domingo, 31 de maio de 2015

Disputado pelas maiores marcas do mundo, futebol já sente efeitos da crise


Alexandre Simões e Wallace Graciano - Hoje em Dia


FÁBIO MOTTA/ESTADÃO CONTEÚDO – 29/5/2015
Marco Polo del Nero fala com a imprensa num auditório sem as marcas das patrocinadoras da CBF
Marco Polo del Nero fala com a imprensa num auditório sem as marcas das patrocinadoras da CBF

Na última sexta-feira, logo após chegar da Suíça, de onde saiu corrido, após a prisão de José Maria Marin, o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Marco Polo del Nero, recebeu a imprensa. A entrevista foi no mesmo auditório em que são feitas as convocações da Seleção e onde ele falou no dia 16 do mês passado, após ser eleito para o cargo. Mas o cenário era diferente. O banner com a marca dos patrocinadores, que garantiram à entidade uma receita de meio bilhão de reais no ano passado, não “decorava” o local.
 
Não foi esquecimento. Nem correria. A crise que envolve o futebol mundial, e que tem o Brasil como um dos focos, pois o próprio Del Nero e o ex-presidente da CBF, Ricardo Teixeira, são apontados como co-conspiradores no documento que destrincha a corrupção na Federação Internacional de Futebol Associado (Fifa) e foi produzido pelo FBI, nos Estados Unidos, já afeta a maior indústria de entretenimento do mundo.
 
“Efetivamente, levando em conta o fato concreto, que é a volta corrida do Marco Polo, a reeleição do Blatter, cada um está tentando salvar seu quintal e gerenciar a crise. Sendo muito pragmático, a gente sabe que essa estrutura está no poder há muito tempo e tem capacidade de se manter. Mas esse medo da contaminação, que parte das parceiras, pode ser um fator diferenciador. É a opinião pública, e o impacto disso sobre as empresas, que pode ajudar a mudar a estrutura. Se o ônus passa a ser maior que o bônus, a máquina pode emperrar de vez e acontecerem mudanças significativas”, analisa Anderson Gurgel, doutor em comunicação esportiva, professor da Universidade Mackenzie, em São Paulo, e autor do livro Futebol S/A – a economia entra em campo.
 
MÁQUINA
 
Realmente, a maior crise de credibilidade da história do futebol mundial pode emperrar a máquina. O poder na Fifa, que reúne mais países que a ONU (209 a 193), ou na CBF, é garantido da mesma maneira, na base do repasse de verbas a um colégio eleitoral que não se mantém sem essa ajuda.
 
Se a relação com os patrocinadores for abalada, Joseph Blatter e Marco Polo del Nero perdem a força financeira que ajuda ambos a se manterem nos cargos. 
 
Entidades não seguram parceiras sem mudança de postura
 
O primeiro grande sinal do risco que a Fifa corre partiu da Visa, uma das patrocinadoras mais fortes da entidade e que faz a venda exclusiva e prioritária de ingressos da Copa do Mundo para seus clientes. Mas gigantes como Coca-Cola e Hyundai também manifestaram publicamente o descontentamento com a crise.
 
“Nossa decepção e preocupação com a Fifa são profundas. Como patrocinadores, esperamos que a Fifa tome decisões imediatas. Isto começa com a reconstrução de uma cultura com fortes práticas éticas para restaurar a reputação dos jogos para os torcedores. Se a Fifa falhar nisso, vamos informá-los que reavaliaremos nosso patrocínio”, garante a nota da Visa, divulgada quinta-feira.
 
“Tudo o que uma empresa da área financeira precisa é não ter a imagem associada a má gestão, desvio de dinheiro, corrupção. A Visa busca na Copa do Mundo a emoção, a superação, as histórias. Quando isso passa a gerar dúvidas, é o pior retorno possível. O efeito colateral é nocivo”, analisa Anderson Gurgel.
 
SATISFAÇÃO
 
Na entrevista coletiva do último sábado, após a reunião do Comitê Executivo da Fifa, Blatter revelou a preocupação com os parceiros: “Estivemos em contato com os patrocinadores, trocamos cartas, e posso lhes dizer que já começamos a reconstruir a reputação da Fifa, em conjunto com nossos parceiros. Todos receberam já uma explicação da situação e está programada uma visita pessoal aos patrocinadores”.
 
Para Paulo Matos, professor de gestão estratégica de produtos e marcas do Ibmec, os fatos da última quarta-feira provocarão mudanças na Fifa, pois será impossível para a entidade manter contratos de patrocínio sem uma reação convincente.
 
“Num primeiro momento, é uma crise da Fifa. Mas são marcas tão fortes que temem que isso possa grudar nelas também. Quando apoiam a Copa do Mundo, se apropriam de um evento profissional, bem organizado. Agora, bate a dúvida sobre a validade da parceria. Por isso, o futuro pode gerar a ruptura dessas relações. Uma mudança de gestão e postura da Fifa será obrigatória. Essas marcas não vão aceitar seguir a parceria dentro desse contexto de corrupção”, analisa Matos.
 
Andrei Molletta Scheiner, professor de Gestão da Marca e da Reputação Corporativa da FGV/Faculdade IBS, tem visão idêntica do momento pelo qual passam a Fifa e também a CBF na relação com as parceiras.
 
“Esse tipo de parceria só é boa quando está todo mundo feliz. Não é um casamento. A marca quer preservar sua imagem. Acaba virando um efeito em cascata, pois o público associa a Coca-Cola, a Visa, ainda que elas não tenham nada com a história, à corrupção. Não há como não respingar, pois as pessoas carregam o entendimento de que as empresas são coniventes com os processos da Fifa”afirma Scheiner. 
 
arte escândalo FIfa

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