para impedir o envelhecimento precoce. Embaixo das luvas, as unhas cuidadosamente feitas a cada 15 dias. “A gente se cuida, gosta de ficar bonita para o marido, para sair no final de semana, tomar cerveja e dançar forró”, diz com um sorriso tímido.
Desempenho superior
Cláudio Onizio Nigre, de 34 anos, é o responsável por supervisionar o trabalho das mulheres na colheita do tomate-cereja. Criado no campo, afirma que o desempenho das mulheres é superior ao dos homens nesse tipo de plantação. “Elas são muito guerreiras, trabalham mais do que muitos homens. Conquistaram o respeito de todos”, diz. Segundo ele, as mulheres também são mais disciplinadas na hora da lida, o que favorece os bons resultados da colheita.
Todas usam equipamento completo de segurança. Os cabelos feitos em um salão local ficam escondidos embaixo do boné e de protetores de pano. Os dedos hábeis colhem os frutos com rapidez. “A gente observa a coloração e a textura”, diz Daiane de Ribeiro, de 33 anos. Uma pré-seleção é feita ainda no momento da coleta no pé, separando sempre as melhores unidades para serem vendidas. As luvas protegem as mãos e mesmo com o trabalho intenso não há os característicos calos da profissão. Uma ajuda também dos produtos de beleza para maciez da pele. “As luvas evitam cortes, machucados, mas também existe o lado da vaidade, de nos manter bonitas”, diz.
O presidente da Federação da Agricultura de Goiás (FAEG), José Mário Schreiner, afirma que a Federação percebeu e trabalha pelo potencial das mulheres na agricultura e que Goianápolis foi um dos berços do programa de capacitação feminina justamente pelo amplo espaço para o trabalho das mulheres no campo. A expectativa, segundo o presidente, é que o crescimento do número de mulheres atuando na agricultura continue em expansão nos próximos anos.
Mães sonham com um futuro melhor para os filhos
As mulheres do campo tem uma profunda consciência da importância do trabalho que desenvolvem colocando comida na mesa de famílias de todo o país, mas como mães não deixam de pensar no futuro dos filhos. A principal dificuldade é acompanhar com proximidade os estudos das crianças, uma vez que passam o dia trabalhando em fazendas. Daiane de Ribeiro, de 33 anos e mãe de três filhos com idades de 9, 11 e 13 anos, diz que os estimula a estudar. “O meu sonho é que eles se tornem doutores”, diz com orgulho. Eles estudam enquanto a mãe trabalha na colheita. “É estudando que se consegue um futuro melhor”, afirma Daiane.
Muitas vezes o sonho de um futuro melhor é interrompido por questões que não podem ser planejadas. Quando Joelita de Moraes, de 32 anos, era apenas uma adolescente, o pai, Divino Graciano, então com 40 anos, sofreu com fortes dores na coluna devido à postura durante a colheita. Joelita e os irmãos deixaram os estudos e começaram a trabalhar na roça para ajudar no sustento da casa. O principal temor é que a história se repita com os filhos.
A valorização do ensino no país garante aos filhos dessas mulheres oportunidades que elas não tiveram quando crianças. A Federação da Agricultura do Estado de Goiás (FAEG), por exemplo, implantou no estado o programa “Agrinho” em parceria com o Senar Goiás. O programa complementa a metodologia do ensino formal nas escolas. Os professores passam por capacitação em Goiânia e replicam esse conhecimento com os alunos da rede pública. A melhor experiência pedagógica realizada pelo professor ganha um carro 0 km. Alunos recebem computadores para ampliar ainda mais o conhecimento e bicicletas. Apenas na última edição, foram mais de 3,5 mil projetos inscritos.
O presidente da FAEG, José Mário Schreiner, afirma que o programa Agrinho trabalha assuntos transversais naquilo que a criança aprende nas escolas. “O Agrinho estimula as crianças a se importar com temas importantes como a sustentabilidade ambiental e a produção de alimentos saudáveis. Quando a criança chega em casa fala das novidades que aprendeu e motiva os pais a também fazer essa mudança. A gente pretende formar uma consciência sobre o amanhã”, explica José Mário. (LS)

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