segunda-feira, 29 de novembro de 2021

Tiros nas ferraduras

 



Coluna de Carlos Brickmann, publicada nos jornais de quarta-feira, dia 24 de novembro:


O PSDB, que elegeu duas vezes o presidente da República, que disputou o segundo turno até 2014, resolveu fazer prévias para escolher quem seria o seu candidato no ano que vem– e, ao mesmo tempo, ocupar o noticiário. Pois não conseguiu escolher o candidato; mostrou-se capaz de ocupar o noticiário, mostrando-se incapaz sequer de promover as prévias; revelou-se totalmente rachado, com acusações pesadas entre os candidatos, com uma deputada saindo do partido porque, disse, o que queria mesmo era reeleger Bolsonaro.

Eleição não é para amadores. Nos Estados Unidos, depois de ser batido por Obama, o republicano Joe McCain foi cumprimentá-lo e oferecer-lhe sua cooperação. Os repórteres lhe perguntaram o motivo da gentileza, depois da troca pesada de ataques na campanha. McCain foi claro: “Na campanha ele era meu adversário. Agora é meu presidente”. Mas Sérgio Motta, Montoro, Covas e outros profissionais morreram. Fernando Henrique, o profissional por excelência, já não participa da vida partidária. Restaram os briguentos.

Bolsonaro, mesmo com a caneta na mão e verbas ilimitadas, fartamente distribuídas, não consegue fazer nem com que o chanceler que indicou seja sabatinado pelo Senado. Derrapa nas declarações (comemorou, por exemplo, o “bom dia especial” que tinha dado à esposa, indicando, pelo estardalhaço, que isso não deve ser tão comum; prometeu privatizar a Telebrás, que deixou de ser do Governo há muitos anos). E nega o desmatamento da Amazônia.

E Lula?

Lula mentiu muito em sua viagem à Europa, dizendo, por exemplo, que foi declarado inocente (na verdade, seus julgamentos foram anulados por questões técnicas. E, embora isso não vá dar em nada, têm de ser refeitos). Mas é inegável que fez sucesso, sendo bem recebido por dirigentes que não deram a menor bola a Bolsonaro. E como aproveitou o sucesso? Elogiando o ditador da Nicarágua, Daniel Ortega, que acaba de se reeleger pela quarta vez, agora após colocar na prisão seus sete maiores adversários.

Quis comparar Ortega com Angela Merkel – logo ela, que nunca foi acusada de corrupção, que ganhou eleições sem prender ninguém. E que é eficiente.

Há mais: quando presos políticos fizeram greve de fome em Cuba, e um morreu, Lula foi fotografado ao lado de Raul Castro, o ditador da época, às gargalhadas, e acusou as vítimas da violência de serem reles bandidos.

Por algum motivo, Lula se sente compelido a falar bem de Cuba. No caso da atual repressão a protestos, disse que isso acontece não apenas em Cuba, mas no mundo inteiro. Quando isso aconteceu no Brasil, aí ele reclamou muito. Repressão no lombo dos outros não dói no dele.

E Moro?

Há quem diga que Sergio Moro é um Bolsonaro que come com talheres. Talvez se possa dizer que Bolsonaro carrega a arma nas mãos, e Moro numa caixa de violino. Moro bateu duro no PT e em Lula, por terem elogiado as eleições da Nicarágua apesar da prisão dos opositores, e por tentarem minimizar a repressão aos protestos em Cuba. Disse que “não dá para flertar com o autoritarismo”. Mas manteve pessoas presas por prazos longos, sem julgamento, até que, para poder sair da cadeia, fizeram acordos de delação premiada. A propósito, já circula por aí um vídeo em que Moro, há poucos anos, garantia que jamais faria política.

Fez: não só aceitou o convite de Bolsonaro para ser seu ministro como agora é candidato à Presidência.

O caminho do meio

Quem não quer Lula nem Bolsonaro terá dificuldade para achar um candidato. Boa parte dos políticos está envolvida com alguma coisa. A última: cada um dos 302 deputados que elegeram Arthur Lira presidente da Câmara recebeu oferta de R$ 10 milhões para aplicar em emendas, via orçamento secreto. Quem revela a bandalha é o deputado Delegado Waldir (PSL-Goiás), líder do partido enquanto aguentou Bolsonaro. Arthur Lira não se preocupa: agora, articula a escolha de um vice de seu PP para Bolsonaro.

Religião ameaçada

Em Sumaré, SP, três terreiros de umbanda foram depredados em poucos dias. Os sacerdotes fizeram Boletim de Ocorrência, mas a Polícia se recusou a registrar o caso como intolerância religiosa: registrou-o somente como invasão. A Prefeitura só sugeriu que os terreiros contratassem seguranças. Os fieis filmaram um carro Corsa cujo motorista fotografava quem ia a esses terreiros. Acontece que a placa do Corsa era originalmente de um Meriva. Nem assim as autoridades se mexeram. Alô, governador João Doria!

OAB obrigatória

Atenção, advogados: a eleição para a OAB-SP, a maior do país, é amanhã, das 9h às 17h, e o voto é obrigatório, sob pena de multa. Houve mudanças: para saber onde votar, veja bit.ly/OABSP2021ondevotar. De acordo com a pesquisa do Estadão, duas chapas disputam cabeça a cabeça: a situação, de Caio Augusto, e a 14, de Patrícia Vanzolini e Leonardo Sica, de oposição.
 
BLOG  ORLANDO  TAMBOSI

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