sábado, 1 de junho de 2019

Bolsonaro em entrevista à Veja: sabotagens, PSL, Queiroz, Olavo, Adélio...


Em entrevista à revista Veja, o presidente Jair Bolsonaro afirma que não vai "resolver na raça":

A entrevista com Jair Bolsonaro estava marcada para as 10 horas de quarta-feira. Às 10h15, um ajudante de ordens indicou o caminho do gabinete, que fica no 3º andar do Palácio do Planalto. O presidente explicou o motivo do atraso: meia ­hora antes, ele decidira ir ao Congresso Nacional prestigiar uma homenagem que estava sendo feita ao comediante Carlos Alberto de Nóbrega, apresentador do programa A Praça É Nossa, de quem se diz fã. O problema é que ele não avisou ninguém com antecedência. Assessores, cerimonial, equipe de segurança — todos foram apanhados de surpresa. Acompanhado do general Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional, o presidente atravessou a pé os cerca de 100 metros que separam o Planalto do Congresso. De volta, fez piada com a suposta dificuldade de Heleno, de 71 anos, em completar o trajeto. “Ele está meio empenado, mas me garantiu que o problema é apenas da cintura para cima”, disse, rindo. Formalidade não é a principal virtude do presidente.

Por medida de segurança, a sala envidraçada do gabinete agora permanece com as cortinas fechadas. É uma preocupação compreensível. Cada um tem a sua. O ex-presidente Michel Temer, por exemplo, evitava usar a mesa de trabalho. Dizia que não se sentia bem quando sentava na cadeira, que irradiaria uma energia negativa, assim como não se sentiu bem em morar no Palácio da Alvorada, onde, jurava, ouvia barulhos estranhos durante a madrugada. Coisa de assombração, segundo ele. No caso do atual presidente, as assombrações são outras. Durante duas horas, Bolsonaro falou sobre reformas, desemprego, reeleição, os filhos, o amigo enrolado Fabrício Queiroz, o guru Olavo de Carvalho, trapalhadas de ministros, Lula, o PT, sabotagens, tuitadas e o atentado que sofreu durante a campanha, tema que, ao ser invocado, mudou completamente o ritmo da conversa, a fisionomia e o humor do presidente.

Bolsonaro até hoje se emociona ao falar do ataque que sofreu. “Você vê passar um filme na sua cabeça, vem uma imagem na sua cabeça… a minha filha Laura, de 7 anos… ”. O presidente não conseguiu concluir a frase, com a voz embargada, e chorou. “No primeiro momento, eu não vi que era uma faca. Parecia um soco, uma bolada. Vi o rasgo e pensei que era uma porrada, um soco inglês…”. Nova interrupção. O presidente respirou fundo. Um assessor lhe entregou uma caixa de lenços de papel. Para ele, o dia 6 de setembro de 2018, quando foi esfaqueado pelo garçom Adélio Bispo de Oliveira, ainda não acabou. Bolsonaro tem duas certezas sobre esse caso. A primeira: um milagre salvou sua vida. A segunda: há uma enorme conspiração por trás do crime. A seguir, os principais trechos da entrevista exclusiva do presidente a VEJA.

O senhor já se acostumou com a função de presidente da República? Já consegui fazer aquilo que prometi durante a campanha, coisa que eu desconheço que qualquer outro presidente tenha feito: indicar um gabinete técnico, respeitar o Parlamento e cumprir o dispositivo constitucional da independência dos Poderes. Agora, a pressão aqui é muito grande, tem interesses dos mais variados possíveis, tem aquela palavra mágica que a imprensa fala muito, governabilidade. Me acusam muitas vezes de não ter governabilidade. Eu pergunto: o que é governabilidade? Nós mudamos o jeito de conduzir os destinos do Brasil. Hoje, cinco meses depois, eu sinto que a maioria dos parlamentares entendeu o que está acontecendo. Muitos apoiam a pauta do governo. E esse apoio está vindo por amor à pátria, por assim dizer. A gente não pode continuar fazendo a política como era até pouco tempo atrás. Estávamos no caminho da Venezuela. Respondendo a sua pergunta, já passei noites sem dormir, já chorei pra caramba também.
Por quê? Angústia, né? Tá faltando o mínimo de patriotismo para algumas pessoas que decidem o futuro do Brasil. O pessoal não está entendendo para onde o Brasil está indo. Não preciso dizer quem são essas pessoas. Elas estão aí. Imaginava que ia ser difícil, mas não tão difícil assim. Essa cadeira aqui é como se fosse criptonita para o Super-­Homem. Mas é uma missão, entendo que Deus me deu o milagre de estar vivo. Nenhum analista político consegue explicar como eu cheguei aqui, mas cheguei e tenho de tocar esse barco.
Qual é a missão mais difícil? As propostas que você quer apresentar e como elas podem ser interpretadas pelo Parlamento. Veja a questão dos caminhoneiros. De vez em quando aparece aí o fantasma da paralisação que mexeu com a economia do Brasil. O que a gente tem de fazer para antecipar problemas? Por que não aumentar o limite na carteira para 40, 50 pontos? Alguns vão criticar: “Pô, o cara aí quer relaxar na questão do trânsito”. Mas eu fiz isso. Chamei o Tarcísio (de Freitas, ministro da Infraestrutura) e disse “não quero mais saber de novos pardais”. Isso, às vezes, é mal interpretado. Por outro lado, você vai ganhando a simpatia da população e ela acaba entendendo que você quer fazer a coisa certa. No macro, é a reforma da Previdência, que é a mãe das reformas, e depois a tributária, que está para ser discutida.

O que o senhor realmente pensa sobre a reforma da Previdência? A cabeça de um parlamentar era uma coisa, a cabeça de um presidente, agora com acesso aos números, é outra. Na Câmara, muitas vezes você tem uma informação de orelhada. Por isso, eu sempre fui contra a reforma da Previdência. O que faz a gente mudar? A realidade. O Brasil será ingovernável daqui a um, dois, três anos. Se a reforma da Previdência não passar, o dólar pode disparar, a inflação vai bater à nossa porta novamente e, do caos, vão florescer a demagogia, o populismo, quem sabe o PT, como está acontecendo na Argentina, com a volta de Cristina Kirchner. O Brasil não aguentaria outro ciclo assim.

Aprovada a reforma da Previdência, o que o senhor vislumbra na sequência? Vamos partir para a reforma tributária e para as privatizações. Já dei sinal verde para privatizar os Correios. A orientação é que a gente explique por que é necessário privatizar. No caso dos Correios, o PT destruiu a empresa. A bandalheira era tão grande que o fundo de pensão dos funcionários, que hoje está quebrado, fez investimentos em papéis da Venezuela. Com que interesse? Pelo amor de Deus! Então, temos de mostrar à opinião pública que não tem outro caminho a não ser privatizar os Correios. Será assim com outras estatais. Há muitos cabides de emprego dentro do governo.

Presidente, para quando o senhor espera a diminuição do atual nível de desemprego? O general Mourão acabou de chegar da China. Lá também tem desemprego. Mas há uma diferença. Quando os chineses quiseram fazer a usina hidrelétrica de Três Gargantas, só avisaram: “Olha, daqui a dois anos a água vai subir, se vira”. No Brasil você não faz isso. Aqui, Belo Monte está sendo construída há quase dez anos. E existe um outro problema. Uma parte dos nossos milhões de desempregados não se encaixa mais no mercado de trabalho, por falta de qualificação. Há também os universitários que só têm diploma. Alguns acham que gastar mais dinheiro é sinal de que está melhorando a educação. Tem país que gasta per capita menos que nós e tem uma educação muito melhor. A situação não está nada bacana. Essa é a realidade.

Mas o Ministério da Educação em seu governo será um exemplo de eficiência? Errei no começo quando indiquei o Ricardo Vélez como ministro. Foi uma indicação do Olavo de Carvalho? Foi, não vou negar. Ele teve interesse, é boa pessoa. Depois liguei para ele: “Olavo, você conhecia o Vélez de onde?”. “Ah, de publicações.” “Pô, Olavo, você namorou pela internet?”, disse a ele. Depois, tive de dar uma radicalizada. Em conversas aqui com os meus ministros, chegamos à conclusão de que era preciso trocar, não se pode ter pena, e trocamos.

Qual é o nível de influência que o filósofo Olavo de Carvalho tem no governo? Nenhum. O Olavo foi uma pessoa importante na minha campanha. Ele vinha disseminando os ideais da direita havia muito tempo, uma visão que abriu a cabeça de muita gente. Então, de alguma forma, ajudou na minha eleição. Mas raramente eu converso com o Olavo. Ele tem a sua liberdade de expressão, e ponto. Quantas vezes eu fui chamado de ladrão, safado, sem-vergonha, homofóbico, racista. Eu fico quieto? Agora, se ele responde às agressões de lá… O Olavo não faz por maldade. Ele, pela idade talvez, quer as coisas resolvidas mais rápido. Talvez seja isso aí.
A questão do Ministério da Educação está resolvida então? Tive de escolher. Chegaram vários currículos aqui, de pessoas bacanas. Mas aquilo é um campo minado, pessoas concursadas, militantes. Quando vazou aquela história de que o MEC estava orientando a cantar o Hino Nacional, a filmar os estudantes e tudo debaixo do slogan “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”, eu cheguei: “Pô, Vélez, tem uma lei do Lula que diz para cantar o Hino Nacional, conforme eu conversei contigo. Por que colocar o slogan ‘Brasil acima de tudo’? Quem escreveu isso lá?”. “É, foi o meu gabinete.” “Demita o cara, pelo amor de Deus.” Foi para sabotar o ministro.

Há outros casos de sabotagem dentro do governo? Claro. É uma luta pelo poder. Há sabotagem às vezes de onde você nem imagina. No Ministério da Defesa, por exemplo, colocamos militares nos postos de comando. Antes, o ministério estava aparelhado por civis. Havia lá uma mulher em cargo de comando que era esposa do 02 do MST. Tinha ex-deputada do PT, gente de esquerda… Pode isso? Mas o aparelhamento mais forte é mesmo no Ministério da Educação. Eu não sou contra você falar nas escolas, nas universidades sobre quem foi, por exemplo, Che Guevara. Mas tem de falar também quem foi Brilhante Ustra (coronel do Exército apontado como torturador durante o governo militar), com verdades, e não com mentiras.

Como o senhor vê o papel da esquerda no Brasil? Há poucas semanas teve o deputado petista Paulo Pimenta defendendo o Maduro, discursando. Esse pessoal todo da esquerda defende o Maduro. Será que nós queremos isso para o Brasil? Ou o cara está com o cérebro corroído por alguma coisa ou é maluco. Não tem outra explicação. O que eles pregam não deu certo em lugar nenhum do mundo e continuam defendendo. No governo Lula foi criada uma dezena de estatais e no governo Dilma elas foram ampliadas. Temos de ficar livres desse peso.

O presidente Lula, pelo Twitter, tem postado críticas ao senhor e a seus filhos. Em 1986, quando eu fiz aquele artigo na revista VEJA em que defendi aumento de salário para os militares, fui punido acertadamente pelo ministro do Exército com quinze dias de prisão. Minha prisão não foi dentro de uma cela, foi dentro do quartel. Porque eu não era uma pessoa perigosa para estar trancafiado naquele local. E mesmo dentro do quartel você sente. Imagine o Lula dentro de uma cela. O cara sente. Costumo dizer muitas vezes: se você está comendo coisa não muito boa e passa a comer uma coisa boa, legal. Mas, quando você está comendo bem e volta a comer uma coisa ruim, você sente. Ele saiu de uma situação de líder para a de um cara preso, condenado por corrupção. Apesar disso, não tenho nenhuma compaixão em relação a ele. Ele estava trabalhando para roubar também a nossa liberdade.
Muitos consideram o seu governo uma ameaça à democracia. Os caras usam o período militar, o fato de eu ser capitão do Exército, como se aquele período fosse um período de terror. Acho que na balança houve muito mais coisa positiva do que negativa. Se não fossem os dois choques do petróleo, o Brasil estaria muito melhor. Qual ditadura faz uma campanha “Brasil, ame-o ou deixe-o”? Você imagina a Coreia do Norte e Cuba fazendo isso daí? Não fica ninguém lá, pô! Então fale as coisas ruins, tudo bem, mas fale as positivas também. Isso é democracia.

Como o senhor avalia a atuação da bancada do PSL, o seu partido? É um partido que foi criado, na verdade, em março do ano passado e buscava pessoas, num trabalho hercúleo no Brasil. Então nós fomos pegando qualquer um: “Quebra o galho, vem você, cara, vamos embora”. E tem muita gente que entrou e acabou se elegendo com a estratégia que eu adotei na internet. Só para ter uma ideia, o Major Olimpio, que estava em quarto em São Paulo, passou a ser o primeiro e se elegeu senador. Eu falava: “Clica aqui. Vote em um desses colegas nossos”. Teve muita gente que falou para mim: “Nossa, eu não esperava me eleger”. Por isso o pessoal chegou aqui completamente inexperiente, alguns achando que vou resolver o problema no peito e na raça. Não é assim.

Como o senhor vê o retorno de propostas de mudança de sistema de governo? Vamos por partes. O Congresso quer participar do governo como antigamente. Alguns pelo menos. Então sabe que a gente vai cumprir o que prometeu durante a campanha. Agora todos os ministérios estão abertos para o Congresso. Todo mundo é bem recebido e, havendo recurso e sendo justo, a gente repassa. O parlamentarismo foi tentado duas vezes, se não me engano. É preciso realizar um plebiscito. O povo, no meu entender, não seria favorável.

Seria uma maneira de esvaziar o poder do presidente? A luta pelo poder existe até dentro de casa. A minha mulher, por exemplo, no passado só podia ir ao shopping na hora do jogo do Palmeiras ou do Botafogo. E daí ela fala: “Você vê futebol todo fim de semana”. “E você vê novela seis dias por semana e não reclamo.” Não é um problema. É natural.

O seu comportamento pouco formal é alvo de críticas. O senhor não exagera? Você deve estar falando do dia em que apareci com a camisa do Palmeiras. Eu estava em recuperação. Tinha de usar roupa larga. A matéria de vocês acabou sendo favorável. A camisa era falsificada mesmo. Não vou falar de onde, mas, depois, chegaram três malas de camisas oficiais do Palmeiras. Tem muitas camisas — todas originais. Não fiz aquilo para aparecer. Foi maldade de vocês.

O senhor já recebeu alguma demanda não republicana? Sim, mas é coisa raríssima. Uma ou duas vezes apareceu gente aqui pedindo alguma coisa que a gente sabe que tem algo por trás. A gente compõe, conversa, não cede, até porque, se você ceder uma vez, já era. Aí você escancara a porteira. Compare os meus ministros com os do Temer, da Dilma e do Lula. Quem você acha que tem o melhor ministério nos últimos anos? A gente vai ganhar de todo mundo. Uma ou outra exceção, talvez.

Qual a importância da comunicação via Twitter? Acho que sou a pessoa que consegue atingir mais gente no mundo, tem mais interações, mais engajamento. Foi meu filho Carlos que começou a fazer isso daí — e foi muito importante no sucesso de nossa campanha.

O Carlos continua autorizado a postar na sua conta? O Carlos tem muita impetuosidade, quer resolver as coisas muito rapidamente. De vez em quando há um atrito entre mim e ele em função da velocidade com que ele quer resolver as questões.

Na campanha, o senhor disse que seria implacável com a corrupção. E sou. Mas não posso punir ninguém antes de a culpa ficar minimamente demonstrada. Veja o caso do ministro Marcelo Álvaro Antônio, investigado por irregularidades eleitorais. Eu tenho um compromisso com o Moro. Tem de ter algo de concreto. Só em cima de denúncias fica complicado. Ele nem é réu ainda, não foi denunciado. Deixa apurar um pouquinho mais. Meu filho Flávio, por exemplo, é acusado de envolvimento com laranjas no Rio de Janeiro. Cada candidato recebeu 2 800 reais do partido. Então não vai falar em laranjal com essa importância de recursos. “E foi dinheiro para quê?”, perguntei a ele. “Para poder pagar contador e as despesas que os candidatos tiveram durante a campanha”, porque entraram na chapa para compor. Depois, resolveram não fazer campanha. É um absurdo.

O Ministério Público pediu a quebra dos sigilos do Flávio. Isso o preocupa? Lógico. Se alguém mexe com um filho teu, não interessa se ele está certo ou está errado, você se preocupa. Eu estava em casa quando estourou o primeiro momento no Jornal Nacional. Um milhão de reais para pagar um apartamento, não sei o quê. Eu estava com meu filho Eduardo em casa, e eu conversando com ele: “Vou falar com o Flávio, perguntar o que é isso, o cara pegando dinheiro do Queiroz e pagando apartamento de 1 milhão de reais”. Flávio pagou um título bancário de 1 milhão de reais à Caixa Econômica. Ele quitou um financiamento com o banco depois de ter transferido os débitos que tinha com a construtora para a Caixa. Os documentos estão registrados em cartório. Pô, o cara era deputado, a esposa dele é dentista, tem uma renda, e a Caixa queria comprar a dívida dele. Consequentemente, ele assume a dívida não mais com a construtora, mas com a Caixa, pagando um pouquinho menos. Assim foi feito. Ponto-final.
Mas houve denúncias de que ele fazia os depósitos picados na conta dele para esconder a origem do dinheiro. São os tais 96 000 reais em depósitos de 2 000. Ele vendeu um apartamento, recebeu em dinheiro e fez os depósitos na conta dele. Um relatório do Coaf diz que, entre junho e julho de 2017, foram identificados 48 depósitos, de 2 000 reais cada um, na conta do Flávio. O valor de 2 000 é o máximo permitido para depósitos em envelope no terminal de autoatendimento da Assembleia Legislativa do Rio. Falaram que os depósitos fracionados eram para fugir do Coaf. Dois mil reais é o limite que você pode botar no envelope. O que tem de errado nisso? Aí vem o Queiroz. Realmente tem dinheiro de funcionário na conta dele. O Coaf disse que há movimentações financeiras suspeitas e incompatíveis com o patrimônio do Queiroz. Mas quem tem de responder a isso é o Queiroz.
O senhor continua considerando o ex-policial Fabrício Queiroz como amigo? Estou chateado porque houve depósitos na conta dele, ninguém sabia disso, e ele tem de explicar isso daí. Eu conheço o Queiroz desde 1984. Foi meu soldado, recruta, paraquedista na Brigada de Infantaria Paraquedista. Ele era um policial bastante ativo, tinha alguns autos de resistência, contou que estava enfrentando problemas na corporação. Vocês sabem que esse pessoal de esquerda costuma transformar muito rapidamente auto de resistência em execução. Aí começou a trabalhar conosco. E você sabe que lá no Rio você precisa de segurança. Eu mesmo já usei o Queiroz várias vezes. Teve um episódio dele com o meu filho em Botafogo, um assalto na frente de casa, e o Queiroz, impetuoso, saiu para pegar o cara. Então existe essa amizade comigo, sim. Pode ter coisa errada? Pode, não estou dizendo que tem. Mas tem o superdimensionamento porque sou eu, porque é meu filho. Ninguém mais do que eu quer a solução desse caso o mais rápido possível.

Na campanha, o senhor se dizia contra a reeleição. O que mudou? O que eu falei é que se a gente fizer uma boa reforma política eu topo ir para o sacrifício e não disputar a reeleição. Porque um dos grandes problemas do Brasil na política é a reeleição. O cara chega ao final do primeiro mandato dele, ou ele quer continuar no poder, que lhe deu fama e prestígio, ou ele quer continuar porque se o outro, o adversário, assumir vai levantar os esqueletos que ele tem no armário. Existe isso no Brasil. Então o meu caso é o seguinte: com uma boa reforma política, que diminuiria o número de parlamentares de 500 para 400, entre outras coisas mais, eu toparia entrar nesse bolo aí de não disputar a eleição.

Presidente, qual foi a primeira coisa que lhe veio à cabeça quando o senhor recebeu a facada? No primeiro momento eu não vi que era uma facada. Eu senti a batida. Parecia que foi um soco ou uma bolada. E eu levantei a camisa e vi um rasgo de uns três dedos. Falei pro meu assessor: “Fica tranquilo, foi uma porrada, já vai passar”. E não sangrava. É lógico que não sangrava. O sangue estava jorrando lá por dentro. Daí alguém teve a ideia de me levar para a Santa Casa. Eu dei uma sorte terrível.

Quando percebeu que não era uma bolada? Vi o furo e pensei que tinha sido rasgado com um soco inglês. Doía muito. Cheguei consciente ao hospital, e me levaram para fazer uma radiografia. Lembro que o médico falou: “Não faz nada, corta”. Não tinha tempo. O cara começou a pegar a pulsação… E daí só lembro que senti uma tesoura cortando. Quando acordei, me perguntaram: “Quer ir para onde? Sírio-­Libanês? Albert Einstein?”. Quando entrei no avião, não sabia para onde estava indo. O médico perguntou: “Está doendo? Quer tomar um analgésico?”. Eu falei: “Quero”. Dormi durante a viagem para São Paulo. No aeroporto acordei, me levaram para um helicóptero e fui para o Albert Einstein. Não teria sobrevivido se não tivessem me levado pra lá. Perdi 2 litros e meio de sangue. Mas, graças a Deus, sobrevivi. Foi um milagre.

Como é ver a morte tão perto? Você vê a vida de novo. Você vê passar um filme na cabeça desde quando você teve consciência de que era um ser humano na Terra. (choro) Vem uma imagem à sua cabeça. Eu vi minha filha Laura de 7 anos. Ela vai ficar órfã? Eu morrer, vamos assim dizer, até faz parte da vida. Mas como é que vai ser a vida dessa menina aí perdendo o pai tão cedo?
O que o senhor achou da decisão da Justiça de considerar inimputável o seu agressor? Esse cara aí viajava o Brasil todo, esse cara aí tinha um cartão de crédito, esse cara frequentou academia de tiro em Santa Catarina, foi filiado ao PSOL até 2014. Surpreendentemente, em 6 de setembro, dia do crime, o nome dele apareceu no cadastro de visitantes do Congresso. Isso ia ser usado como álibi, caso ele não tivesse sido preso em flagrante. É tudo muito suspeito.

Continua convicto de que foi um crime encomendado? Sim. Eu tenho poder sobre a Polícia Federal e posso dizer: “Bota aí 200 caras no caso e corre atrás”. Não estou fazendo nada disso. Estou aguardando o Moro me informar. Não quero me vitimizar nem inventar um culpado para o episódio, mas isso não saiu da cabeça dele.

Publicado em VEJA de 5 de junho de 2019, edição nº 2637
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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