Os gladiadores da
"democracia", escreve Guilherme Fiuza no jornal O Globo, tomaram uma
dose reforçada de mortadela e quebraram tudo:
Essa sessão nostalgia
da política brasileira foi uma grande sacada. O episódio das Diretas Já
em Copacabana foi emocionante. Você se sente realmente no túnel do
tempo, é muito bem feito. Dizem que estão preparando o do comício da
Central do Brasil, o da passeata contra a Guerra do Vietnã e um especial
sobre o choro de Maria da Conceição Tavares no Plano Cruzado. Só
épicos. Vamos aguardar.
O remake das Diretas
foi lindo, só houve um mal-estar. Ao final do episódio — que teve o
mesmo elenco das manifestações em defesa da quadrilha simpática de Dilma
Rousseff — o cenário estava impecável. Isso não foi legal. Vitrines
intactas, ônibus e orelhões idem. Falha elementar de produção, que
precisará ser corrigida no próximo capítulo. A família revolucionária
brasileira não aceitará essa afronta novamente.
Vida de black bloc
não é fácil. Você passa uma existência sendo atiçado por freixos e
caetanos, e na hora da festa deles não te deixam soltar um mísero rojão
na cara de ninguém. Não é justo.
E não é só isso. A
parte mais bacana, que é fustigar a boçalidade da polícia para descolar
umas bombas de gás e brincar de “Os dias eram assim”, também foi
cortada. É duro ter o seu talento dramático cerceado a esse ponto, e
terminar na praia dançando música de protesto. Mas um guerreiro tem que
estar preparado para as provações mais duras. Caminhando e cantando e
seguindo o cifrão.
O que ninguém pode
negar é que, antes dessa genial sacada dramatúrgica, a vida nacional
estava caminhando para o marasmo. Inflação e juros caindo, níveis de
risco idem, Petrobras saindo das emocionantes páginas policiais para a
entediante seção de economia, reformas sendo tocadas por aqueles nerds
que fazem tudo certinho e não são candidatos a nada. Uma chatice. Graças
a Deus surgiram roteiros decentes, como a escapada espetacular dos
bilionários irmãos Batista para Nova York, depois de uma conversa franca
e patriótica com o companheiro Janot. A emoção está de volta.
Morreu mais um
pintinho esta noite. A mensagem cheia de compaixão pode parecer
linguagem cifrada, neste mundo mau. Mas é verdadeira, porque ainda
existe gente com sentimentos, capaz de se importar com os animais. O
mensageiro da dor, no caso, é o caseiro do sítio de Atibaia, que não é
do Lula. Essas coisas o fascista Moro não vê. A mensagem sobre a morte
no galinheiro foi enviada ao Instituto Lula — e aí as lágrimas brotam:
um homem que foi presidente da República se importar com a vida de um
pintinho, num sítio que nem é dele... É de cortar o coração.
Hoje sabemos que Lula
não se importava só com os pintinhos. Preocupava-se muito com as
vaquinhas. Foi por isso que ele mandou o BNDES — um banco até então sem a
mínima sensibilidade para com os animais — ajudar na causa, depositando
alguns bilhões de reais nas boiadas certas. Não se pode confiar na
Justiça terrena (como se vê pela perseguição implacável a este homem
bom), mas a justiça divina não falha: mesmo após a delação demolidora de
João Santana (quem se lembra disso?), Lula e Dilma estão em paz,
assistindo de camarote ao bombardeio ao inimigo. Deus ajuda quem ajuda
os animais.
A falha imperdoável
de produção no remake das Diretas Já em Copacabana, felizmente, não
ocorreu em Brasília. Ali sim, o episódio da série foi perfeito. Aqueles
ministérios que passaram 13 anos emocionando o Brasil — num enredo
eletrizante protagonizado por Erenice Guerra, José Dirceu, Paulo
Bernardo, Gleisi Hoffmann e grande elenco — andavam às moscas.
Ultimamente, viam-se servidores públicos administrando e até obtendo
resultados socioeconômicos — praticamente uma morte em vida.
Aí os revolucionários
do povo perderam a paciência que tiveram nesses 13 anos dourados e
cercaram a Esplanada. A direção de cena dessa vez foi impecável: os
gladiadores da democracia tomaram uma dose redobrada da porção de
mortadela e quebraram tudo. Foi bonito de se ver. O Verissimo até falou
que o Exército na rua lembrou a vida em 64! Viram como não é difícil
produzir direito?
Dizem que no
sensacional episódio “Brasília em chamas” a técnica de produção foi toda
venezuelana. É possível, sabendo-se que a junta democrática que está
tentando tomar o poder na mão grande (mas sem perder a ternura) inclui
simpatizantes de Nicolás Maduro, conhecido como Senhor Diretas (no
queixo). Aliás, se no próximo episódio o pessoal substituir a MPB pela
guarda chavista, as Diretas Já passam na hora — não precisa nem de voto.
O Brasil está mudando
para melhor. Na época da Dilma era um drama para o Supremo autorizar
investigação dos mandatários — mesmo com as obras completas da Lava-Jato
transbordando sobre as divinas togas. A denúncia já vinha amortecida,
ficava lá estacionada na sombra, e o Brasil ainda tinha que ouvir o
despachante Cardozo chorando inocência. Agora, não: Janot mandou, Fachin
homologou. Primeiro mundo.
Vai nessa, Brasil.
Sem medo de ser feliz. Mas anda logo, que agora o país saiu da recessão
(volta, Dilma!) e daqui a pouco vai ficar mais difícil ganhar no grito.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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