Bolsonaro com o presidente polonês Duda. |
Todos eles têm, em diferentes medidas, uma aversão à agenda globalista e
defendem a “ideia de que o governo deve responder mais diretamente à
população e menos às chamadas elites internacionais”. Reportagem da Gazeta:
O Brasil faz parte de um quarteto de países com governos
conservadores que está buscando promover uma agenda de direitos humanos
que reflita esses valores em âmbito internacional. Junto com Hungria,
Polônia e Estados Unidos, o governo brasileiro tenta defender o valor da
família, a liberdade religiosa e o direito à vida em foros da
Organização das Nações da Unidas (ONU) e em reuniões com outros países.
No dia 5 de fevereiro, a Aliança Internacional pela Liberdade
Religiosa, iniciativa liderada pelo quarteto, foi lançada em Washington
(EUA). O grupo também comanda desde dezembro de 2019 a Parceria pelas
Famílias, que, no último dia 15, organizou um evento na Comissão para o
Desenvolvimento Social da ONU para debater sobre políticas de apoio às
famílias. Além disso, os quatro países atuam juntos e têm papel
importante no Processo de Varsóvia, que discute soluções para a
pacificação do Oriente Médio.
União conservadora e contra o globalismo
“São quatro países ligados ao conservadorismo e que têm em comum o
discurso contrário àquilo que se convencionou chamar de globalismo”, diz
o sociólogo Lucas Azambuja, do Ibmec BH. Para o professor, uma das
características de todos os países desse quarteto é buscar “se inserir
internacionalmente formando alianças para constituir outras arenas de
deliberação que não as de organizações internacionais como a ONU”. Todos
eles fazem parte de um “movimento contrário ao globalismo, que procura
destacar a ideia de soberania nacional e de valores ligados à tradição
judaico-cristã”.
O catalisador do vínculo que formou a aliança conservadora foi a
sintonia entre o presidente Jair Bolsonaro e os três líderes das outras
nações – Viktor Orbán, da Hungria; Andrzej Duda, da Polônia; e Donald
Trump, dos Estados Unidos. Além disso, há semelhanças de visão de mundo
entre as lideranças de alto escalão de nível ministerial, como o
chanceler brasileiro Ernesto Araújo e o secretário de Estado dos Estados
Unidos, Mike Pompeo.
Nas últimas semanas, Araújo teve reuniões bilaterais com chanceleres
da Hungria e da Polônia. Em abril, Bolsonaro deve ir à Europa para
visitar os dois países, o que deixa mais evidente a força da parceria
brasileira com esses governos. O presidente também irá aos Estados
Unidos no começo de março, mas somente para uma visita ao estado da
Flórida.
Além do Ministério das Relações Exteriores, chefiado por Araújo,
outra pasta envolvida de maneira significativa na articulação brasileira
com esses países é o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos
Humanos (MMFDH), de Damares Alves. Uma das figuras mais ativas nesse
sentido é a secretária da Família do MMFDH, Angela Gandra, que comandou a
delegação brasileira no evento sobre políticas de apoio às famílias da
Comissão para o Desenvolvimento Social da ONU.
Brasil organizou a Parceria pelas Famílias
A ideia de organizar um grupo internacional de apoio a políticas
públicas voltadas às famílias – a Parceria pelas Famílias – partiu do
Brasil, por meio do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos
Humanos. Em um evento sobre assuntos demográficos na Hungria, a proposta
começou a se materializar, e o governo brasileiro costurou uma aliança
com húngaros, poloneses e norte-americanos que deu origem ao grupo, em
dezembro de 2019.
“Procurei o ministro Ernesto para ver se ele gostaria de fazer isso
no plano internacional. Depois, procurei a missão [diplomática
brasileira] da ONU em Nova York”, explica Angela Gandra, secretária
Nacional da Família do MMFDH.
O primeiro evento da Parceria pelas Famílias, no dia 15 de fevereiro,
teve palestras de representantes do Brasil, da Hungria, da Polônia, dos
Estados Unidos e do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância).
Também participou do evento o diretor da OIT (Organização Internacional
do Trabalho), o brasileiro Vinícius Carvalho Pinheiro, já que o
equilíbrio trabalho-família era um dos focos das discussões.
Angela falou sobre dois temas considerados centrais pelo MMFDH: o
equilíbrio trabalho-família e “a primeira infância a partir da família,
considerando primeira infância a concepção”. “A gestação é um momento
muito decisivo. São os primeiros momentos relacionais da criança com a
sua própria mãe. Queremos considerar a primeira infância a partir desse
marco [da concepção]”, afirma a secretária.
Segundo a secretária, os objetivos do grupo são o intercâmbio de
políticas públicas voltadas à família, o compartilhamento de material
científico para promover políticas públicas a partir de evidências, dar
mais voz ao tema da família nos organismos internacionais, promover um
“olhar mais fraternal em termos de direitos humanos” na sociedade. A
Parceria pelas Famílias pretende realizar eventos periódicos, sempre com
participação da sociedade civil.
Angela diz que um dos princípios do grupo é que sua agenda “não vai
ser nunca impositiva”. “A gente quer intercambiar valores comuns, mas
nunca que nós imponhamos alguma coisa para outro país ou para as
famílias”, afirma.
Ela também destaca que a aliança terá “profundo respeito pelas
diferenças culturais” e pretende “que as discussões não sejam
conceituais, mas de índole prática”.
“Queremos que cada pai e mãe possa ser insubstituível no seu lar e,
por outro lado, fazer toda a diferença social que eles possam. Isso só
se dá quando há políticas públicas que sustentem essa realidade”, diz
ela. “Hoje se fala muito em sustentabilidade, mas não adianta um planeta
melhor para quem não se dá bem. Nós queremos, a partir desse enfoque da
família, conseguir uma sustentabilidade de relações humanas.”
Por que a aliança conservadora é formada por esses países
Para Angela, a união dos quatro países em dois grupos internacionais
importantes para defesas de valores humanos – na Aliança pela Liberdade
Religiosa e na Parceria pelas Famílias – é consequência do fato de que
“os valores verdadeiros são comunicantes”.
“Há três vertentes de direitos que, desde a Declaração Universal dos
Direitos do Homem e do Cidadão, foram mal entendidos e não foram mais
tomados em sua plenitude: o direito à vida, o direito da família – a
gente perdeu a família como primeira protagonista do mundo social – e a
liberdade religiosa”, diz a secretária.
A intenção desse grupo de países, segundo ela, é resgatar o sentido original da Declaração, que se perdeu ao longo do tempo.
O professor Lucas Azambuja identifica um conjunto de três valores
coincidentes para que a aliança conservadora se dê justo entre esses
quatro países: o nacionalismo, o controle de fronteiras e o resgate da
agenda conservadora em temas relacionados principalmente à defesa da
família e contra o aborto.
Todos eles têm, em diferentes medidas, uma aversão à agenda
globalista e defendem a “ideia de que o governo deve responder mais
diretamente à população e menos às chamadas elites internacionais”, diz
Azambuja.
O segundo ponto, que tem menos relação com o Brasil, é o da migração,
que se reflete em “um discurso de oposição à abertura de fronteiras”.
“Aliado ao nacionalismo, há a ideia de que os países devem restringir o
processo migratório”, afirma.
O terceiro elemento, segundo Azambuja, é o mais distintivo dos três: o
público-alvo do discurso, que adere à agenda conservadora. “É um
discurso que se volta muito diretamente ao que a gente pode chamar de
classe média baixa”. A maneira de chegar a essa população, segundo o
professor, é “construir um discurso que apele a valores tradicionais com
que esses segmentos da população se identificam”.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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