Os jovens das gerações millennial e Z, o ambiente tóxico das universidades e a pandemia de coronavírus foram alguns dos temas abordados por Luiz Felipe Pondé em entrevista à revista Oeste:
A
utor do Guia Politicamente Incorreto da Filosofia, entre outras dezenas
de obras, Luiz Felipe Pondé nasceu no Recife, em 1959. Depois de trocar
a medicina pela filosofia, ele se tornou defensor do pensamento
liberal-conservador, que abrange ideias de autores como David Hume, Adam
Smith, Edmund Burke e Theodore Dalrymple, entre outros.
Na
conversa com Oeste, Pondé criticou a cultura woke, a doutrinação
ideológica dentro das universidades, o movimento antitrabalho, o
feminismo e, claro, o politicamente correto. “O debate está polarizado
demais”, disse. “Essas discussões sobre banheiro disso e banheiro
daquilo são muito ridículas. Tenho a impressão de que, se a moçada de
hoje tivesse de invadir a Normandia, ela faria xixi nas calças.”
Confira os principais trechos da entrevista.
O que o senhor acha do politicamente correto e da cultura woke?
O
politicamente correto é uma forma autoritária de domínio da linguagem e
de destruição do pensamento que só atrapalha o debate público. Sobre a
cultura woke, acho um porre, uma besteira. Coisa de menino de país rico
ou de classe média alta. Trata-se de gente preocupada com pronomes
neutros, meio ambiente, múltiplos gêneros, mas que não arruma a própria
cama. A cultura woke é muito business. Se o mundo não der muito errado,
nossa época vai dar apenas um parágrafo daqui a 500 anos.
Nos
Estados Unidos e no Reino Unido, surgiu o movimento antitrabalho,
capitaneado por jovens das gerações millenial e Z. Como o senhor enxerga
isso?
O
movimento antitrabalho é coisa de gente que vai ser financiada pelo
Estado no futuro ou tem grana. Não há como viver sem o trabalho, a não
ser que alguém pague as suas contas. Tanto no Brasil quanto nos EUA e no
Reino Unido, a competição no capitalismo está cada vez mais violenta, e
os jovens de hoje foram tão moldados na ignorância que, quando veem a
vida como ela é, entram em choque. Os jovens conhecem pouco da vida,
vivem mais de sonhos que de realidade e são propensos à ideologização. A
vida sempre foi dura, cruel e sem grandes soluções. Soma-se a isso a
propagação de várias utopias, que quebram as pernas de pessoas em
processo de amadurecimento, porque as lança em um mundo de fantasia.
Quando deparam com os fatos, desistem de tentar enfrentar o mundo. Isso
se traduz em vários livros de millennials que tratam do “burnout”. Todos
pregam o antitrabalho e sugerem uma nova forma “menos dura” de ganhar
dinheiro e que faça mais sentido. Dessa forma, podem encontrar a
“felicidade” em outro lugar. O discurso antitrabalho só rende se o
sujeito virar palestrante contra o trabalho, como vários vêm fazendo.
O que o senhor pensa sobre as universidades brasileiras?
Tradicionalmente,
as universidades são críticas ao status quo. Elas têm vocação para
criar atrito com instrumentos de poder. No Ocidente, acabaram se
alinhando a movimentos sociais de esquerda, com críticas ao capitalismo e
a determinados governos. Ao analisar o Brasil, constata-se que a
ditadura militar acabou formando a esquerda que temos quando entregou o
controle das faculdades aos chamados “progressistas” da época. Portanto,
em um contexto de Guerra Fria, os centros acadêmicos incorporaram
ideias ligadas à China e à União Soviética. Atualmente, a esquerda
brasileira está ligada à norte-americana. As universidades se tornaram
ambientes tóxicos e autoritários, onde não há debate, mas, sim, brigas
corporativas internas.
Qual a sua avaliação sobre os movimentos feminista e LGBT?
Na
origem, o feminismo surge em meio aos processos revolucionários do
século 19, como o sufragismo e o sindicalismo. Está relacionado à
emancipação da mulher propriamente dita. O movimento, contudo, vai se
tornando mais identitário, com a absorção de ideias de pessoas como
Simone de Beauvoir, entre outras pensadoras. Surgem, então, termos como
“masculinidade tóxica” e a crítica se estende à linguagem. O movimento
LGBT é mais recente e deve a sua existência à publicidade americana, que
viu nos gays um importante nicho de mercado. Pessoalmente, avalio que
as pautas identitárias flertam com certo totalitarismo de censura da
linguagem. Dos anos 1980 para cá, a esquerda ficou viúva da União
Soviética e da utopia proletária. Assim, começou a procurar outros
nichos ideológicos, apropriando-se das pautas identitárias, que acabaram
herdando o temperamento autoritário bolchevique. Com isso, deságuam no
que estamos vendo hoje: o policiamento de ideias, de pessoas não poderem
escrever ou discutir determinados assuntos. No Brasil, perdeu-se a
oportunidade histórica de se fazer uma crítica decente a isso. O
bolsonarismo, por exemplo, não conseguiu, apenas transformou a crítica
em boçalidade.
Para o senhor, o que é a ideologia de gênero?
A
teoria de gênero sustenta que só há componentes sociais na construção
da identidade de um ser. No entanto, ao argumentar que não há elementos
da evolução do ser humano nesse processo, a teoria de gênero se
transforma em militância radical. A partir daí, ela vai para as escolas e
a educação se torna uma loucura, porque ninguém entende essa teoria
direito. Pós-década de 1960, isso se tornou mais uma ferramenta para
moldar a cabeça dos jovens, ainda em processo de formação intelectual.
Em alguns Estados dos EUA, por exemplo, proíbem os jovem de tomar
bebidas alcóolicas antes dos 16 anos, mas deixam um garoto de 15 anos
retirar o próprio pênis.
Como será a sociedade no pós-pandemia?
Vai
depender se conseguiremos desmantelar a pandemia como uma commodity. Se
conseguiremos parar de fazer propaganda de variantes ao escrever
manchetes do tipo “cepa potencialmente mais infecciosa” ou “mais
resistente à vacina”. Dependerá da responsabilidade dos agentes
públicos, da academia e da mídia. Isso pode demorar. Talvez não seja
possível tirar imediatamente o home office, viajar e lidar com a
paranoia de alguns países. Mas, se a história seguir o seu curso,
provavelmente a humanidade se recuperará, como o fez no passado.
O que é ser conservador?
É
ter um olhar cético à modernização e não o olhar romântico do afeto e
do mal-estar. O pensamento conservador, da forma como ele me interessa, é
a tradição de Edmund Burke, de David Hume e de Michael Oakeshott. Em
suma, ser conservador é alguém que toma cuidado com as muitas utopias
político-sociais que a modernização trouxe.
O mundo está muito chato?
Sim.
Há muita falação. Todo mundo tem opinião sobre tudo. O debate está
polarizado demais. Essas discussões sobre banheiro disso e banheiro
daquilo são muito ridículas. Tenho a impressão de que, se a moçada de
hoje tivesse de invadir a Normandia, ela faria xixi nas calças.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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