quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Em marcha lentíssima, Supremo leva 400 dias, em média, para julgar uma liminar


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Charge do Cléberson, reproduzida do Arquivo Google
Thais Bilenky
Folha
Decisões que deveriam ser provisórias e, via de regra, coletivas se tornaram majoritariamente duradouras e individuais no STF (Supremo Tribunal Federal). Dados do projeto Supremo em Números, da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas no Rio, mostram que o tempo médio de vigência de uma liminar até que ela seja julgada coletivamente foi de 403 dias entre 2011 e 2015 – ou seja, pouco mais de um ano e um mês.
Como o regimento do Supremo não estipula prazos para que ordens judiciais desse tipo sejam julgadas no mérito, a vigência de cada uma varia enormemente.
Se o afastamento de Renan Calheiros (PMDB-AL) da presidência do Senado, determinado, em dezembro, pelo ministro Marco Aurélio Mello, foi revertido em plenário em dois dias, há casos que permaneceram pendentes por duas décadas. Isso aconteceu com a ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 917, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República em 1993. Uma liminar suspendeu a eficácia de lei mineira que reservava 30% de cargos públicos vagos aos próprios servidores estaduais. O plenário só foi confirmar o entendimento em 2013, dez anos depois.
HÁ MUITOS CASOS – Exemplos levantados pelo Supremo em Números abundam. Em determinados casos, a vigência é menor em termos temporais, mas seu impacto pode ser maior.
A liminar concedida pelo ministro Luiz Fux estendendo auxílio-moradia de quase R$ 4.400 mensais para todos os juízes federais já custou mais de R$ 1,5 bilhão em recursos públicos em dois anos de vigência, por exemplo.
Para especialistas, a gravidade da arbitrariedade no funcionamento do tribunal aumenta quando se constata que as liminares, cada vez mais numerosas, são também cada vez mais monocráticas (individuais).
Procurada pela Folha, a presidência do STF não quis se manifestar.
DECISÕES INDIVIDUAIS – O total de determinações expedidas por um único ministro disparou de 4 em 1989 para 2.448 em 2015.
A quantidade de colegiadas praticamente não se alterou, passando de 23 a 26 no período (embora tenha variado no meio tempo, chegando a 225 em 2004). Mas, se antes elas representavam 85% das liminares no tribunal, agora respondem por 1%.
O acúmulo de casos recebidos pelo STF está na origem dessa distorção. Com algo entre 80 mil e 90 mil novos processos por ano, soluções mais ágeis são aplicadas.
Liminares monocráticas caminham mais rapidamente no STF, de acordo com o projeto da FGV. Da data em que um caso deu entrada no tribunal até que um ministro o julgasse provisoriamente sozinho, passaram-se em média 65 dias em 2015. Para que um órgão colegiado (o plenário ou as turmas, compostas de cinco ministros cada) o fizesse, passaram-se 414 dias.
CONVENIÊNCIAS – Ao deliberadamente aceitar mais tipos de recursos em vez de limitar aqueles passíveis de análise no último grau da Justiça brasileira, o Supremo pretende se beneficiar, diz  o pesquisador Ivar Hartmann, coordenador do Supremo em Números. “Isso dilui a visibilidade dos casos e aí os ministros têm mais liberdade de tomar decisões não ortodoxas”, afirma o professor da FGV.
Para ele, o excesso de casos serve ainda de “desculpa conveniente” para demoras em julgamentos sensíveis como o de Renan pelos crimes de peculato, falsidade ideológica e uso de documento falso, que ficou três anos parado no Supremo.
“O problema não é os ministros tomarem decisões políticas, mas, sim, que, diferentemente de outros órgãos, o STF não ter de prestar contas a ninguém”, conclui.
INDIVIDUALIZAÇÃO – A tendência de individualização das ordens no STF é verificada não só nas decisões liminares. Em geral, o Supremo tomou 18% menos decisões coletivas neste ano do que em 2015.
As decisões colegiadas, tomadas em plenário ou nas turmas, compostas por cinco ministros cada uma, diminuíram de 18 mil para 15 mil de um ano para o outro. Segundo dados do Supremo, as decisões coletivas corresponderam a 12% do total em 2016. É o menor patamar desde 2010 (quando somaram 10%), último ano contemplado pelas estatísticas disponibilizadas pelo STF.
Por outro lado, as ordens expedidas exclusivamente por um ministro cresceram 3% em 2016 em relação ao ano passado, variando de 99 mil para 102 mil.
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