O Brasil é um país com inúmeras riquezas e talentos, mas há muito vem se perdendo entre crises, clientelismo, corrupção e ineficiências generalizadas. A coluna de Sergio Moro para a Crusoé:
A
previsibilidade permite planejamento. Em escala nacional, a
estabilidade das instituições, o império da lei e a racionalidade das
políticas públicas favorecem os agentes econômicos na geração e
distribuição da renda, promovendo bem-estar. O Brasil é um país com
inúmeras riquezas e talentos, mas há muito vem se perdendo entre crises,
clientelismo, corrupção e ineficiências generalizadas.
Na
minha vida pública, os temas relacionados ao Direito e às políticas
contra a corrupção sempre tiveram um lugar especial. A rigorosa
aplicação das leis fortalece o Estado de Direito, preserva o bem público
e evita condições desiguais entre agentes econômicos. Aqueles que
operam à margem da lei fraudam a concorrência e corroem as estruturas
institucionais e sociais, disseminando maus exemplos e colocando em
questão a capacidade de reação estatal. Atuei para tentar gerar maior
eficiência para o Estado brasileiro e reduzir a incerteza no
relacionamento público-privado.
Para
além das mazelas da corrupção, o Brasil vem padecendo de incertezas
institucionais, políticas, sociais, ambientais e econômicas. Não é
fácil, mas há certa clareza do que se fazer para acertarmos o rumo.
Em
relação às instituições, os poderes seguem atuantes apesar de diversos
solavancos como impeachment, escândalos pela má gestão de recursos
públicos, prisões de criminosos – política ou economicamente poderosos,
enquanto durou a Operação Lava Jato –, depressão econômica, pandemia,
tentativas de desmantelamento de órgãos de controle, além da polarização
excessiva. O povo brasileiro demanda a manutenção do Estado de Direito
regido por nossa Constituição Federal. As pessoas passam, as
instituições devem permanecer e ser aperfeiçoadas. Fortalecer a
democracia e as instituições tem que ser o foco. Transparência nos
gastos, eficiência na gestão do dinheiro público, impessoalidade no
trato com a coisa pública devem ser o norte para qualquer gestor
público.
Na
esfera política, acredito, como cidadão, que projetos sem radicalismos
reduziriam significativamente a incerteza projetada para os próximos
anos. Uns podem ser mais conservadores nos costumes e outros menos;
alguns podem ser mais liberais na economia, outros nem tanto. São
discussões legítimas e devem ser promovidas com transparência e
tolerância às divergências. O que não se pode admitir são projetos
radicais e personalistas, focados na satisfação própria e na acumulação
de poder, para a pessoa, os familiares ou o partido. O projeto
verdadeiramente republicano está delineado em nossa Constituição
Federal, que logo no início estabelece que o objetivo da República é
construir uma sociedade livre, justa e solidária.
Para
atingir esse objetivo, as políticas sociais precisam mirar na inclusão.
Aperfeiçoar nosso aparato público para honrar os direitos
constitucionais de todos: educação, saúde, segurança, justiça,
seguridade social, emprego ou renda mínima para existência digna e,
claro, liberdade e ausência de discriminação. São desafios que o Estado
precisa enfrentar e resolver. A complexidade e a interação desses temas
precisam ser equacionadas de acordo com as melhores técnicas econômicas e
orçamentárias, precedidas do salutar debate público. O povo brasileiro
não necessita de miragens, um futuro que nunca chega, mas de políticas
públicas que funcionem, de forma descentralizada e eficientes, como
convém a um federalismo cooperativo. O Brasil ainda tem muito para
correr nessas frentes, mas evoluiu nas últimas décadas, entre avanços e
retrocessos.
No
lado ambiental, o Estado tem o dever de proteger o meio ambiente. Os
custos financeiros e climáticos da destruição da natureza estão cada vez
mais evidentes ao redor do mundo. Os recentes embargos de empresas
estrangeiras a itens agroflorestais brasileiros ilustram o fracasso da
política atual. Regras claras para os empreendedores agroindustriais,
apoio institucional para adaptação às incertezas climáticas, incentivos
ao ganho de produtividade agrícola e ao reflorestamento, além de
estímulos às pesquisas científicas são caminhos a seguirmos para
podermos explorar responsavelmente a abundância de recursos naturais e o
clima privilegiado que tivemos a sorte de ter em nosso país.
Também,
de extrema relevância, precisamos dirimir as incertezas econômicas e a
algazarra institucional que está instalada. Adam Smith já dizia: “O que
vai gerar a riqueza das nações é o fato de cada indivíduo procurar o seu
desenvolvimento e crescimento econômico pessoal”. O empreendedor
precisa de previsibilidade econômica e estrutural para alocar seu
capital de forma a gerar emprego e distribuir renda. Para poder
planejar, investir, contratar, produzir e vender, o empreendedor precisa
de uma estrutura governamental que lhe propicie paz e estabilidade
econômica. Empreender é, por si só, um risco e traz preocupações. Não
deveriam ser as crises políticas, muitas vezes fabricadas para desviar a
atenção dos problemas reais, mais um elemento de preocupação.
Parte
dos empreendedores evitará investir em novos projetos enquanto o
ambiente econômico permanecer permeado por dúvidas cruciais, como, por
exemplo, sobre o valor do dinheiro no tempo, sobre a capacidade de o
governo honrar suas dívidas e financiar a infraestrutura necessária para
aliviar os diversos gargalos de crescimento e o peso de uma carga
tributária disfuncional e altamente complexa. Um governo precisa usar as
ferramentas econômicas de que dispõe para controlar a inflação, manter
uma dinâmica sustentável da dívida pública, aumentar a eficiência dos
gastos do governo, além de ter uma força-tarefa permanente para reduzir a
burocracia, permitindo a transição ainda mais rápida de um estado
burocrático e cartorial para um estado tecnológico e informatizado, em
todas as áreas, especialmente a administrativa, a tributária e a social.
Apesar
da clareza quanto aos passos a serem tomados em uma agenda de reformas
para o Brasil, a política brasileira mostra-se incapaz há tempos de
implementá-la. O principal motivo consiste na captura da agenda política
por interesses especiais e não-republicanos. Patrimonialismo,
clientelismo, corporativismo, às vezes suborno mesmo, têm dominado as
relações na esfera política, a ilustrar a reação contra a Operação Lava
Jato e o combate à corrupção. Enquanto não for iniciado um ciclo
virtuoso para resgatar a política do sequestro pelos interesses
especiais, a agenda de reformas não será implementada no ritmo e na
amplitude necessárias. Ficaremos sempre um passo atrás da comunidade das
nações, à semelhança do que ocorreu no passado quando fomos um dos
últimos países do mundo a abolir a escravidão. Sem as reformas
modernizantes, são os mais pobres que mais sofrem, e temos o dever de
abrir oportunidades a todos. Precisamos avançar no sentido correto, com
integridade, respeito e transparência, sem malícia e com caridade, para
que o Brasil não fique preso entre um passado corrompido e um presente
caótico.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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