sábado, 29 de novembro de 2014

Souvenir de Cadeia


Loja de artesanato revela talento de presidiários; renda ajuda as famílias
Rafael Lemos
Cofrinhos enfeitados com glíter, porta-caneta feito com papel ofício, pequenas esculturas, enfim, todo tipo de souvenir comum que se vê por aí. Mas, por aqui, nada é tão comum assim. Não é a Avenida Sete, muito menos a Feira dos Caxixis. Estamos num  ambiente controlado, recluso, que pouca gente tem acesso: é a Artfreedoom, lojinha que tem na sua linha de produção e na administração detentos da Penitenciária Lemos Brito (PLB), na Mata Escura. 
Reaberta em 2010, a butique de artesanato é uma atração à parte no local, com preços que variam de R$ 5 a R$ 250.

Cadeira começa a tomar forma na linha de produção da Artfreedom, loja de artesanato dentro da prisão (Foto: Marina Silva)

RECOMEÇO
A história da loja começou na década de 1980, quando a primeira unidade foi aberta longe dali, no Mercado Modelo, para qualquer um ter acesso. Nos anos 90, foi aberto outro box no Instituto Mauá, na Barra, mas, segundo detentos, ambas foram fechadas por problemas financeiros e políticos.
“O governo (da época) não tinha interesse em manter a loja, porque era feita por presos. Quem vendia e lucrava, durante um tempo, eram os agentes”, comentou o detento Aloísio de Araújo, 49 anos.
Fechada em 2002, só voltou à ativa em 2010, após um curso de capacitação profissional realizado pelo Sebrae na penitenciária. Na época, Aloísio e outro detento, Vanderlino Osvaldo de Souza Filho, 55, viram a oportunidade de empreender na PLB e decidiram reinaugurar a loja.
Formado em Administração de Empresas, Aloísio explica que a decisão de reabrir o espaço foi uma forma de melhorar a atenção ao interno e torná-lo útil para o trabalho - atualmente, 28 deles atuam  na serraria com a produção de peças de artesanato, esculturas de madeira e na fabricação de mesas, cadeiras e outros móveis decorados.
Vendidos a R$ 5, os porta-copos são mesmo os campeões de venda. Porém, outros produtos se destacam pela saída, como porta-retratos, quadros com escudos de clubes e cofrinhos de argila.


REINSERÇÃO
Administrativamente, a loja funciona como uma cooperativa, conforme explica Aloísio. “O objetivo é ganhar dinheiro para poder nos sustentar”, comentou.
Segundo ele, os familiares dos presidiários ficam responsáveis por comprar o material que a produção das peças requer. A loja também recebe doações de empresas, entre elas, casas de material de construção. “Em cada produto vendido, a serraria fica com 60% e os 40% restantes são divididos entre os colaboradores”, explicou.
De acordo com a coordenadora de atividades laborativas da PLB, Tânia Lúcia, a Artfreedom é ainda uma forma de prover a família, já que os presos são remunerados – o valor recebido é equivalente a 75% de um salário mínimo. Os principais clientes da loja são os próprios parentes, além dos funcionários da PLB. Volta e meia ainda aparecem visitantes de ocasião, como estudantes. 
A Artfreedom faz parte das atividades laborativas, que preveem que a cada três dias de trabalho – 12 horas de ocupação – o detento tem direito a um dia de redução na pena.
O diretor da PLB, Everaldo Carvalho, explica que esse tipo de trabalho não serve apenas como controle da punição, mas também para ressocialização. “A pena tem como objetivo punir e reintegrar o preso à sociedade. E nada melhor do que colocá-lo na rua pondo ações de cunho educacional”, diz.
A coordenadora Tânia Lúcia também faz coro: a Artfreedom “prepara o detento para o retorno à sociedade”.

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