BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nada parece saciar a voracidade do Centrão por sinecuras. Isso seria um problema exclusivo de Lula, não fosse o fato de que a chantagem de um grupo de parlamentares prejudica todo o País. Editorial do Estadão:
Uma
pergunta se impõe: o que afinal saciará a voracidade do Centrão, em
particular do grupo chefiado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira
(PP-AL), por cargos e recursos públicos? Qual seria esse ponto de
equilíbrio em que a mágica acontece, isto é, o que ainda precisa ser
entregue aos glutões da República para que estes se deem por atendidos
em suas exigências, nem sempre inspiradas pelo melhor interesse público?
São perguntas retóricas, claro.
Não
faz muito tempo, após longa e tediosa espera, o presidente Lula da
Silva entregou dois Ministérios – Esportes e Portos e Aeroportos – para o
grupo de Lira. Porém, por mais que o governo ceda às imposições do
Centrão, parece sempre haver uma nova demanda a ser atendida. E, se o
Executivo ousar não ceder no tempo e nos termos que os deputados
desejam, estes cruzam os braços e simplesmente obstruem o funcionamento
da Casa, nada menos, como ocorreu há pouquíssimos dias. E que se dane o
País.
Eis
o ponto central dessa barafunda. Formar uma base de apoio ao governo no
Congresso é problema exclusivo de Lula. Mas isso passa a ser um
problema do País inteiro quando os impasses entre Executivo e
Legislativo levam à paralisação da agenda legislativa até que os
caprichos de uns e outros sejam acolhidos. Isso é inaceitável.
Com
a maior naturalidade, fala-se abertamente no fatiamento de Ministérios,
na criação de outras pastas ou na ocupação, de “porteira fechada”, de
autarquias e bancos públicos sem que esses movimentos sejam orientados
por essas chatices como eficiência ou interesse público. O dínamo é o
furor do Centrão para ocupar um espaço cada vez maior na administração
pública, de modo a ter acesso igualmente maior aos recursos do Orçamento
– o que se traduz, basicamente, na perpetuação do poder
político-eleitoral da casta.
O
“resgate” da hora em troca de uma suposta governabilidade é o comando
da Caixa, mas não só. O Centrão quer liberdade para ocupar todas as
diretorias do banco. Mas isso é hoje. Amanhã, a imposição decerto será
outra.
Tal
é o despudor dessa turma que a coação passou a ser física. No dia 26
passado, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, foi
literalmente emparedado por deputados do PSD na saída de um evento no
Palácio do Planalto. A parede contra a qual Padilha foi pressionado
pelos parlamentares foi transformada num muro de lamentações. Acossado, o
ministro teve de ouvir um rosário de cobranças por cargos – em especial
na Fundação Nacional de Saúde (Funasa) – e repasses de recursos
federais aos Estados.
Uma
das deputadas participantes do cerco, Laura Carneiro (PSD-RJ), ameaçou
abertamente o governo federal. “Se a gente dançar, a Nísia (Trindade,
ministra da Saúde) vai dançar também”, disse a parlamentar ao ministro,
de acordo com um áudio captado pela Rádio CBN. Ora, o que a veterana
parlamentar quis dizer com isso? Padilha chegou a comparar a abordagem
de parte da bancada do PSD a uma batida policial. “Vocês (os repórteres)
viram o verdadeiro ‘baculejo’ que a Delegada Katarina deu em mim, vocês
viram, né?”, disse o ministro, referindo-se à deputada Delegada
Katarina (PSD-SE). Aos que se chocaram com a cena, Padilha ainda fez
graça: “Vocês não têm ideia do que eles fazem comigo a portas fechadas”.
Assim,
já não se pode falar mais em presidencialismo de coalizão, que já era
ruim por resultar da incapacidade do Executivo de formar maioria sem
fazer concessões a grupos políticos pouco ou nada identificados com a
plataforma política vencedora da eleição. O País agora parece ter
entrado de vez no presidencialismo do esbregue, em que o governo é
chantageado à luz do dia, sem qualquer constrangimento e com um grau de
agressividade típico das máfias. Isso obviamente nada tem a ver com
política. É extorsão.
Diante
disso, fica fácil responder às perguntas do início deste editorial.
Lula (ou qualquer outro presidente) pode criar dezenas de Ministérios e
escancarar porteiras em apetitosas autarquias, mas nada disso parece
suficiente para essa turma – que, na hora do voto, nem lembra que é base
do governo.
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