O ex-juiz tem dado sinais de que não pretende disputar a Presidência no ano que vem, mas a falta de alternativa competitiva no chamado centro liberal faz com que seu nome continue figurando nas pesquisas como opção para romper a polarização entre Bolsonaro e Lula. André Spigariol para a Crusoé:
Mesmo
após se mudar para os Estados Unidos para trabalhar em uma empresa de
consultoria, mantendo-se a certa distância do debate eleitoral
brasileiro nos últimos meses, Sergio Moro continua a ser uma ameaça para
os representantes da velha política que tanto temiam a Operação Lava
Jato. O ex-juiz tem dado sinais de que não pretende disputar a
Presidência da República no ano que vem, mas a falta de alternativa
competitiva no chamado centro liberal faz com que seu nome continue
figurando nas pesquisas como opção para romper a polarização entre o
atual chefe do Palácio do Planalto, Jair Bolsonaro, e o ex-presidente
Lula. O establishment político decidiu que não quer pagar para ver e
tirou do papel nesta semana um plano sob medida para excluir Moro – e
também procuradores que atuaram na Lava Jato – das eleições de 2022.
Elaborado
por uma comissão escolhida a dedo pelo presidente da Câmara, Arthur
Lira, um novo Código Eleitoral que impõe uma quarentena eleitoral a
juízes, delegados e membros do Ministério Público deve ser votado – e
aprovado – na próxima quinta-feira, 2. A proposta de 371 páginas, com
905 artigos, é assinada pela deputada Margarete Coelho, integrante do
mesmo partido de Lira, o Progressistas, um dos protagonistas do
escândalo do petrolão. Foi justamente por ordem do cacique do Centrão
que Margarete incorporou ao texto uma emenda para tornar inelegíveis por
cinco anos magistrados, procuradores, promotores de Justiça, policiais
civis e até guardas municipais. As negociações em torno das mudanças no
texto original – feitas de última hora – escancaram o casuísmo da
iniciativa, cujo objetivo primordial é minar um possível projeto
eleitoral de Moro.
De
acordo com os trechos enxertados no projeto a mando de Arthur Lira,
integrantes dessas categorias só podem disputar as próximas eleições se
tiverem se afastado “definitivamente” de suas funções cinco anos antes
do registro de candidatura, não importa para qual cargo. Por essa regra,
Moro estaria impedido, porque largou a magistratura apenas em novembro
de 2018, quando topou ser ministro da Justiça do governo Bolsonaro. O
texto chegou pronto para Margarete Coelho, que apenas incorporou a
sugestão ao projeto. Eleita pelo Piauí, a deputada integra a cozinha do
ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, que acompanhou de perto toda a
articulação. A costura teve a participação, ainda, de lideranças do PL e
do Republicanos, outros partidos alvejados pela Lava Jato.
A
medida também agrada à oposição, em especial ao PT, que se associa ao
Centrão em iniciativas contra a Lava Jato e o combate à corrupção, a
exemplo do que já ocorreu na PEC que altera a composição do Conselho
Nacional do Ministério Público, a fim de ampliar as chances de punição
para procuradores, e da nova Lei de Improbidade, que afrouxa as sanções
para gestores que causam graves danos ao erário. A nova artimanha pegou
muita gente de surpresa, embora já fosse bola cantada. O líder da
bancada da bala na Câmara, deputado Capitão Augusto, do PL de São Paulo,
ficou sabendo da novidade pela imprensa. Ele pediu a Arthur Lira para
que o texto fosse modificado, mas ouviu do presidente da Câmara que a
tendência é que a emenda seja aprovada exatamente como foi colocada no
texto.
Lira
conversa diariamente com a relatora Margarete Coelho, para acompanhar o
andamento da proposta. Até aqui, ela tem se mostrado irredutível diante
dos pedidos para flexibilizar a proposta. A única exceção foi aberta
para ajustar um trecho que, se mantido, atingiria até mesmo políticos
com mandato atualmente – o senador Alessandro Vieira, por exemplo, era
delegado de polícia até ser eleito em 2018. Fez-se, então, um puxadinho
na proposta: agora Margarete tem dito que a mudança não valerá para
políticos já com mandato.
Além
da emenda anti-Moro, a proposta de Margarete Coelho traz uma série de
novidades com impacto direto na transparência sobre os recursos do fundo
partidário e na aplicação de punições a condenados por crimes
eleitorais e a suspeitos de desviar verbas públicas destinadas aos
partidos. As legendas poderão, por exemplo, gastar esse dinheiro do
pagador de impostos seu bel-prazer, desde que seus dirigentes digam que a
despesa tem “interesse partidário”. Também poderão fechar contratos à
base de dinheiro público sem necessidade de se submeter à Lei de
Licitações. Na frente criminal, a reforma tipifica o crime de caixa 2,
mas estipula a pena máxima em cinco anos. A cassação de mandatos por
meio da Justiça Eleitoral passa a ser considerada uma medida
“excepcional”, o que, na prática, ajuda políticos envolvidos em compra
de votos a manterem seus cargos mesmo depois de serem pilhados burlando
as regras eleitorais.
A
ideia de impor veto eleitoral a juízes, promotores, procuradores e
delegados não é novíssima. Em 2020, o então presidente do Supremo
Tribunal Federal, Dias Toffoli, defendeu publicamente a inelegibilidade
de oito anos para ex-magistrados e ex-integrantes do MP. O projeto
contava com o apoio de Rodrigo Maia, então presidente da Câmara e também
desafeto de Sergio Moro. Toffoli dizia, àquela altura, que a ideia era
evitar que juízes e procuradores pudessem usar seus cargos para fazer
“proselitismo” e se cacifar para cargos eletivos.
Líderes
do Centrão esperam que o requerimento de urgência do projeto seja
votado na semana que vem. Assim, o texto deverá ser pautado em plenário
logo em seguida. Enquanto isso, aliados de Arthur Lira conversam com
senadores para facilitar a aprovação do projeto até outubro, data limite
para que a nova lei possa ser aplicada já em 2022. A resistência às
tentativas da Câmara de modificar o sistema eleitoral é maior no Senado.
A avaliação reinante hoje é de que “não há clima” para que o novo
código seja aprovado assim, a toque de caixa.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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