Fiquemos assim: existem dois conjuntos de ideias chamados de progressistas ou politicamente corretos. Um é de matriz europeia, outro de matriz norte-americana. Enquanto um tem a tríade aborto-droga-gay, o outro é obcecado por raça. Bruna Frascolla via Gazeta do Povo:
No
último artigo, hesitei ao escrever que as ideias progressistas vêm da
Europa e consistem na tríade aborto-drogas-gays. Afinal, outro polo
exportador de progressismo são os Estados Unidos, cuja obsessão por raça
não se enquadra nessa tríade. Mencionei a Argentina como grande
receptadora das ideias progressistas da Europa. Na verdade, enxergo a
Argentina como uma Europa sem Plano Marshall: em vez de Mussolini, eles
tiveram Perón, não lutaram na II Guerra e seguem idolatrando o Mussolini
deles até hoje.
Façamos
então um teste. Tem cota racial na Argentina? Pesquisando “cuotas
raciales Argentina”, encontrei artigos sobre o Brasil e até texto
falando mal de Bolsonaro. Mas cuotas raciales na Argentina, que é bom,
nada. Ou seja: a Argentina, aquele país onde o presidente fala “todes”,
onde tem casamento gay desde 2010, onde o aborto foi descriminalizado,
tudo democraticamente e sem canetadas de um STF, não tem cuotas raciales
en las universidades.
Fiquemos
assim: existem dois conjuntos de ideias chamados de progressistas ou
politicamente corretos. Um é de matriz europeia, outro de matriz
norte-americana. Enquanto um tem a tríade aborto-droga-gay, o outro é
obcecado por raça.
Por que europeu não dá bola pra lei racial?
A
ideia de racismo leva a nossa mente direto para a Alemanha. No entanto,
as leis raciais são uma invenção dos EUA aplicada aos negros que os
alemães importaram para aplicar aos judeus. As leis raciais surgem no
sul escravista dos Estados Unidos em 1877 e começam a se federalizar com
Woodrow Wilson em 1913, quando o vagabundo Adolf Hitler tinha 24 anos e
encontrava um rumo na vida na condição de soldadinho austríaco. Nos
Estados Unidos, a descentralização conseguiu dar uma segurada nos
projetos eugenistas das autoridades médicas e dos políticos entusiastas.
Na Alemanha, toda a estrutura centralizadora do poderoso Estado
prussiano foi posto nas mãos de Hitler e seus médicos eugenistas, que se
inspiravam nos norte-americanos. Não dá para dizer que os
norte-americanos sejam mais racistas do que os alemães. Ainda assim, foi
dos EUA que saiu o racismo de Estado.
A
razão para isso é muito simples. Nos EUA, o critério-chave da cidadania
é o nascimento em solo nacional. Você pode ser preto, branco, amarelo
ou verde, e a lei, até segunda ordem, irá considerá-lo um American. Para
os Estados Unidos se tornarem racistas, foi necessária uma gambiarra
jurídica, as famigeradas leis Jim Crow. A raiz legal do país faz dele,
de fato, a terra da liberdade.
Já
na Europa, o critério-chave da cidadania se confunde com a raça. Um
casal de imigrantes negros pode chegar criança à Europa, constituir
família na Europa, e ainda assim os seus filhos e netos não serão
cidadãos europeus. Nascerão e morrerão como estrangeiros dentro do país
em que construíram suas vidas. Isso só aparece para o grande público
durante a Copa do Mundo, quando as seleções europeias saem
providenciando cidadania para os jogadores de futebol negros. (Não sei
detalhes, mas países latinos com ex-colônias parecem mais propensos a
negligenciar o jus sanguinis paraconceder cidadania a africanos das
ex-colônias. O Portugal salazarista, mesmo, considerava Angola e
Moçambique estados portugueses.)
Assim,
uma legislação etnocêntrica dispensa os europeus de inventarem leis
racistas. Eles já vivem em um solo habitado por cidadãos brancos e
não-cidadãos negros. Evidentemente, isso cria um barril de pólvora de
ressentimento e culpa.
Brancos sem cidadania na Europa
Mas
o critério é, frisemos, etnocêntrico, não racial. Um casal de italianos
que migrasse para a Alemanha antes da União Europeia também viveria
como um perfeito estrangeiro. O europeu é bastante sedentário: veja-se
que no Brasil, onde há uma migração interna muito grande, um acriano e
um gaúcho se entendem perfeitamente em português, mas um italiano de
Nápoles e um do Piemonte, não, pois há a barreira do dialeto. Antes da
descoberta da América, os europeus migravam muito pouco, então faz
sentido que o seu critério de cidadania histórico seja étnico.
Quem
eram os estrangeiros nesse critério? Os judeus. Eram estrangeiros
errantes, viviam em guetos separados dos cristãos desde a Idade Média
até Napoleão. Foi Napoleão, no século XIX, quem saiu conquistando a
Europa e emancipando judeu.
Portugal
se diferencia do resto da Europa por ter resolvido a questão judaica em
1497. Tendo que deixar o Reino livre de todos os judeus por pressão
espanhola, Portugal deu uma solução que hoje diríamos ser bem
brasileira: em vez de matar ou expulsar todo mundo, batizou todo mundo e
proibiu sinagogas. Mas o batismo podia ser mera formalidade; ademais,
se você abrisse uma sinagoga, ninguém ia lá verificar, ou, se
verificasse, você molhava a mão.
Funcionou
assim até D. Sebastião ficar encantado em Alcácer-Quibir e deixar a
Coroa na mão da Espanha, com sua temível Inquisição. Os ex-judeus então
começam a cultuar a figura d’O Esperado, pois D. Sebastião voltaria e
instauraria um paraíso terrestre. Surge o sebastianismo, uma heresia
perseguida pela Inquisição. E, sendo a Inquisição muito mais relaxada no
Brasil, aqui se tornou um bom lugar para ser sebastianista. Ao cabo, os
ex-judeus não só foram integrados à nacionalidade portuguesa, apagando a
ideia de um português étnico, como criaram um poderoso símbolo
nacional.
Só
a Península Ibérica entrou na modernidade sem guetos. Assim, não é de
admirar que a mania racial tenha sido importada da América pelos
europeus menos civilizados e usada contra os judeus. Toda essa Europa
que se manteve com guetos judaicos hoje tem guetos de imigrantes, tudo
não-cidadão.
O
nome de gueto é aplicado no Brasil a favelas. Curiosamente, porém,
gringos que vêm para o Brasil fazem turismo em favela, mas não em no-go
areas europeias. A favela brasileira é cheia de eleitores, de cidadãos e
de gente que fala o mesmo idioma que os demais brasileiros. Quem tem
gueto é quem aponta o dedo para nós.
Individualismo radical
Penso
que o que caracteriza melhor o progressismo de matriz europeia é o
individualismo radical, a atomização da sociedade. Por mais que
reconheçamos o amor romântico entre gente do mesmo sexo, e por mais que o
casamento cristão moderno seja centrado nesse tipo de amor, ninguém
razoável discordará de que as relações entre homens gays costumam ser
mais fugazes do que as relações tradicionais entre homens e mulheres com
filhos. A fugacidade do casamento me parece ser uma meta desse tipo de
progressismo.
Filhos
são um tipo de laço entre casais. Para impedir esses laços, basta
vender o aborto como grande ícone de liberação feminina. A mulher ideal,
então, faz sexo loucamente – sem se prender a nenhum homem – e,
acontecendo de ficar grávida, irá ao médico tirar. Caso o bebê nasça – e
natalidade da Europa é pequenininha –, tem o Estado de bem-estar social
para bancar o bebê e deixar a mulher dispensar o homem e até os avós.
Assim,
a vida ideal desse tipo de progressista se divide entre o trabalho bem
remunerado e a balada, esta regada a drogas caras. Nas banlieues ficam
os não-cidadãos responsáveis pelo trabalho braçal.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

Nenhum comentário:
Postar um comentário