Quer saber? Dadas as circunstâncias, a vacina deveria ser obrigatória para todos, com penalidades para quem não se imunizasse. Carlos Alberto Sardenberg para O Globo:
Saiu o que deve ser a primeira sentença no Brasil punindo um cidadão por desrespeitar as regras de isolamento.
O
juiz Carlos Gustavo Urquiza Scarazzato, de Adamantina, interior de São
Paulo, condenou um homem de 29 anos a pagar indenização de R$ 3 mil por
dano moral coletivo.
Esse
homem foi diagnosticado com Covid-19 em março de 2021 e recebeu a
recomendação de permanecer isolado do dia 5 até 17 desse mês. Ele furou o
isolamento — uma das vezes para ver uma partida de futebol — e foi
flagrado pela Vigilância Epidemiológica. Primeiro, recebeu advertência,
depois, continuando a sair de casa, e ainda sem máscara, a Vigilância
lavrou auto de infração, e a polícia registrou Boletim de Ocorrência.
Daí,
o Ministério Público estadual ajuizou ação civil pública. E,
finalmente, a sentença, baseada na Lei 13.979, de 2020, que estabeleceu
as medidas sanitárias para o combate à pandemia.
Segundo
o juiz Scarazzato, o réu cometeu “grave ataque à saúde coletiva”,
colocou em risco diversas outras pessoas, com “inegável dano social”,
crime passível de indenização.
Eis
o ponto. A liberdade individual tem limites — e o limite é o direito
dos outros. Decisão importante neste momento em que ainda se discute se
as pessoas têm o direito de não se vacinar e continuar circulando por
aí.
Alguns
movimentos desta semana: o governo da Austrália mandou o notório
antivacina Djokovic para casa; e o Parlamento da Áustria aprovou lei que
tornará a vacinação obrigatória a partir de fevereiro, estipulando
multa pesada para os deliberadamente não imunizados. Houve protestos em
Viena durante a votação.
Por
aqui, o ministro da Saúde continua em sua campanha para desmoralizar a
vacinação infantil e insiste que a imunização não é obrigatória. Muitos
especialistas, porém, entendem que a legislação brasileira torna, sim,
obrigatória a vacinação das crianças — não apenas para Covid-19, mas
para todas as moléstias contagiosas.
Está
faltando uma palavra do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre esses
“direitos difusos”. Quem sabe chegue à Corte o caso de Adamantina. Mas,
gente, que seja com um mínimo de celeridade. Do jeito que costuma
acontecer, o STF só tomaria uma decisão na próxima pandemia.
A
população brasileira mostra grande adesão à vacina. Entretanto muitos
pais e mães têm manifestado dúvida, estimulada pelo presidente e pelo
ministro Queiroga. Os dois tiveram comportamento imperdoável diante do
caso de uma menina de Lençóis Paulista, interior de São Paulo, que
sofreu parada cardíaca horas depois de receber uma dose da Pfizer.
Em vez de determinar estudos e pesquisas, Queiroga correu para a cidade para visitar a família da “vítima”. Bolsonaro telefonou.
Isso
quando os estudos promovidos pelo governo e entidades científicas de
São Paulo já mostravam que não havia relação de causa e efeito entre os
dois eventos. A menina, que já está bem, sofria de uma doença cardíaca
não diagnosticada até então.
É
até ridículo ter de falar disso quando se sabe que centenas de milhões
de crianças têm sido vacinadas mundo afora, com total segurança. Pela
ciência, logo estarão sendo vacinados bebês a partir de seis meses. E
nós aqui nesse negacionismo.
Quer saber? Dadas as circunstâncias, a vacina deveria ser obrigatória para todos, com penalidades para quem não se imunizasse.
Tem
razão o juiz Scarazzato: o comportamento do cidadão que quebrou o
isolamento, sabendo que estava infectado, “agravou os nada
insignificantes riscos de disseminação da Covid- 19, majorando os riscos
a toda a coletividade (...) Essa conduta tem aptidão concreta para
expor a coletividade a riscos decorrentes do comportamento individual
irresponsável. Efetivamente, o contexto pandêmico evidencia a relevância
de direitos difusos, cujos titulares são indefinidos, mas que nem por
isso são menos relevantes e podem sofrer menoscabo em razão da conduta
irresponsável”.
É isso aí.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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