Com
velhos conhecidos de outros governos petistas e caras novas, aliados
históricos e antigos adversários, a equipe de transição do presidente
eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se encaminha para completar um mês
de trabalho com 416 integrantes --a maior dentre todas as transições
desde 2002.
Muitos dos postos foram preenchidos por aliados do período eleitoral e
derrotados nas urnas, que agora se veem sem um futuro bem definido. E
esse inchaço já provoca ruídos em alguns grupos técnicos.
Além disso, nos bastidores já se desenrola uma disputa para preencher
vagas dos segundo e terceiro escalões da máquina federal, ao mesmo
tempo em que os nomes mais fortes articulam para que eles próprios
possam assumir ministérios.
O governo de transição começou a atuar oficialmente logo após o
segundo turno das eleições, com as discussões e formações dos primeiros
grupos técnicos e escolha dos coordenadores. No entanto, foi apenas na
semana seguinte que a equipe de Lula se estabeleceu no CCBB"‚(Centro
Cultural Banco do Brasil), em Brasília, que desde então viu sua
movimentação aumentar dia a dia.
Um dos eventos frequentes tem sido o anúncio por parte do coordenador
da transição, o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB), de novos
quadros para compor a equipe. E o inchaço ainda deve aumentar nos
próximos dias, porque ainda há grupos técnicos indefinidos, como o da
Defesa.
A transição também conta atualmente com 20 cargos remunerados.
Segundo a legislação referente à transição, as equipes dos presidentes
eleitos têm direito a até 50 cargos especiais de transição
governamentais, cujos salários variam de R$ 2.700 a R$ 17,3 mil. Os
demais atuam como voluntários ou então cedidos por seus órgãos de
origem, nos casos de funcionários públicos.
O governo de transição de Lula já tem praticamente o dobro dos
integrantes da equipe de Jair Bolsonaro (PL), em 2018. Foram 220 pessoas
trabalhando na preparação da atual gestão, sob o comando de Onyx
Lorenzoni.
No final de 2002, a equipe de transição do primeiro mandato de Lula contou com 69 pessoas.
Agora, na tentativa de montar uma equipe com os nomes preferidos de
Lula e do PT, ao mesmo tempo que aliados e outros nomes que o ajudaram
eleitoralmente são contemplados, o que se tem visto são grupos técnicos
inchados --além de muitos bem heterogêneos e antagônicos.
Na última semana, a transição ainda anunciou a entrada de 99
políticos nos grupos técnicos, entre deputados e senadores em exercício
ou eleitos. A indicação pegou de surpresa parte dos integrantes dos
grupos, que já planejavam os trabalhos com a composição que estava
estabelecida.
Um primeiro ruído teve um desfecho na última semana, com a
desistência do deputado federal Alexandre Frota (Pros-SP) de integrar a
equipe de transição. Ex-bolsonarista e aliado de última hora, Frota foi
um dos parlamentares que Alckmin anunciou para contribuir nos grupos.
Ele atuaria no grupo técnico da Cultura, mas sua nomeação despertou a
ira de petistas e da classe artística historicamente ligada ao partido.
Frota anunciou a sua desistência, apontando "preconceito" contra ele.
A divisão em 31 grupos técnicos é apontada como um esboço do futuro
governo e dos ministérios que irão formá-lo. Aliados apontam que a
presença na transição não significa lugar na Esplanada, mas a presença
de diversos pesos pesados já abriu uma disputa em alguns grupos técnicos
pela vaga de ministro.
Uma das disputas está no grupo técnico de Cidades e envolve o
deputado federal eleito Guilherme Boulos (PSOL-SP), preferido dos
petistas, e o ex-governador de São Paulo Márcio França (PSB), do partido
de Alckmin e considerado peça importante no xadrez político.
Atritos em outros grupos técnicos prometem dar dor de cabeça a Lula.
Na Assistência Social, área responsável pelo Bolsa Família, a senadora
Simone Tebet (MDB-MS) figura como uma das cotadas após ter saído
fortalecida das eleições presidenciais e ter ajudado na campanha
petista. Mas há também Tereza Campello, referência petista e que já
integrou o governo de transição de 2002 na área.
As duas parecem sintonizadas nas agendas públicas, como na recente
visita ao Ministério da Cidadania. Por outro lado, petistas já atuam nos
bastidores para evitar que uma das principais bandeiras do futuro
governo fique na mão de uma neoaliada, ao mesmo tempo que a direção do
MDB joga o peso do partido para evitar que Tebet seja descartada.
Disputas semelhantes são vistas em grupos técnicos como o da Agricultura e o do Desenvolvimento Regional, entre outros.
Integrantes da equipe de transição citam o caso do grupo técnico de
Minas e Energia como um exemplo de sinergia e alinhamento. Praticamente
todos os integrantes, entre acadêmicos e políticos, compartilham a visão
petista sobre energia e o papel da Petrobras, por isso as falas e
declarações estão alinhadas --apesar de terem provocado reação do
mercado, por sugerirem um controle maior do Estado.
Os grupos técnicos de Comunicações e Ciência, Tecnologia e Inovações
também sugerem, a princípio, um certo alinhamento com os princípios
petistas e pouco antagonismo e discordâncias internas.
Com a certeza de que não haverá espaço para todos no novo governo, a
participação na transição já está sendo vista como um "prêmio de
consolação", o que explicaria parte do inchaço da equipe nessa etapa. A
lógica vale especialmente para parlamentares que não tiveram sucesso nas
urnas em outubro e que agora buscam espaço --mas que não contam com o
peso político de mandatos.
Questionado sobre o inchaço, o governo de transição respondeu em nota
que "segue rigorosamente o que está previsto na legislação específica",
com aval para nomear "50 cargos comissionados, servidores requisitados
de outros Poderes e colaboradores voluntários".
Raio-x da transição
Coordenador: vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB)
Número de membros: 416, sendo 134 parlamentares
Grupos técnicos: 31
Partidos com parlamentares na equipe: PT, PSD, PSB, PDT, MDB, PC do B, PSOL, Avante, Rede, Solidariedade, PV, Pros e Cidadania
Regras: A lei que regulamenta a transição foi aprovada em 2002 e
aborda o fornecimento de informações detalhadas sobre a situação das
contas públicas, dos programas do governo federal e o funcionamento dos
órgãos
Cargos: Por lei apenas 50 integrantes podem receber salários
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