domingo, 25 de junho de 2023

O dinheiro é sobre lidar com estranhos

 

BLOG  ORLANDO  TAMBOSI

Um grupo unido pelo amor, ou ao menos pela lealdade ao grupo, não precisa de dinheiro. Deirdre McCloskey para a Folha de São Paulo:


A definição de "dinheiro", em economia, é qualquer coisa que realize três tarefas. Ele armazena valor; ele conta o valor em uma unidade —dólares ou reais; ele é aceito para comprar coisas. Dinheiro é para guardar, contar, gastar.

Eu estava conversando com Lawrence H. White, o grande economista monetário da Universidade George Mason, na Virgínia. Ele acabou de escrever "Better Money: Gold, Fiat ou Bitcoin?" (Melhor dinheiro: ouro, moeda corrente ou bitcoin?). Compre o livro!

Perguntei a ele se achava que havia alguma sociedade humana que não tivesse dinheiro.

Lawrence e eu concordamos que o dinheiro não é apenas a cunhagem emitida pelos reis, no início do primeiro milênio antes de Cristo, no que hoje é o norte da Turquia. Visite um museu com peças do antigo Iraque e você verá bobinas de ouro que as pessoas cortavam para comprar coisas. Os mesoamericanos antes dos espanhóis usavam grãos de cacau como dinheiro. O dinheiro também não é apenas o papel "fiduciário" que o Estado legaliza e depois imprime em excesso, como no Brasil durante décadas, atingindo o pico em 1990.

White disse que somente quando as pessoas se dedicassem à agricultura é que precisariam de dinheiro. Não, respondi, os caçadores-coletores também precisariam de reservas de valor, contas e trocas. Lawrence respondeu que escambo não é dinheiro. Respondi que, se um item de troca, como o gado, é usado habitualmente, você também pode chamá-lo de dinheiro. Os pastores da África Oriental usavam gado para comprar esposas.

Mas então nossa conversa chegou a uma nova ideia.

Um grupo unido pelo amor, ou pelo menos pela lealdade ao grupo, não precisa de dinheiro. Obtém as vantagens do dinheiro sem precisar de nenhuma reserva, nenhuma contagem ou nenhuma troca. Dentro de famílias, empresas e exércitos, basta depender da cooperação amorosa de uma família ou da lealdade de um time de futebol ou, nos casos menos doces, de uma ordem superior, como no planejamento central soviético.

Portanto, não é se os humanos estão fixos num lugar que torna o dinheiro útil. É se eles estão lidando dentro ou fora do grupo de lealdade/coerção. O dinheiro é sobre lidar com estranhos.

Mas espere. A economia, portanto, não pode ser apenas sobre pessoas de fora. Também tem de ser sobre a formação de grupos de amor ou coerção. Ou seja, até a economia monetária precisa de sociologia e política.
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