Tê-los ou comê-los? Coreia do Sul discute proibir carne de cachorro.

 

Isso sim é mudança cultural: países onde caninos são vistos como iguaria procuram melhorar a imagem e banir os companheiros animais do cardápio. Vilma Gryzinski:

Todo dia é dia de “Batatinha frita, um dois, três…”, o jogo cruel da série Squid Game, para cães criados como comida num arco de países asiáticos – incluindo as duas Coreias, China e Vietnã.

As tentativas de acabar com o hábito esbarram em resistências culturais, especialmente dos mais velhos, habituados a gostar de bosintang, a sopa de carne de cachorro, nos quais enxergam qualidades culinárias e propriedades restaurativas, especialmente no verão.

Para jovens sul-coreanos, muitas vezes vestidos como os ídolos do BTS, carne de cachorro causa tanta rejeição quanto aos brasileiros urbanos que descobrem o gosto por churrasco de bicho-preguiça ou ensopado de tatu em regiões de vida selvagem farta.

Os pratos com carne de cachorro, sem falar nas condições atrozes em que os animais são criados, também provocam constrangimento social, tanto na Coreia do Sul quanto na China, países que querem ser conhecidos pelos avanços tecnológicos e não por hábitos estranhos no mundo ocidental.

“Não teria chegado a hora de considerar prudentemente a proibição ao consumo de carne de cachorro?”, perguntou, cheio de dedos, Moon Jae In, o presidente de centro-esquerda que vive fazendo gestos não correspondidos de abertura para a Coreia do Norte – seus pais vieram de lá e ele teve uma infância muito pobre.

Moon criou uma força-tarefa para cuidar do assunto – e não parece ser um jeito de simplesmente camuflá-lo.

Com o desenvolvimento da Coreia do Sul, que nas últimas décadas chegou a 32 mil dólares per capita, cães acabaram virando pets, não apenas animais de companhia, mas símbolos de status. Um fenômeno semelhante aconteceu na China, onde o governo tem uma capacidade maior ainda de intervenção na vida dos cidadãos, mas ainda não conseguiu eliminar os cachorros do cardápio (e se a algum incauto for oferecido um prato chamado “O Tigre e o Dragão”, saiba que é uma sopa feita com carne de gato e de cobra).

“A Coreia do Sul é o único país desenvolvido do mundo onde se come carne de cachorro, algo que prejudica nossa imagem internacional”, espeta Lee Won Bok, diretor da Associação Coreana de Proteção dos Animais.

“Mesmo que o BTS e o Squid Game estejam em primeiro lugar no mundo, os estrangeiros ainda associam a Coreia do Sul à carne de cachorro e à Guerra da Coreia”.

O maior mercado de carne de cachorro de Seul fechou no começo do ano. Existem cerca de cem restaurantes na cidade onde a sopa canina ainda é servida. Segundo uma pesquisa do ano passado, 84% dos sul-coreanos nunca comeram o prato e 60% são a favor do fim desse comércio.

Forçar a mudança de hábitos culturais, mesmo quando não são mais majoritários, pode provocar o efeito oposto.

A Covid-19 impulsionou a proibição do consumo de animais silvestres na China, mas ele está muito longe de ter sido eliminado.

Durante o longo reinado de Mao Tsé Tung, os cães foram sistematicamente eliminados como pragas que consumiam recursos racionados e espalhavam doenças (também lançou a campanha das Quatro Pestes, ratos, moscas, pernilongos e pardais, que resultou em grave desequilíbrio ecológico, num sinal de que nem um tirano formidável como ele podia dominar a natureza).

Ter cachorros, como ter filhos, virou um símbolo de status com a abertura da economia e a ascensão à classe média de centenas de milhões de chineses. A licença para ter cachorros custa caro, mas é claro que não faltam influencers caninos, cães que fazem sucesso nas redes sociais, como Sylar, o simpático border colllie que virou uma estrela do mundo digital e hoje tem uma casa com hidro e piscina avaliada em 500 mil dólares – seu dono ficou milionário com ele e abriu uma negócio de rações e brinquedos.

De brincadeira, é possível dizer que os cães domesticaram os humanos há cerca de dez mil anos, colocando-os a seu serviço para obter abrigo, comida e carinho. Comê-los, fora da região asiática onde são iguaria, só em casos extremos de fome, quando o tabu contra ingerir carnívoros é suplantado pela lei da sobrevivência.

Longe dos olhos do público sensível aos pets, cães são utilizados em pesquisas de laboratório onde duas necessidades se confrontam: conhecer melhor doenças que nos afligem e os remédios para combatê-las e causar o menor sofrimento possível aos animais através dos quais podemos fazer isso.

Nada, por exemplo, abalou tanto o prestígio de Anthony Fauci, o virologista americano que se transformou em inimigo predileto dos conservadores, pelos argumentos, às vezes cambiantes, em favor de medidas restritivas na pandemia, quanto a divulgação de que seu instituto financiou pesquisas em que beagles eram cruelmente picados pelo mosquito que causa a leishmaniose.

Os exageros foram desmentidos, mas não a natureza da pesquisa.

Defensores mais apaixonados dos direitos dos animais contestam não apenas esse tipo de pesquisa, mas até que pets, mesmo bem tratados, sejam mantidos para o prazer de seus donos. Perdão, tutores.

Se tê-los é discutível, imaginem comê-los.

 

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O declínio da democracia brasileira

 

Com o melhor funcionamento do sistema político no conjunto, será possível atenuar o descontentamento e, consequentemente, bloquear o caminho para aventuras redentoras. Fernando Gabeira para o Estadão:

Relatório divulgado em Estocolmo esta semana indica a democracia brasileira como uma das que mais decaíram nos últimos cinco anos.

O relatório é assinado pelo Instituto Internacional para a Democracia e Assistência Eleitoral (Idea) e considera que a democracia foi afetada negativamente pela gestão da pandemia, por escândalos de corrupção, protestos antidemocráticos e ameaças ao Estado de Direito.

Para quem acompanha o cotidiano nacional, isso não é uma grande surpresa. A democracia está em acentuado declínio desde a eleição de Bolsonaro, em 2018, e o presidente eleito é o ator mais importante no retrocesso.

Os Estados Unidos, pela primeira vez, apesar do vigor de sua democracia, aparecem em ligeiro declínio, graças, sobretudo, à passagem de Donald Trump pelo poder.

Um dos fatores que atingiu a democracia americana acabou se expandindo para o Brasil: o questionamento do sistema eleitoral. Trump recusou-se a aceitar a derrota, alegando fraudes, enquanto Bolsonaro, no Brasil, atacava o voto eletrônico.

Não sei se o relatório chegou até lá, mas a escalada autoritária no Brasil sofreu um abalo depois do Sete de Setembro. Naquele dia, Bolsonaro reuniu multidões para atacar o Supremo Tribunal Federal (STF) e havia dezenas de cartazes pedindo intervenção militar.

Não há dúvida de que a maior ameaça à democracia no Brasil nasce com Bolsonaro e seus aliados. O relatório aponta o processo de declínio como iniciando em 2016, com o impeachment de Dilma. No entanto, a crise que corroeu o sistema político antes de 2018 e que permitiu a ascensão de Bolsonaro já expressava um declínio no processo de redemocratização. Esse declínio pode ser traduzido no desencanto dos eleitores com o sistema político e sua abertura para aventuras que varressem todos os seus vestígios.

Nesse sentido, Bolsonaro é o principal ator do declínio democrático, mas não o inventou, apenas tirou partido da crise, para aprofundá-la ainda mais.

A compreensão de que a crise democrática não se resume apenas no seu ator principal é algo que talvez possa afinar um pouco nossos instrumentos de análise.

Esta semana foi marcada pelo fiasco tecnológico nas eleições prévias do PSDB. O partido teve a boa ideia de importar o sistema de eleições primárias americanas, mas, ao adaptá-lo às suas circunstâncias, acabou revelando seu próprio fracasso.

O PSDB, um dos grandes partidos brasileiros do processo de redemocratização, já estava em decadência. A crise de confiança causada pelas denúncias de corrupção o atingiu em cheio.

Nas eleições de 2018, alguns principais nomes não só abandonaram o candidato do partido, como embarcaram na campanha de Bolsonaro.

Na falta de uma visão nacional e na incapacidade de perder de cabeça erguida, o PSDB acabou precipitando sua perda de identidade. Isso repercutiu na própria bancada no Parlamento, seduzida por votar com o governo em troca das vantagens que isso proporciona. De certa maneira, é possível dizer que o partido foi colhido por um processo de decadência anterior a Bolsonaro e agravado por ele.

Um dos argumentos da escalada autoritária era a luta contra um sistema corrompido. Sem voltar atrás nas suas pretensões antidemocráticas, Bolsonaro recuperou algumas das práticas que alimentaram sua aventura. O jogo de toma lá dá cá no Parlamento, do qual o chamado orçamento secreto é a principal expressão, mostra que Bolsonaro usa de duas armas simultâneas para atacar o processo democrático. Usa a decadência para defender suas pretensões autoritárias e, ao mesmo tempo, aprofunda o fisiologismo para se manter no governo.

As pesquisas indicam que a decadência da democracia é um fator mais amplo do que se pensa e acredita-se que apenas a minoria da população mundial viva sob um Estado Democrático de Direito.

Os processos que minaram nossa democracia em grande parte foram inspirados no governo Trump (questionamento das eleições, máquinas de fake news), mas uma compreensão maior, certamente, virá do fato de que quando Bolsonaro surgiu em cena já estávamos em condição de grande vulnerabilidade.

No ano que vem faremos eleições presidenciais e para o Congresso. Foram as eleições do período democrático que acabaram enfraquecendo o prestígio do sistema político. Eram fabulosamente caras e acabaram distanciando os partidos dos eleitores comuns.

Um roteiro para reagir ao ritmo declinante pode estar nas próprias eleições, pelo menos em dois aspectos: na apresentação de programas que possam superar a crise econômica e social, mas também em ideias que possam vislumbrar uma nova relação entre governo e Parlamento, sem idealismos, mas tentando corrigir os grandes erros, os que resultam em processos como o mensalão ou o orçamento secreto.

Com o melhor funcionamento do sistema político no conjunto, será possível atenuar o descontentamento e, consequentemente, bloquear o caminho para aventuras redentoras. A democracia nunca esteve tão perto de sucumbir desde o movimento das Diretas Já. O susto vale um esforço de análise e uma vontade de mudança.

 

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A Coligação Semáforo chega ao governo em Berlim

 

A rapidez e relativa eficácia das negociações da coligação tripartida – que certamente se beneficiaram da presente fraqueza da CDU – é um bom augúrio para a estabilidade do próximo governo. Madalena Meyer Resende para o Observador:

O novo governo alemão liderado pelo Social Democrata Olaf Scholz está aí, demonstrando a resiliência do sistema político alemão e a capacidade de integrar a mudança geracional que se manifestou nas eleições de 21 de setembro por uma mudança e modernização da vida pública e da política externa do país. O programa da coligação, apresentado ontem à tarde pelos líderes dos três partidos, os Sociais Democratas (SPD), os Verdes e o Partido Liberal (FDP), tem como objetivo principal modernizar a economia alemã, com especial enfoque no combate às alterações climáticas e na modernização da infra-estrutura digital do país. Também em política externa se prevê uma evolução no papel da Alemanha no mundo.

A continuidade e a mudança

Olaf Scholz confirma a credibilidade que lhe foi atribuída para suceder a Merkel, com os eleitores a reconhecer o seu papel central na resposta Alemã e Europeia à pandemia através de um programa Keynesiano que se afastou da ortodoxia alemã de orçamentos equilibrados. Scholz esteve na linha da frente do governo Merkel como ministro das finanças, e foi responsável pelas decisões que levaram o governo a contrair empréstimos avultados para cobrir os custos económicos da pandemia, e a desenhar o programa Europeu Next Generation EU. Em continuidade com o seu papel de ministro das finanças no governo anterior, Scholz, com os Verdes, prevaleceram contra os liberais nas negociações, assegurando que os futuros orçamentos alemães serão expansionistas. A nota é no investimento que, sendo parcialmente financiado por dívida pública, significará uma mudança em relação à ortodoxia do Szwarze Null.

Significativamente, o maior investimento previsto é em programas de reconversão industriais, nomeadamente para a mudança energética e a reconversão da indústria automóvel no sentido do abandono do motor de combustão. O futuro governo Semáforo quer colocar pelo menos 15 milhões de carros de passageiros totalmente eléctricos nas estradas alemãs até 2030. O anúncio do programa de governo alemão sucede-se à adopção em Washington do maior pacote climático da história dos EUA na passada sexta feira. A legislação americana prevê 555 mil milhões de dólares para programas de redução das emissões de combustíveis fósseis. Em conjunto, estas medidas nas duas maiores potências industriais ocidentais marcam um acelerar significativo, com o apoio do Estado, dos esforços para desacelerar as alterações climáticas.

Em termos de política externa, da nova coligação também se adivinham algumas mudanças.

Embora as relações externas da Alemanha, que têm sido tradicionalmente definidas por interesses comerciais, não devam ser alvo de uma revolução, o novo governo irá provavelmente mudar significativamente a abordagem em relação à China. Com os Ministérios dos Negócios Estrangeiros (Annalena Baerbock) e o da Economia e Ambiente (Robert Habeck) nas suas mãos, os Verdes estarão numa posição forte para a influenciar esta política. Ambos os líderes dos Verdes criticaram a abordagem mercantilista de Merkel. Neste sentido, os Verdes dão voz ao endurecimento da posição em relação à China por parte de vários sectores da economia e da sociedade alemã nos últimos anos. A percepção crescente de que a China se tinha tornado num “rival sistémico” materializou-se até no relatório da Confederação da Industria Alemã de 2019. Contudo, a atitude de Merkel em relação a Pequim manteve-se inalterada até ao fim da sua estadia como chanceler.

A curto prazo, o novo governo terá de tomar decisões sobre o papel da Huawei na rede alemã 5G e sobre como se comportar nos Jogos Olímpicos de Inverno em Pequim de 2022. A médio prazo, está em questão a concepção de uma relação económica com a China que tome em conta a “rivalidade sistémica” – e que implica desde a segurança das cadeias de abastecimento e da exportação de tecnologia, até ao papel das empresas alemãs no mercado chinês.

A rapidez e relativa eficácia das negociações da coligação tripartida – que certamente beneficiaram da presente fraqueza da CDU – é um bom augúrio para a estabilidade do próximo governo. Demonstrou a vontade, pelo menos temporária, dos liberais em contemporizarem com os objetivos conjuntos do SPD e dos Verdes, e usarem o momento pós-pandémico para modernizarem a economia e as relações externas da Alemanha. O sistema alemão emerge assim com um centro político diferente, mas aparentemente eficaz contra a deriva populista que ameaça a Europa.

 

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A ideia de compaixão: iluminismo britânico vs iluminismo francês.

 

Texto da historiadora norte-americana Gertrude Himmelfarb, traduzido Adolfo Rivero Caro para o site Liberalismo.org:

La "política de la compasión" se ha convertido en un término de burla. Cuando los conservadores se lo aplican a los "liberales", sugiere un enfoque sentimental sobre los problemas sociales y, todavía peor, un enfoque estúpido donde los sentimientos predominan sobre la razón, las buenas intenciones sobre los resultados, y "sentirse bien" sobre "hacer bien". Esa crítica es bastante justa pero también muestra una cierta evasión del problema central. Porque si la política de la compasión, tal como se entiende habitualmente, es un fracaso, la compasión misma, como principio de comportamiento, no lo es. En realidad, la compasión es la base de una ética social con un linaje muy honorable. Se retrotrae, por lo menos, hasta el judaísmo y cristianismos antiguos ha llegado hasta nosotros en esa forma híbrida conocida como la tradición judeocristiana. Modernamente, la virtud religiosa de la compasión se ha trasmutado en una virtud secular, y un deber privado se ha convertido en una responsabilidad pública. Esto fue un singular logro de la Ilustración Británica – la Británica, no la Francesa.

Los británicos no tenían philosophes, tenían "filósofos morales". Adam Smith era "Profesor de Filosofía Moral" en la Universidad de Glaslow, como lo había sido Francis Hutcheson antes de él y como lo fue Thomas Reid después. El término también se aplica a los que no tenían ese título académico pero estaban comprometidos en la misma empresa filosófica – principalmente el tercer Earl de Shaftesbury, que tuvo la distinción de ser el padre de la Ilustración Británica. La colección de ensayos de Shaftesbury, incluyendo un famoso ensayo sobre la virtud, apareció en 1711 y tenía 10 ediciones para fin de siglo. El fue quien hizo populares los conceptos claves del discurso filosófico y moral británico de todo el siglo – "virtudes sociales", "afectos sociales", "afectos naturales", "sentido moral", "sentimientos morales", "benevolencia", "simpatía" y "compasión".

Un año después de la muerte de Shafsbury, Bernard Mandeville le rindió un involuntario tributo lanzando el más serio y sistemático ataque contra su filosofía. La Fábula de las Abejas se publicó en 1714, su subtítulo era "Vicios Privados, Beneficios Públicos", y era un manifiesto contra Shafsbury. La sociedad, alega Mandeville, no se basa ni en "las cualidades amistosas y los benévolos afectos" de la naturaleza humana ni en sus facultades de "razón y auto-negación" sino más bien en "lo que llamamos maldad en este mundo moral así como natural". La maldad es "el gran principio que nos hace criaturas sociales, la sólida base de todos los empleos y oficios sin excepción". Con un fino sentido de imparcialidad, Mandeville aplicó esta biliosa concepción de la naturaleza humana a los pobres y ricos por igual. Pero era particularmente pertinente para los pobres porque eran ellos los que mostraban "tan extraordinaria proclividad a la vagancia y el placer" y nunca trabajarían "a no ser que se vieran forzados por una inmediata necesidad".

Una virtud natural

Mandeville hizo un intento animoso pero fútil para abortar la filosofía moral que sería un rasgo característico de la Ilustración Británica, una filosofía en que la compasión, y no el egoísmo y ni siquiera la razón, jugaría el papel fundamental. A diferencia de Locke, que proclamó que "no hay principios prácticos innatos"de moralidad, justicia o fe, los filósofos morales del siglo XVIII insistieron en esos principios. Así donde Locke buscaba en la educación la forma de inculcar a los niños los sentimientos de "humanidad" y "compasión", Shaftsbury arraigaba ese sentimiento en la naturaleza y el instinto más bien que en la razón y la educación. "Ser compasivo" afirmaba, ".Vg., participar en una pasión… Conmiserarse, Vg., participar en la miseria… Esto es bueno y correcto; nada más armonioso, y carecer de esto, o no sentirlo, es artificial, horrible y monstruoso".

Los otros filósofos morales hacían objeciones de detalles, de un tipo o de otro, a las enseñanzas de Shafsbury pero todos estaban de acuerdo en que las "virtudes sociales"se derivaban de un sentido o sentimiento que eran innatos a la naturaleza humana. No negaba la razón, de ninguna manera eran irracionalistas. Pero le daban a la razón un papel secundario, instrumental. Francis Hutcheson, que fue el primero en enunciar el principio de "La mayor felicidad del mayor número", enraizado en un "sentido moral"que "previo a la instrucción"porque es universal a todos los hombres. El obispo Butler hizo dos sermones titulados "Compasión"en los que alegó que la razón por si sola "no es suficiente motivo para la virtud en una criatura como el hombre"; tenía que estar acompañada de la compasión, que es "un llamamiento de la naturaleza para ayudar al infeliz de la misma forma que el hambre es un llamado al alimento". Los "infelices", añadió, incluían a los indigentes y atormentados". Thomas Reid argumentaba que si el hombre sólo hubiera estado dotado de razón, la especie se hubiera extinguido. Afortunadamente, la razón está complementada por "los afectos benévolos"que "no son menos necesarios para la preservación de la especie humana que los apetitos del hambre y la sed". Y Adam Ferguson también consideraba la "humanidad" un rasgo de "la pertenencia a la naturaleza humana" que era "característico de la especie".

Inclusive Hume, que tenía una visión particularmente poco sentimental de la naturaleza humana, creían en un instinto que no ser derivaba de la razón sino de "un gusto moral"o "benevolencia". "Parece que una tendencia al bien común y a la promoción de la paz, la armonía y el orden social nos atraen hacia las virtudes sociales". Y, otra vez, más elocuentemente: "Hay una cierta benevolencia, por pequeña que sea, en nuestro pecho; una chispa de amistad por la especie humana; una partícula de la paloma en todos nosotros, junto con los elementos del lobo y la serpiente ’’.

Si la razón, para estos filósofos morales, no era suficiente explicación para las virtudes sociales, tampoco lo eran el interés personal o el amor propio. A diferencia de Hobbes o Locke, que formularon su filosofía moral sobre la base del interés personal apuntalado por la razón, insistían en que "humanidad" era desinteresada, que se derivaba de un sentimiento por el prójimo más bien que por uno mismo. Hutcheson dijo que no podía ser producto del interés personal porque implicaba asociarse uno mismo con experiencias tan dolorosas como el sufrimiento de los demás. Hume, protestando contra lo que él llamaba "el sistema egoísta de moral" de Hobbes y Locke, declaraba que "la desinteresada benevolencia y no el interés personal" es una cualidad esencial de la naturaleza humana.

Adam Smith hizo de la idea de la compasión el tema central de Teoría de los Sentimientos Morales. El párrafo inicial establece el tono de la obra.

Por egoísta que pueda suponerse al hombre, evidentemente hay algunos principios en su naturaleza que lo interesan en la fortuna de los demás y hace su felicidad necesaria para él, aunque no saque nada de ella salvo el placer de verla. De este tipo de lástima o compasión es la emoción que sentimos hacia la miseria de otros cuando la vemos o imaginamos muy vivamente… Mediante la imaginación nos colocamos en su situación… entramos, por así decirlo, dentro de su cuerpo y nos volvemos en alguna medida una misma persona con él."

El hombre perfectamente virtuoso", proseguía Smith, "no sólo quiere ser amado sino digno de amor… no sólo quiere elogio sino ser digno de elogio… Sentir mucho por los demás y poco por nosotros mismos... restringir nuestro egoísmo y complacer nuestras afecciones benévolas, constituye la perfección de la naturaleza humana". No se puede considerar la simpatía como un principio egoísta porque no surge porque nos imaginemos a nosotros mismos en la condición lamentable del otro sino porque imaginamos a los otros en ella. De esta forma, "un hombre tiene que simpatizar con una mujer que esté dando a luz aunque es imposible que se conciba a si mismo como sufriendo sus dolores en su propia persona".

Una religión social

Cuando los historiadores escriben sobre la Ilustración Británica, están pensando en los filósofos morales. De esta forma o ignoran una de los acontecimientos más memorables de la época, el renacimiento religioso que iniciaran en 1738 John y Charles Wesley, o lo consignan al status de una Anti-Ilustración. Como el eminente victoriano (y agnóstico) Leslie Stephens, tienden a considerarlo como "calor sin luz… una recrudescencia de ideas obsoletas". Con todo, hay buenas razones para situar ese renacimiento en la Ilustración, aunque no en la Ilustración de los filósofos franceses, por supuesto, sino en la de los filósofos morales británicos.

Cualesquiera que sean las diferencias filosóficas, teológicas y temperamentales entre los filósofos morales y los metodistas (el término era habitual en la época), todos tienden a converger en importantes asuntos éticos y prácticos. Si hubo una "racionalización" de la religión por los deístas, hubo una "socialización" de la religión por los metodistas. Aunque los filósofos morales estaban invocando un sentido moral innato como base de su benevolencia, los predicadores metodistas estaban inculcando un evangelio religioso de buenas acciones. "Los pobres son los cristianos’’, proclamaba John Wesley, y procedía a hacer de ellos su misión especial. Sus pobres, por otra parte, no eran sólo los "merecedores" y "respetables" pobres que eran los mejores candidatos para la conversión. El hacía un esfuerzo particular para buscar a "los desterrados", los "olvidados", los "más flagrantes, endurecidos y desesperados de los pecadores". Nadie estaba más allá de la salvación, nadie era demasiado pobre, corrompido o incivilizado como para no poder alcanzar el nivel espiritual y moral merecedor del nombre de cristiano.

Los pobres no eran los únicos objetos de redención espiritual; eran los beneficiarios del mensaje social de Wesley. El cristianismo, declaró, es "esencialmente una religión social". Uno de sus mejores y más repetidos sermones fue sobre el tema, "Gane a todos los que pueda… salve a todos los que pueda… dé todo lo que pueda". Los metodistas distribuyeron alimentos, ropas y dinero a los necesitados, hicieron "visitas" a los enfermos y a los presos en las cárceles, establecieron fondos de préstamos y trabajaron en proyectos para los desempleados, fundaron hospitales, orfelinatos, sociedades de amistad, escuelas, bibliotecas y otras empresas filantrópicas, y jugaron un papel destacado en los movimientos a favor de las reformas de las prisiones y de la abolición del tráfico de esclavos. Wesley mismo era un apasionado del tema de la esclavitud: "esa execrable villanía". "Un africano", escribió, no era "en ningún sentido inferior al europeo". Si lo parecía, era porque los europeos lo habían dejado en situación de inferioridad, despojándolo de "todas las oportunidades de mejorar en conocimiento o en virtud".

Quizás más notables fueron los esfuerzos de los metodistas para educar a las clases inferiores: educación en gran medida dedicada a leer la Biblia y folletos religiosos pero que frecuentemente iba más allá, como se desprende de sus publicaciones: un diccionario barato, una breve gramática inglesa, una serie de folletos (muchos escritos por el mismo Wesley) sobre medicina, electricidad, historia natural y temas por el estilo, así como síntesis (algunas editadas, sin duda) de Shakespeare, Milton, Spenser, Locke y otros clásicos.

En la comunión metodista, los pobres tenían la satisfacción de ser miembros apreciados. Había pocas distinciones sociales entre ellos, los predicadores laicos no tenían calificaciones particulares ni educacionales, ni sociales y ni siquiera sexuales, la mujeres predicadoras tenían el mismo status que los hombres. Los miembros se reunían una vez a la semana en pequeños grupos conocidos como "clases", y en grupos más grandes llamados "familias". El historiador Bernard Semmel ha descrito este aspecto comunal del metodismo como el equivalente del ideal francés de la fraternidad. "En el siglo del sauve qui peut de Voltaire y del laissez faire de Smith, cuando se estaba resquebrajando el paternalismo de la sociedad jerárquica tradicional, el metodismo trató de darle a las clases bajas un sentido de su propio valor, y revivir la religión tradicional como fuente de calor y entretenimiento, de confort y alegría".

Esta ética era más efectiva porque no sólo era una ética social sino también individualista. Derivada de una poderosa fe en la relación del individuo con Dios, promovía un sentido de responsabilidad moral personal similar a la ética puritana, alentando las virtudes de ahorro, diligencia, temperancia, honestidad y trabajo duro. La "auto-ayuda" estaba en una relación natural con la ayuda a los demás. La ética tenía la distinción adicional de traspasar las barreras de clase y religión. Para fines del siglo, la doctrina de Wesley había generado un evangelismo dentro de la Iglesia de Inglaterra que atraía en gran medida a las clases medias y altas, mientras que las sectas metodistas que dejaban la iglesia atraían a los trabajadores y a la baja clase media.

La nueva economía política

La filosofía moral y el evangelio religioso adquirieron un poderoso aliado en la nueva economía política. Adam Smith, que combinaba los papeles de filósofo moral y economista, eran tan conocido en su época por La Teoría de los Sentimientos Morales como por La Riqueza de las Naciones. Se acostumbraba pensar que los dos Smith eran incongruentes, los alemanes lo llamaban "Das Adam Smith Problem". Recientes estudios académicos han resuelto el problema: ahora los dos Smith están firmemente unidos. El economista Joseph Schumpeter se quejaba de que Smith estaba tan poco educado en la tradición de la filosofía moral, derivada del escolasticismo y la ley natural, que no podía concebir una economía per se, una economía divorciada de la ética y la política. Es una buena observación aunque no necesariamente una crítica. La Riqueza de las Naciones es, en si misma, un ejercicio en filosofía moral, como es evidente de su retórica: la denuncia del "clamor y sofismas", "los impertinentes celos", "la mezquina rapacidad", "los mezquinos y malignos expedientes", "los interesados sofismas" y las "interesadas falsedades" de esos comerciantes y fabricantes que adoptaron "la vil máxima de ‘todo para ellos y nada para los demás"’, y que promovieron sus propios intereses a expensas de "los pobres y los indigentes".

Estos sentimientos pueden parecer difíciles de reconciliar con la famosa frase: "No esperamos nuestra cena de la benevolencia del carnicero o del panadero sino de la preocupación por sus propios intereses". Pero este principio fue enunciado en si mismo sobre la suposición de que el carnicero y el panadero respetaban las leyes del libre mercado y no "conspiraban", "engañaban" u "oprimían". Bajo estas condiciones, el interés personal era el principio moral más efectivo para poder satisfacer los intereses de todos. No tan elevado como el altruismo pero, en el mercado particularmente, más confiable y efectivo.

El "interés general" de Smith no era el Rosseau o el de Hegel. El de ellos trascendía la suma de los intereses individuales; el de Smith era simplemente el total de los intereses de todos los miembros de la sociedad, incluyendo a los trabajadores. Esto fue quizás el aspecto más novedoso de La Riqueza de las Naciones. El título no se refería a la nación, como la entendían los mercantilistas –el estado-nación cuya riqueza medía su poderío en relación con los otros estados- sino la gente que integraba la nación. Eran sus intereses, su riqueza la que sería promovida por una economía política que traería "una universal opulencia que llega hasta los niveles más bajos del pueblo’’.

"Sirvientes, jornaleros y obreros de los distintos tipos constituyen la gran mayoría de cada gran sociedad… Ninguna sociedad puede florecer y ser feliz cuando la mayoría de sus miembros es pobre y miserable. Por otra parte, es una cuestión de equidad que los que alimentan, visten y albergan a toda la población deban tener una parte del producto de su propio trabajo como para que ellos también puedan estar razonablemente bien alimentados, vestidos y alojados".

Al desafiar los convencionalismos de su época, Smith veía con optimismo los altos salarios porque veía con optimismo a lo trabajadores pobres. "Donde los salarios son altos, siempre encontraremos trabajadores más activos, diligentes y efectivos que donde son bajos". En el mismo espíritu, apoyaba los impuestos proporcionales, y los impuestos en los lujos más bien que en los productos de primera necesidad para que "la indolencia y la vanidad de los ricos contribuya con facilidad al alivio de los pobres". No tenía objeciones a las leyes de pobres. A lo que se oponía, y vigorosamente, era el establecimiento de requerimientos de residencia para los pobres, lo que limitaba sus oportunidades para mejorar y los despojaba de la "libertad natural" de que disfrutaba la mayoría de los otros ingleses. Más significativo, debido a que parecía ir contra el principio del laissez faire, era su proposición de un sistema educativo administrado y financiado por el estado para "el común del pueblo", incluyendo a los "criados para las ocupaciones más bajas".

En 1776, cuando se publicó La Riqueza de las Naciones, estas eran posiciones fuertes aunque heterodoxas. No se demoró mucho, sin embargo, antes de que el libro se convirtiera en un clásico de su época. La primera edición (un formidable trabajo en dos volúmenes de más de mil páginas) se vendió en seis meses, una segunda edición, se publicó dos años más tarde seguida de tres otras en los doce años antes de la muerte del autor. Hume se declaró su discípulo inmediatamente y otros como Edmund Burke, Thomas Paine, Edward Gibbon, Richard Price, William Pitt y Lord North.

El nuevo humanitarismo

Estas corrientes de pensamiento interrelacionadas –la filosofía moral de la compasión, el evangelio de buenas acciones de Wesley y la economía política de la libertad natural- se combinaron para crear lo que la escritora evangélica Hannth More llamó (no totalmente como elogio) "la Edad de la Benevolencia", y que un historiador posterior describió como "el nuevo humanismo". Anteriormente en el siglo, Mandeville se había quejado de que las escuelas caritativas inspiradas por el "afecto" de Shafsbury por la sociedad, y por la "propensión a buscar el bienestar de la misma". Quince años después, iba a tener mucho más de que quejarse. Una Historia de Londres publicada en 1739 informa detalladamente sobre las escuelas, hospitales y sociedades caritativas que estaban floreciendo en las metrópolis. "De la misma forma en que opulencia y la riqueza", escribía el autor, "son el resultado del comercio, también lo son la hospitalidad, la ilustración y la caridad". Para 1756, cuando apareció la segunda edición, esta sección del libro tuvo que ser sumamente ampliada para acomodar las numerosas nuevas sociedades establecidas en el ínterin. Samuel Johnson comentó: "Todas las manos están abiertas para contribuir algo, todas las lenguas ocupadas en pedir algo y, durante algún tiempo, se emplea todo arte del placer en interés de la virtud". Hacia fines del siglo (y el fin de su vida), John Wesley observaba que aunque "la lujuria y la profanidad" habían lamentablemente aumentado, también lo habían hecho "la benevolencia y la compasión hacia todas las formas del dolor humano… de una manera desconocida anteriormente, desde la más remota antigüedad".

Si la "benevolencia" y la "compasión" eran palabras claves de la época, también lo eran "filantropía" y "filántropo". Este último término se aplicaba a los caballeros –John Howard, Jonas Hanway, Thomas Gilbert y otros- que hicieron de la filantropía una profesión voluntaria a tiempo completo. Hubo sociedades para todo tipo de propósito meritorio: para "Promover el Conocimiento Cristiano" (por medio de las escuelas caritativas, entre otros), por "Mejorar la Condición y Aumentar las Comodidades de los Pobres", para la abolición del comercio de esclavos, para el cuidado de los huérfanos abandonados, los marineros enfermos y lisiados, los huérfanos de los clérigos, las prostitutas, los ciegos, los sordos y los mudos. Y hubo abundantes proposiciones de reforma: del sistema legal, de las leyes de pobres, de los hospitales, prisiones y casas de trabajo. Personas que inclusive veían esos esfuerzos con escepticismo encontraban alguna causa digna de su simpatía. Defoe escribió un folleto defendiendo la fundación de hospitales; Mandeville aprobó la ayuda a los viejos y enfermos y Hannah More era una entusiasta partidaria de las escuelas dominicales.

El mismo movimiento de las escuelas dominicales fue significativo tanto como fenómeno social como religioso o educativo. Se inició en 1785 como una empresa conjunta de anglicanos y disidentes. Las escuelas tenían, para fin de siglo, una matrícula de más de 20,000. Algunos historiadores han subrayado la insistencia de Hannah More y otros en que la instrucción tenía que limitarse a la lectura, especialmente de la Biblia, siguiendo la teoría de que escribir alentaría a los muchachos a "querer subir por encima de su estación". En realidad, muchas de las escuelas también enseñaban escritura y aritmética, como se comprueba de los gastos en libros de deletreo, pizarras, lápices y pupitres. Las escuelas también tuvieron el efecto de estimular el mismo tipo de espíritu comunal que generó el metodismo. Las salidas a la escuela, a los tés y a los clubes se convirtieron, como dijo el principal historiador del movimiento, en "un rasgo central de la vida comunitaria de la clase obrera", particularmente porque era frecuente que los maestros fueran antiguos alumnos y padres.

Era el mismo espíritu comunal y el espíritu de auto-ayuda lo que los pobres se estaban dando a si mismos al subscribirse a las "sociedades de amistad", una forma de seguro para ayudarlos en tiempos de necesidades. Para 1801 había más de 7,000 de esas sociedades con más de 300,000 varones adultos como miembros, de una población total de 9 millones. Y hay que recordar que todo esto era además del auxilio a los pobres. Inglaterra fue el primer país (y durante mucho tiempo el único) en tener un sistema de auxilio a los pobres público, secular y nacional (aunque estuviera administrado localmente). Hacia fines del siglo XVIII, ese sistema se había ampliado mucho con la adopción de algo así como un estipendio familiar para los trabajadores pobres al igual que para los indigentes. No fue un radical sino Samuel Johnson, un tory, quien dijo: "Una decente provisión para el pobre es la verdadera prueba de la civilización… ’’

Fue esta ética social, un compuesto de lo secular y lo religioso, lo público y lo privado, lo que fue en gran medida responsable por lo que el historiador francés Elie Halévy llamó "el milagro de la Inglaterra moderna", el hecho de que Inglaterra fuera capaz de sobrevivir la revolución económica sin sucumbir a las revoluciones políticas que devastaron al continente. Antes de escribir la historia en la que desarrolló esa teoría, escribió dos artículos poco conocidos titulados "El Nacimiento del Metodismo en Inglaterra". Fue allí donde reflexionó sobre la convergencia del pensamiento secular y religioso que iba a ser decisivo en este período crítico de la historia de Inglaterra. Medio siglo después del nacimiento del metodismo, escribió, "librepensadores asociados con los filántropos del movimiento evangélico trabajarían por el mejoramiento material y moral de los pobres. En el intervalo, fueron ‘convertidos’ a la filantropía gracias a la influencia de los predicadores metodistas".

La ilustración francesa

Esta fue la Ilustración como la vivieron los británicos. Pero no es la Ilustración que generalmente se asocia con el término. La "Ilustración" se identifica con la Ilustración Francesa, un movimiento que incluye a pensadores que discrepaban entre sí pero que discrepaban todavía más (con la excepción de Montesquieu) con sus contrapartidas británicas. Es notable que las dos Ilustraciones fueran tan diferentes, tanto en sustancia como en temperamento, teniendo en cuenta el gran nivel de interacción entre ambas. Las principales figuras en ambos países se conocían y se visitaban entre sí, se leían, revisaban y hasta se traducían entre sí. Y respetuosa pero firmemente discrepaban entre sí tanto en filosofía como en sensibilidad y en política social.

Tocqueville atribuyó sus diferencias a los distintos papeles asumidos por los intelectuales en cada país.

En Inglaterra los que escriben sobre la teoría del gobierno y los que realmente gobiernas cooperan entre si, los primeros planteando sus nuevas teorías y los segundos enmendando o circunscribiendo las mismas a la luz de la experiencia práctica. En Francia, por el contrario, la teoría y la práctica se mantenían muy distintas y permanecían en las manos de dos grupos muy independientes. Uno de estos se encargaba de la administración real mientras que el otro establecía los principios abstractos que debían regir, según decían, a un buen gobierno; uno tomaba las medidas rutinarias adecuadas a las necesidades de cada momento, el otro establecía leyes generales sin pensar nunca en su aplicación práctica; un grupo conformaba el curso de los asuntos públicos, el otro el de la opinión pública.

Había otras poderosas razones para las disparidades entre las Ilustraciones Francesa y Británica; el muy diferente sistema político y social en los dos países, la diferente relación de la monarquía con la aristocracia y de la aristocracia con la clase media, el diferente papel de la iglesia en el estado, y la diferente naturaleza de la misma iglesia. Pero no menos importantes eran las diferencias filosóficas que subyacían en la observación de Tocqueville. Donde la idea británica de la compasión se prestaba a una variedad de políticas prácticas de mejoramiento para aliviar problemas sociales, el llamamiento francés a la razón no podía ser satisfecho con nada que no fuera la "regeneración" del hombre.

Es curioso que los franceses no sólo hayan reclamado el término "Ilustración" sino también el de "compasión". Y, sin embargo, fueron los ingleses los que introdujeron la palabra y la idea mucho antes que los franceses y los que la convirtieron en el tema central de su filosofía moral. En la Enciclopedia, "compasión" sólo tiene una breve entrada que concluye con la observación de que mientras más miserable es uno, más susceptible a la compasión, lo que explica el gusto popular por presenciar ejecuciones. Rosseau, al que generalmente se le acredita la idea de la compasión, hablaba con mayor frecuencia de "piedad" y le dio un papel ambiguo en la sociedad. En el Discurso Sobre los Orígenes de la Desigualdad, la piedad sólo aparece como un "sentimiento natural" en el estado de naturaleza, donde contribuye a la preservación de la especie al moderar la fuerza del amor por uno mismo (amour de soi meme). En la sociedad civil, sin embargo, la piedad es reemplazada por el sentimiento "faccioso" de la vanidad (amour propre), que destruye tanto la igualdad como la libertad, sometiendo a la humanidad al "trabajo, la servidumbre y la miseria". Al revisar los Discursos, Adam Smith criticó a Rosseau por compartir el punto de vista de Mandeville de que "en el hombre no hay ningún poderoso instinto que necesariamente lo determine a buscar la sociedad por si misma", y que la sociedad misma es un instrumento de "los astutos y los poderosos" que quieren mantener su superioridad sobre los débiles.

El Emilio de Rosseau plantea un "sentimiento interno" no como la base de la compasión sino como base del amor por uno mismo y por la justicia. "Cuando la fuerza de un alma expansiva me hace identificarme con mi prójimo, y yo siento como si estuviera, por así decirlo, en él, es para no sufrir para lo que yo quiero que él no sufra. Yo estoy interesado en él por amor a mi mismo… El amor de los hombres derivado del amor a uno mismo es el principio de la justicia humana". Las virtudes sociales no le vienen naturalmente a Emilio; él tiene que aprenderlas mediante la participación en la suerte de los que son menos afortunados. Pero él también tiene que aprender que "su primer deber es hacia si mismo". Y se le instruye para que ejercite las virtudes sociales no en relación a individuos particulares sino a la "especie", "el conjunto de la humanidad". Se le dice que no importa quien consigue "una mayor proporción de felicidad" todo lo que importa es que contribuye a "la mayor felicidad de todos". "Este es el primer interés del sabio después de su interés personal, porque cada uno es parte de su especie y no de otro individuo".

Por consiguiente, para evitar que la piedad degenere en debilidad tiene que generalizarse y extenderse al conjunto de la humanidad. Entonces uno cede a ella sólo en la medida en que está acorde con la justicia, porque de todas las virtudes la justicia es una de las que más contribuye al bien común de los hombres. Por la razón, por el amor a nosotros mismos, tenemos que tener piedad de nuestra especie todavía más que de nuestro vecino.

Cualesquiera que hayan sido las diferencias de Rosseau con los otros philosophes (y eran muchas), todos tenían en común la tendencia a "generalizar" las virtudes, a elevar "el conjunto de la humanidad" por sobre lo "individual", la "especie" por sobre el "vecino". Cuando Francis Hutcheson habló de "la mayor felicidad del mayor número", significaba esto en el sentido más prosaico y cuantitativo; cuando Rosseau hablaba de "la mayor felicidad de todos", lo quería decir en cierto sentido trascendente, metafísico, un "bien común de los hombres" que era al distinto del bien de los hombres individuales.

Por otra parte, el "bien común de los hombres" no necesariamente significaba el bien del hombre común. En Emilio, el gran trabajo de Rosseau sobre la educación, no figura el hombre común. El mismo Emilio es "de noble cuna", y es un tutor privado el que emprende su educación. "El hombre pobre", escribió Rosseau, "no necesita ser educado. Su situación le da una educación obligatoria. No puede tener otra". El mismo mensaje aparece en Julie, o la Nouvelle Heloise: "No instruyan al niño del pueblo; no es adecuado que se le instruya; no instruyan a los hijos de los habitantes de la ciudad, porque todavía no se sabe qué instrucción es adecuada para ellos".

El pueblo común

Ni los más simpatizantes comentaristas de la Ilustración Francesa pueden dejar de observar el desdén que les philosophes sentían por las masas. Voltaire usaba los términos "le peuple" y "la canaille" (la chusma) como si fueran intercambiables. "En cuanto a la chusma", le dijo a d’Alembert, "No me preocupa; siempre va a seguir siendo chusma". E iba a permanecer canaille porque era ineducable. La gente nunca tendría "ni el tiempo ni la capacidad para educarse a si misma; morirían de hambre antes de convertirse en filósofos…. Nunca hemos pretendido ilustrar a los zapateros y los sirvientes; esa es la labor de los apóstoles".

La gente no podía ser educada porque no podía ser ilustrada; y no podía ser ilustrada porque era incapaz del tipo de razón que los philosophes entendían era la esencia de la Ilustración: estaban demasiado hundidos en el pantano de los prejuicios, las supersticiones y las irracionalidades de la religión. Este era el gran enemigo: l’infame. La Religión, le escribió Voltaire a Diderot, "tiene que ser destruida entre la gente respetable y dejada a la canaille… para la que fue hecha". Diderot estuvo de acuerdo. Los pobres eran "imbéciles" en materia de religión, "demasiado idiotas –bestiales- demasiados miserables y demasiado ocupados" para ilustrarse a si mismos. Nunca cambiarían: "La cantidad de la canaille siempre es más o menos la misma".

La Enciclopedia reflejaba este desdén por los no ilustrados. En el artículo de Diderot que definía el propósito de la Enciclopedia, éste dejó claro que el pueblo común no tenía cabida en "edad filosófica" que su empresa inauguraba. "La masa general de la humanidad no puede ni seguir ni comprender esta marcha del espíritu humano". "Tenemos que razonar sobre todas las cosas," escribió en otro artículo, "porque el hombre no es sólo un animal sino un animal que razona;… cualquiera que rehúse la búsqueda de la verdad renuncia a la naturaleza misma del hombre y debería ser tratado por el resto de su especie como una bestia salvaje; y una vez que se ha descubierto la verdad, cualquiera que rehúse aceptarla está loco o es moralmente malvado". Y todavía en otro artículo explicaba que uno tiene que desconfiar del juicio de la "multitud" en asuntos de razones y filosofía porque "su voz es la de la maldad, la estupidez, la inhumanidad, la sinrazón y el prejuicio". "La multitud", concluye, es "ignorante y está idiotizada".

La Enciclopedia apreciaba mucho "las artes mecánicas", y sus páginas contienen copiosos dibujos, diagramas y grabaciones que las ilustran. Y profesaba un gran respeto por los artesanos que practicaban estas artes. También objetaba las desigualdades de riqueza que mantenían a algunas personas en un excesivo lujo mientras que otras vivían desprovistas de las necesidades más elementales. Pero tenía poca paciencia y menos consideración por la gran masa del pueblo que no era artesana, que no estaba educada ni eran educable, y en sus páginas hay pocas proposiciones prácticas para aliviar su condición. Turgot fue el raro filósofo que también era un reformista, en su breve periodo como Contralor-General de finanzas, abolió el trabajo obligatorio en los caminos. Pero era todavía más hostil a la caridad, no sólo porque era administrada por la Iglesia sino porque deploraba sus efectos prácticos. "Los pobres", escribió en la Enciclopedia, "tienen incuestionables derechos sobre la abundancia de los ricos"; es un deber, prescripto tanto por la humanidad como por la religión, aliviar la suerte de esos infortunados, y la función de las fundaciones caritativas es hacerlo. Los resultados, sin embargo, habían sido infortunados, porque los países donde más abundaba la caridad eran también donde había más miseria. La razón era simple: "Permitir que muchos hombres vivan gratuitamente es alentar la pereza y todos los desórdenes que le siguen; es volver preferible la condición del vago a la de trabajador… La raza de ciudadanos industriosos es reemplazada por una población compuesta de mendigos vagabundos libres para cometer todo tipo de delitos". En otro artículo, Diderot refleja estos sentimientos criticando las casas de pobres como refugios de mendigos profesionales. Esta caridad mal concebida produjo masas de "jóvenes y vigorosos vagos" que preferían recibir su sustento gratis antes que trabajando. Eran la gusanera producida por un estado que no valoraba los verdaderos hombres.

Algo parecido a este argumento, expresado con mayor benevolencia, fue expresado en Inglaterra hacia fines de siglo por Malthus y otros que propusieron (sin éxito) la abolición de las leyes de pobres. Pero estaban criticando un sistema de asistencia pública en constante expansión, que no existía en Francia; y eran tolerantes de las caridades privadas, que eran mucho más numerosas en Inglaterra que en Francia.

Para hacer un nuevo pueblo

No le echo la culpa a la Ilustración por los hechos, o las atrocidades, de la Revolución Francesa. Con todo, no hay dudas de que algunos de los principios y actitudes de la Ilustración Francesa fueron trasladados a la Revolución: el anticlericalismo, por ejemplo, que resultó en la emancipación de los protestantes y los judíos y la legalización del matrimonio civil y el divorcio. En forma similar, la indiferencia (o algo peor) de les philosophes hacia los pobres está reflejada en el hecho de que, aparte de la abolición de los privilegios feudales, se hizo muy poco por aliviar la condición de los pobres, y las medidas que se intentaron fueron notablemente ineficaces. Los talleres de trabajo establecidos por el Comité de Mendicité demostraron ser tan torpe que hubo que suspenderlo, y las leyes que regulaban los precios, los salarios y la producción de alimentos no sólo fueron ineficaces sino contraproducentes. La mayoría de los historiadores está de acuerdo en que los pobres, desprovistos de las caridades religiosas, estaban peor al final de la Revolución que al principio.

Si así fue con la pobreza, así fue con la educación. También aquí la situación se vio exacerbada, se abolieron las viejas escuelas administradas por la Iglesia sin que hubiera nada para sustituirlas. En 1791, Condorcet redactó un informe sobre la educación pública a la Asamblea recomendando, entre otras cosas, escuelas en los pueblos para los niños entre 9 y 13 años. Quizás debido al estallido de la guerra al año siguiente, su discusión fue pospuesta así que durante los tres primeros años de la Revolución el tema de la educación no se planteó nunca. En 1793, Robespierre presentó un plan de educación obligatoria, en escuelas internas donde los niños estuvieran protegidos de la insidiosa influencia de sus reaccionarios padres. Aunque fue aprobado por la Convención, sus provisiones principales se eliminaron. El Directorio vino a promulgar un código educacional para una mínima educación primaria, a ser pagada por los padres, sólo después del Termidor.

No ha sido un historiador sino un filósofo moderno el que ha hecho de la Revolución francesa una revolución social, con una ética social y una agenda consciente y francamente revolucionaria. Para Hannah Arendt, la Revolución "nació de la compasión" por "las clases bajas", les miserables. Esto "pasión de compasión", originalmente articulada por Rosseau y puesto en práctica por su discípulo Robespierre, inevitablemente culminó en el Terror, porque esa pasión respondía sólo a "la necesidad, las urgentes necesidades del pueblo", sin dejar espació para la ley o el gobierno, para la libertad y ni siquiera la razón. De esta forma los Derechos del Hombre tenían que ceder antes los Derechos de los Sans-Culottes, y el "despotismo de la libertad" al "bienestar del pueblo".

Esta una lectura conmovedora pero fantasiosa de la historia. La Revolución no fue una revolución social, y el Terror no se instituyó para el bienestar del pueblo sino para "la seguridad pública", la seguridad del régimen. La República de la virtud no celebraba la virtud de la compasión sino de la razón: una razón elevada y abstracta que denigraba la razón práctica de la gente ordinaria. Su profesión de igualdad era igualmente abstracta, no le confería ninguna igualdad real al populacho. "Le peuple", en cuyo nombre Robespierre estableció la República, no era el pueblo en ningún sentido ordinario, y todavía menos les miserables, sino un "pueblo" abstracto, singular, representado por una singular y abstracta "voluntad general". Robespierre pudiera haber estado citando a Rosseau cuando dijo, "El pueblo siempre vale más que los individuos… El pueblo es sublime pero los individuos son débiles".

Este "pueblo" no requería tanto educación como se entiende habitualmente (leer y escribir), ni siquiera reforma en el sentido usual (el alivio de abusos y quejas) sino nada menos que una "regeneración". Fue en nombre de la regeneración que Robespierre defendió su proposición de las escuelas internas. "Estoy convencido de la necesidad de promover una completa regeneración y, si me permiten decirlo, de crear un nuevo pueblo". Esta idea de "regeneración", observa la historiadora Mona Ozouf, era un concepto clave del discurso revolucionario. Significaba nada menos que la creación de "un nuevo pueblo", un concepto invocado frecuentemente pero por nadie con más fervor que por Rosseau, que es "una de las razones por que la Revolución fue toda él desde el principio".

Razón versus Compasión

En Gran Bretaña, donde la "pasión por la compasión" (en la memorable frase de Hanna Arendt) surgió por primera vez, tomó la forma no de una regeneración sino de un mejoramiento. Las instituciones religiosas y seculares, la sociedad civil y el estado, la asistencia pública y las caridades privadas cooperaban y se complementaban entre si. Sobre todo, no había Kulturkampf, no había guerra religiosa que dividiera y distrajera al país poniendo al pasado frente al futuro, creando un abismo entre la razón y la religión y haciendo rehén de la pasión antirreligiosa a la reforma social. Uno pudiera decir que la Ilustración Británica fue compatible con un gran espectro de creencias y escepticismos (de la misma forma que la doctrina de Wesley fue compatible con el Anglicanismo y la Disidencia). Un libro sobre la Ilustración Británica nunca pudiera tener el subtítulo que Peter Gay le dio al primer volumen de su trabajo sobre la Ilustración: El Surgimiento del Paganismo Moderno. Hasta Hume, escéptico en materias de fe y temeroso del fanatismo religioso, fue un firme defensor de la iglesia establecida, aunque sólo fuera como un correctivo al fanatismo. Y Gibbon, en contra de la opinión popular, no era hostil al cristianismo como tal; era un protestante preocupado por lo que era la perversión de la fe original de los evangelios que criticaba en la iglesia de la antigüedad. No estaba de acuerdo, escribió en sus memorias, con el "fanatismo intolerante" de los philosophes: "Se reían del escepticismo de Hume, predicaban el ateismo con celo de dogmáticos y cubrían de desprecio y ridículo a todos los creyentes".

Puede que éste sea el mayor contraste entre las dos Ilustraciones. Como no hubo Reforma en Francia, tampoco hubo el equivalente del metodismo, no hubo renacimiento religioso que animara a la iglesia establecida o le diera una alternativa religiosa y de aquí que no hubiera oportunidad de reclutar a la religión para causas humanitarias. Pero no sólo fue la identificación de la monarquía absolutista con la Iglesia Católica lo que volvió a les philosophes tan furiosamente hostiles al catolicismo en particular y a la religión en general. También fue su reverencia por la razón lo que los hizo antagonistas de todo lo que pareciera religión. No tenían simpatía por les miserables porque no tenían respeto por quienes estaban tan poco ilustrados que eran religiosos. Padecer de falta de razón era ser deficiente como ser humano. Esta fue la expresión última del racionalismo tal como lo entendían les philosophes: un rechazo no sólo de la religión institucional, no sólo de la religión per se, sino de la concepción religiosa del hombre: de que el hombre es totalmente humano simplemente porque ha nacido a imagen y semejanza de Dios.

En este sentido, los británicos, hasta los más seculares de ellos y hasta los menos democráticos de ellos, eran más igualitarios que los franceses. No estaban listos a admitir a las clases bajas en la vida política pero no negaban su esencial humanidad. En Francia, explica Peter Gay, la campaña para eliminar la tortura, para abolir los jesuitas o para divulgar el conocimiento tecnológico era parte de "la lucha por imponer la voluntad racional del hombre sobre el medio ambiente". El motivo de la reforma es muy diferente en Inglaterra. Allí la campaña por la reforma de las prisiones, la abolición del tráfico de esclavos o la promoción de la educación estaba motivada no por la "voluntad racional" sino un afán humanitario, por la compasión y no por la razón.

Tocqueville estaba hablando de los revolucionarios franceses -pero hubiera podido estar hablando de los philosophes- cuando dijo que "su característica más destacada" era la pérdida de la fe. Esta pérdida de la fe trastornaba su "equilibrio mental". El ideal de la perfectibilidad humana llenaba rápida su vacío espiritual. "Tienen una fe fanática en su vocación: la de transformar el sistema social, de abajo a arriba, y regenerar a toda la raza humana", Adoraban el intelecto humano y tenían una suprema confianza en su poder para transformar leyes, instituciones y costumbres. Pero el intelecto que adoraban sólo era el de ellos. "Podría mencionar varios" observaba Tocqueville irónicamente, "que despreciaban al pueblo casi tan apasionadamente como a Dios". Esto era muy diferente, añadió, del respeto que los ingleses y los americanos mostraban por las opiniones de la mayoría de sus compatriotas. "Su intelecto era orgulloso e independiente pero nunca insolente; y ha llevado a la libertad, mientras que el nuestro no ha hecho más que inventar nuevas formas de servidumbres".

Tocqueville no mencionó a Adam Smith pero éste era un perfecto ejemplar del inglés que estaba describiendo, y una perfecta negación de los philosophes. Para Smith, los atributos que definen la naturaleza humana no eran tanto la razón y el intelecto como los intereses y las pasiones, los sentimientos y las simpatías. Estas eran cualidades compartidas por personas de todas las clases, hasta por los más pobres y menos educados. Eran cualidades modestas, tan modestas como "como la propensión a intercambiar, trocar y comerciar". Pero eran suficientes para conseguir el bienestar de los individuos así como el de la sociedad. No hacía falta ningún déspota ilustrado, ni siquiera un legislador o filósofo ilustrado, para activar estas cualidades o para armonizarlas para el bien común.

Ni tampoco, según Smith, tenía el filósofo ninguna innata superioridad sobre el hombre común. En realidad, la distinción entre el filósofo y el jornalero era más un producto de la educación (como diríamos ahora) que de la naturaleza. "La diferencia entre los caracteres más dispares, entre un filósofo y un portero, por ejemplo, parecen derivarse no tanto de la herencia como del hábito, la costumbre y la educación… Entre un filósofo y un portero no hay, ni en talento ni en disposición, la mitad de diferencia que existe entre un mastín y un galgo". Uno no puede imaginarse a Voltaire o Diderot (o inclusive Rosseau) comparándose con un portero. Hizo falta uno de los filósofos más ilustres de Gran Bretaña para hacerlo.

En esas pocas oraciones, Smith sintetizaba el contraste entre las dos Ilustraciones. Smith no negaba la "diferencia de talentos" (como él decía); por el contrario, insistía en ella. Era esa diferencia la que afloraba y florecía en una sociedad comprometida con la "libertad natural". Semejante sociedad respetaba, al mismo tiempo, la libertad de los seres humanos a ser diferentes y la esencial igualdad de la naturaleza humana. Los philosophes, por el contrario, comprometidos con el principio de la razón, una razón que no era accesible a todas las personas, carecían de justificación para una sociedad liberal, y mucho menos para una democrática.

Actualidad de las dos Ilustraciones

Las dos Ilustraciones no fueron una fase pasajera de la historia. Si todavía discutimos su carácter, no es sólo como un ejercicio en la historia intelectual del siglo XVIII (aunque esto fuera razón suficiente), sino como un pronóstico de la historia social de épocas posteriores. Se puede ver el espíritu de la Ilustración Francesa, por ejemplo, en el comunismo, que aspiraba a la "regeneración" del hombre y la creación de un "hombre nuevo" liberado de las viejas tradiciones y restricciones; o en el socialismo, que busca "el bien común" en una sociedad y en una economía que trascienda el bien y la voluntad de los individuos; o en estado del welfare, con su tendencia a la ingeniería social, que bien pudiera describirse como "la lucha por imponer al medio ambiente la voluntad racional del hombre"; o en la moderna disposición hacia política sociales "libre de valores" inspiradas por una ética social ostensiblemente "libre de valores", que recuerda la Razón, tan valorado por los philosophes.

En los últimos años, hemos estado presenciando –en Estados Unidos, si no en Gran Bretaña- algo así como un alejamiento de la Ilustración Francesa y un acercamiento hacia la Británica. Es curioso encontrar pensadores sociales y políticos recapitulando, involuntariamente, los elementos esenciales de la Ilustración Británica: la idea de la compasión que estaba en el centro mismo de su filosofía moral; la economía política que hizo de la libertad natural un principio moral y no sólo económico; y el movimiento evangélico que jugó un papel tan grande en el espíritu filantrópico y humanitario de la época. Fue una impresionante, impredecible y quizás no completamente compatible, conjunción de fuerzas las que conformaron la Ilustración Británica. Y no es menos impresionante, impredecible y algo incompatible la conjunción de fuerzas que está definiendo –o redefiniendo- la ética social de hoy.

 

BLOG  ORLANDO  TAMBOSI

DIVAGAÇÕES A RESPEITO DOS JOVENS

 

 

Gustavo Corção

 

        Modéstia à parte, tenho sido ultimamente entrevistado, mas permanece inevitavelmente a mesma indagação fundamental: o que penso eu da juventude. Ora, devo confessar que não penso absolutamente nada da juventude. Por mais que me esforce e que esmiúce a pergunta, por mais que analise os conceitos envolvidos no inquérito, só consigo pensar que a juventude é a juventude. Que outro juízo esperam os colegas de mim? Não consigo, sinceramente, descobrir nenhum predicado que convenha a todos os jovens, a não ser a própria juventude. O jovem é jovem, eis aí o pensamento profundo atual, avançado, audacioso, que ofereço a todos os jornais e revistas. E desde já lanço o repto: a quem me provar que o jovem não é jovem entregarei minha casa e meus livros.

Outro dia, entretanto, ouvi alguém dizer, aliás pela milésima vez, que o “jovem é autêntico”, e que o jovem, pelo fato de ser jovem, sofre a pressão ou a colisão das inautenticidades dos velhos. O que quererá dizer isto? Receio que o pressuposto de tal afirmação, se algum existe, é o de só existir, em toda a vida humana, uma estreita faixa etária, como diria o Dr. Alceu Amoroso Lima, em que o mísero bípede implume se encontra consigo mesmo. Eu poderia invocar a longa experiência de vida e contestar o fenômeno. Sim, posso assegurar que já encontrei muitos jovens com todas as características do canalhismo; e até poderia acrescentar, com robusta convicção, que essa peculiaridade da alma humana está equitativamente distribuída por todas as idades. Lembro-me por exemplo dos moços da extinta UNE, ou entidade máxima estudantil: quase todos os dirigentes que conheci eram canalhas e demonstraram uma virtuosidade capaz de causar inveja a um velho crápula aposentado. Por dois desses fui enrolado apesar de toda a experiência da vida de que me gabei pouco atrás. Mas talvez esteja enganado: os sagazes observadores da eclesialização do mundo ou da secularização da Igreja, e sobretudo os sociólogos dessa índole dirão que observei mal e que confundi canalhismo com atitudes de protesto. Os jovens que praticam atos de canalhice, segundo os padrões tradicionais, não são canalhas porque são jovens e não são canalhas porque estão apenas replicando à deixa da falida geração que só legou taras e misérias. Sim. Um dos postulados que parece presente na base de tudo o que se diz hoje dos jovens é o da total falência do mundo anterior. E aí temos um estranho conflito e até se duvidarem uma estranha revolta: a de um ente de razão contra outro ente de razão, a de um ser abstrato contra outro ser abstrato.

Outra coisa que ainda não logrei entender é a ideia de apresentar o jovem como um vanguardista. Como assim? Vanguardista sou eu. Nasci antes dele, provavelmente morrerei antes dele, e assim se vê que estou sempre na frente. Com meus setenta e um estou na ponta onde já são escassos os companheiros, e quanto mais viver e mais envelhecer, mais na frente e distanciado estarei. Quando esse moço desordeiro da França nasceu, eu já sabia trigonometria esférica, cálculo diferencial e outras coisas. Estava até começando a ficar grisalho, tal era a imensa dianteira que levava sobre esse retardatário. Já fazia a barba quando nasceu o pai do moço desordeiro. Fui autêntico algum dia? Ai de mim, no tempo em que atravessei a faixa etária da autenticidade não haviam nascido os sociólogos para fazerem a frase que me pusesse em estado de graça em relação a mim mesmo. Vivi sem essa absolvição, ou tive minha mísera e estreita autenticidade obscuramente vivida sem que dela se apercebessem a família, a cidade e o país. Minto. Um ou outro amigo certamente me estimou como se sentiu estimado, mas éramos modestos a respeito desses atributos fascinantes que cobrem hoje multidões. Fascinantes? Pensando bem creio perceber que não há nada mais melancólico do que esse efêmero esplendor que inventaram hoje para ainda mais estreitar a pobre vida humana. Já sabíamos, pela experiência e pela revelação, que o tempo é breve e que a vida é curta. Encurtaram-na ainda mais os que exaltam a supracitada faixa etária. Pobres moços! Têm missa especial no Largo do Machado, têm diversas outras regalias, mas estão condenados à inautenticidade dentro de três ou quatro anos. É só casarem-se e terem filhos e estarão definitivamente expulsos do paraíso etário, e desenganados em matéria de autenticidade. Ontem uma jovem jornalista que me entrevistava teve de repente um calafrio de terror.

− Estou ficando velha! Estou ficando velha!

Pensei que fosse mirrar à minha vista, como a velha das Minas de Salomão, mas vi que permanecia com os mesmos vinte e tantos. Ela então explicou-me:

− Estou ficando velha porque estou começando a concordar com o senhor. O que vai ser de mim lá na redação? Estou perdida!

Sim, a pobre moça estava perdida porque começava a pensar nos filhos que iam crescer, e que daqui a poucos dias estarão dizendo que são autênticos. Num momento de silêncio pesado estivemos a medir a imensa responsabilidade de sermos pessoas sem idade definida, sim, pessoas vivas e dadas em espetáculo do mundo...

*      Publicado originalmente em O Globo 6/6/68

**    Reproduzido do excelente site Permanencia https://permanencia.org.br/drupal/node/5997

A NAÇÃO NO DIVÃ DO PSICANALISTA

 

 

Percival Puggina

 

         Nunca me acomodei num desses divãs porque, para pensar, prefiro a cadeira do computador. Outro dia, porém, estarrecido e irritado diante do que vejo consolidar-se como prática política no cotidiano nacional, escrevi que tais conflitos e arreglos estavam a me exigir um divã e um papo com psicanalista.

Uma ideia puxa outra e isso me levou a perceber que essa era uma necessidade comum a todos nós, brasileiros. A nação precisava de um divã para compreender as tumultuadas relações com que, querendo ou não, estava envolvida até o fundo da alma. E o divã era bem adequado a isso, principalmente para compreendermos como se caracterizam, em nosso subconsciente, estes três elementos: Pátria, Nação e Estado.

A Pátria é a mãe. Amada e amável, gentil, generosa, pródiga em riquezas naturais. Na célebre definição de Rui, “não é um sistema, nem uma seita, nem um monopólio, nem uma forma de governo; é o céu, o solo, o povo, a tradição, a consciência, o lar, o berço dos filhos e o túmulo dos antepassados, a comunhão da lei, da língua e da liberdade”.  

A Nação somos nós, herdeiros dessa tradição, fé, consciência e idioma; herdeiros da cultura, valores e verdades aprendidos no lar.

O Estado é essa criatura, esse ente político, que se vai tornando abominável. Criatura, sim, porque bem antes dele surgir na história havia a pessoa humana, gregária, havia a comunidade, e foi nela que nasceu o Estado. Discutam os filósofos os fatores causais e instrumentais desse nascimento, mas sua finalidade é servir. E se alguma dúvida houver, lembremo-nos: o Estado brasileiro tem a forma a ele conferida pela sociedade num processo legislativo em que os constituintes agiam como seu representante.

Se a Pátria é a boa mãe e se nós somos seus filhos, o Estado brasileiro, então, é o pai ou padrasto de maus costumes e mau caráter, que abusa de seu poder, que cerceia direitos fundamentais, que não ouve os que estão sob sua autoridade, que avança sobre seus bens. Gastador, perdulário, desonesto e injusto, cuida prioritariamente de si mesmo e descumpre o único papel que lhe corresponde: servir à nação.

Capturados nesse triângulo psicológico, habituamo-nos a reverenciar o Estado e aqueles que o encarnam, como entes ou entidades superiores. Falamos a eles olhando para cima, numa reverência que convalida seu poder e sua conduta. Errados, estamos! A relação foi invertida. O Estado não existe para ser o monstro que nos sufoca. Se sua função é servir, a soberania popular deveria fazer a sociedade ver o Estado na perspectiva segundo a qual o Estado a vê: de cima para baixo, com o devido respeito pela importância dos papéis que desempenha. A soberania, contudo, desculpem informá-los, é popular.

Há que emergir desse drama quase freudiano, dessa tumultuada relação “familiar” em que nós, os brasileiros, fomos capturados.

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.