A cara desse ser nojento é de regenerado? |
Bandidolatria universal: caso do criminoso condenado por terrorismo que,
colocado em liberdade pela justiça, matou dois a facadas expõe os
extremos do humanismo tosco, escreve Vilma Gryzinski. Ao que parece, a tal de civilização ocidental tem mesmo um vírus mortal dentro de si própria:
Não é só aqui, não.
E mais: o absurdos do caso de Usman Khan, o terrorista esfaqueador
que matou dois jovens advogados que estavam num encontro justamente para
ajudar criminosos como ele, expõe distorções que estarrecem o mais
desiludido dos brasileiros.
Só para dar uma ideia: a primeira reação do pai de uma das vítimas, o
advogado Jack Merritt, foi dizer que não gostaria de ver a morte do
filho ”usada” para a imposição de “sentenças mais draconianas ainda”.
Já deu para entender o espírito da coisa quando até terroristas
reincidentes são considerados uns coitadinhos, vítimas da sociedade e do
furor punitivo do sistema malvado.
Isso num país com casos cabeludos de extrema leniência.
Usman Khan foi dominado por cidadãos comuns, inclusive um que pegou
uma presa de baleia narval, a mais bizarra das armas da história da
reação em defesa da vida de outrem, e partiu para cima do assassino
armado com dois facões.
A rara presa da baleia do Ártico estava numa das paredes do
Fishmongers’s Hall, literalmente o pavilhão dos peixeiros, o prédio em
estilo neoclássico que fica bem numa das entradas da London Bridge.
O prédio histórico, que remete às antigas guildas, ou associações
profissionais, reunidas na City, era usado par reuniões de um programa
de Cambridge, Learning Together, Aprendendo Juntos, destinado a
reabilitar criminosos renitentes.
O jovem, bonito e idealista Jack Merritt, de 28 anos, era um dos
coordenadores. A outra vítima letal era a voluntária Saskia Jones, de 23
anos, também formada por Cambridge.
Usman Khan era considerado um caso exemplar. Tinha usado os bondosos
idealistas para conseguir autorização e viajar para Londres, participar
do encontro do Aprendendo Juntos.
O primeiro que atacou foi Jack.
O fato de que Usman Khan estivesse num sistema equivalente ao de
liberdade vigiada, com tornozeleira eletrônica, já é inacreditável.
Ele foi condenado em 2012 por planejar um atentado terrorista com uma
gangue de outros criminosos, todos seguidores de um dos maiores
disseminadores do jihadismo militante no Reino Unido, Anjem Choudary.
Tramavam um atentado ambicioso, de grandes proporções, como havia
acontecido em Mumbai, na Índia. Queriam explodir a Bolsa de Valores de
Londres e outros lugares de grande visibilidade, além de assassinar
personalidades políticas e religiosas, incluindo Boris Johnson, o
primeiro-ministro que na época era prefeito de Londres.
Pela lei, Khan e os outros deveriam ser condenados obrigatoriamente à
prisão perpétua por terrorismo. Mas recebeu uma sentença de detenção
para a proteção pública, com obrigatoriedade de cumprir seus 16 anos.
Automaticamente, entrou em regime de progressão quando cumpriu a
metade – um recurso que depois foi eliminado, mas não podia ser aplicado
retroativamente.
Soa conhecido, não?
RAIAS DA LOUCURA
Com cartas muito bem escritas ao juiz responsável, prometendo se
dedicar a “ser um bom muçulmano e um bom cidadão britânico”, conseguiu
sair no regime de liberdade vigiada, com tornozeleira eletrônica.
Entrou para o programa de Cambridge e ganhou até um computador,
especial, sem conexão com a internet, para se dedicar à poesia e outras
atividades elevadas.
O próprio programa de recuperação de criminosos, uma atividade tão
necessária quando atinge os que verdadeiramente querem se regenerar, é
encrencado pela militância anti-sistema que atinge as raias da loucura.
Uma de suas fundadoras, a professora Ruth Armstrong, batalhou
incansavelmente por sua libertação e se envolveu a tal ponto no caso de
um assassino de origem britânica que matou uma menina de 14 anos nos
Estados Unidos que arrumou até um emprego para ele no restaurante
mexicano do marido.
O assassino, Dempsey Hawkins, conseguiu ser solto, foi para Cambridge
e assediou pelo menos uma mulher que conheceu num site de encontros. A
mulher disse que hoje dorme com uma faca debaixo do travesseiro.
Aliás, um dos homens que destemidamente partiram para cima do
terrorista também é um assassino que participava do grupo de
ressocialização.
Devia cumprir prisão perpétua pela morte de uma jovem com idade mental de adolescente, mas estava numa saidinha.
Um terrorista que finge ter se regenerado, enquanto planeja
assassinar inocentes a facadas, e num assassino que participa da nobre
reação coletiva para contê-lo. Quem imaginaria uma história dessas?
E tudo ainda aconteceu faltando poucos dias para a eleição em que
Boris Johnson tenta conseguir a maioria parlamentar para fazer o Brexit e
Jeremy Corbyn paira como uma ameaça nada desprezível.
Declarando-se trabalhista, de esquerda e ateu, David Merritt, nem
chorou direito o filho, Jack. Acusou Boris Johnson de tentar politizar e
faturar com a morte do filho.
Mas qual seria a opção de um primeiro-ministro – e nada incidentalmente, integrante da lista de potenciais assassinados.
Não falar nada? Não dizer que o caso de Usman Khan foi um erro terrível que não deve ser repetido?
A transição da bandidolatria para a terroristolatria chegou a ponto de haver reclamações pela ação da polícia.
Armados e instruídos sobre o que fazer em caso de suspeita de
explosivos, os policiais que chegaram rapidamente ao local tiraram os
civis que dominavam o terrorista, viraram-no de barriga para cima, viram
um colete-bomba – falso, como depois se saberia – e rapidamente
dispararam.
Tudo dentro do protocolo, num caso cristalino do excludente de ilicitude.
As críticas só não foram mais violentas porque quem comanda a polícia é uma nomeada pelo prefeito de Londres.
Sadiq Khan compartilha o sobrenome, muito comum entre descendentes de
paquistaneses, com o terrorista. É do Partido Trabalhista e está vendo
muito bem como Jeremy Corbyn se enrola com sua simpatia nada oculta pelo
Hamas e até pela turma de Anjem Choudary.
Preso por discurso de incentivo à violência terrorista, Choudary
também foi beneficiado pelas concessões não só da lei como da
previdência social: suas mulheres ganham o equivalente ao bolsa-família.
Simpatizante da Al Qaeda, o pregador aderiu ao Estado Islâmico.
E o Reino Unido pode ter um primeiro-ministro que acha esse pessoal bacana.
Aliás, mesmo depois do atentado e das perversões jurídicas que
revelou, Jeremy Corbyn disse que terroristas condenados “não
necessariamente” deveriam cumprir as sentenças na íntegra.
Mais uma vez, soa conhecido.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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